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Cor-de-terra, sobrepondo as gradações como se quisesse ter uma luminosidade propositadamente opaca; ficava na parede fronteiriça à porta de maneira que, quem entrasse, não via imediatamente.
Ela viu, admirou e não conseguiu mais tirar os olhos. Comprou e levou para casa.
Alguns meses passaram-se, em tentativas de achar o lugar ideal para pendurá-lo; cada parede que experimentava, sentia que não era ali, parecia faltar alguma coisa. Deixava por uns dias.
Ele se entortava ou amanhecia de cabeça para baixo. A assinatura do artista parecia mudar de lugar; não era loucura, ela media e comprovava. Um mistério.
Voltou à galeria, queria saber mais, que história tinha, quem era o artista?
- Não sabemos nada dele, quando compramos o negócio, já o encontramos na parede pendurado - responderam.
Foi num dos quartos desocupados da casa; quando aproximou o quadro da parede, a impressão que teve foi de um puxão para um encaixe perfeito. Ali ficou.
Para aquele quarto ela acabou se mudando e mudando seu cotidiano, passava horas olhando a pintura.
Todos os dias a figura quase disforme retratada parecia ir desaparecendo, se rearranjando, trocando tons, mudando camadas de cor como se transformasse em terra. Cada dia ela se trancava mais no quarto, até que resolveu não sair mais dali.
Deram por sua falta e, ao arrombarem a porta, não a encontraram, sentiram apenas o cheiro forte de terra orvalhada.
MQ
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quarta-feira, 15 de abril de 2009
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Quando leio um texto bom assim, me transporto, sinto que saio de mim, como a mulher que foi pra dentro do quadro.
ResponderExcluirVocê... escrevendo sempre melhor.
Mari,
ResponderExcluirEmpate... porque gosto muito do que escreve e muito de ouvi-la cantando.
Beijos