segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

domingo, 30 de janeiro de 2011

Perdido

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Ainda que a lua
Jogasse restos de luar

Ainda que as palavras
Soassem em mim

Ainda que invejasse
As que faltaram

Ainda que me imaginasse
Vestindo teu corpo
E sentindo a volúpia
Da tua presença

Mesmo assim
Senti a solidão
E me perdi completamente

Minha identidade
Ficou nos teus olhos
E a solidão do mundo
Está entrando pela janela

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MQ
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sábado, 29 de janeiro de 2011

RUY GODINHO - ENTÃO, FOI ASSIM?

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Viver incompletamente

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Procuro no dito, o não dito
Posso ouvir das palavras
O que supus não entender
E descobrir com a intuição
O que ordenou a mágoa
Posso ceder a quietação
E forcejar para socorrer
A plenitude morrendo
Ao lado de nossas vidas
Mas não posso, Maria
Morrer sangrado
Pelo amor de tuas mãos
Seria viver incompletamente

Esbatendo-me na solidão


MQ
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sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

RUY GODINHO - RODA DE CHORO

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RODA DE CHORO – SÁBADO – DIA 29.01.11

No 1º bloco o destaque vai para a Coleção Choro Carioca - Música do Brasil. O autor enfocado é Erothides de Campos, nascido em Cabreúva-SP, em 1896. Autor de mais de 200 composições, tornou-se conhecido como Jonas Neves.

No 2º bloco teremos o som do CD Carlos Poyares no Clube do Choro, gravado em dezembro de 1983 e lançado no início de 1984, em comemoração aos 55 de idade deste instrumentista capixaba.

No 3º bloco a tônica vai para a revisita do multiinstrumentista e compositor João Tomé, nascido em Uberaba-MG, em 03.03.1920 e o som de seu primeiro CD autoral, Piquenique, lançado postumamente, em 2005.

No 4º bloco teremos a presença graciosa da cantora e compositora paraense Jeanne Darwich e o som de seu segundo CD de carreira: Voz do Sentimento, lançado em 2011.

O 5º bloco traz também a revisita de outro mineiro, o multiinstrumentista Dado Prates, que traz o som do excelente CD Brasilidade, lançado no ano de 2000.
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Ouça pela internet:
Rádio Câmara, Brasília:
www.radio.camara.gov.br (rádio ao vivo), sábados, 12h.
Rádio UEL FM, de Londrina, quintas-feiras, 21h.
Rádio Utopia FM, Planaltina-DF, quartas-feiras, 18h.
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Produção e Apresentação: Ruy Godinho
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quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Ninguém me Conhece: 31) Zé Edu Camargo É Daqui

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Uma das muitas contribuições do Clube Caiubi ao cenário musical brasileiro é a valorização do compositor. Sempre esquecido pela programação radiofônica (e principalmente pela televisiva), quase sempre omitido pelas(os) cantoras(es) nos shows, o compositor, no Caiubi, tem sua vez. Incensado pelos intérpretes, reconhecido pelo público, lá se sente em casa. E quando digo compositor estou me referindo também ao letrista, que na nomenclatura brasileira é chamado de autor. E aqui entramos num ponto delicado. Pra mim, o cara que faz letra não é menos que compositor, pois, pra escolher as palavras sonoramente (e significativamente) mais adequadas à linha melódica de uma canção, tem que usar de sensibilidade musical, quesito que não é obrigatório a quem lida apenas com poesia. A respeito dessa questão, soube há alguns anos que é o letrista quem cede parte de seus direitos àquele que porventura faz uma versão de uma canção cuja letra seja sua. Ex.: digamos que um japonês resolva fazer uma versão de Garota de Ipanema em sua língua e que essa versão seja gravada. A parte que cabe a Tom Jobim, autor da melodia, permanece sendo dele, já a parte de Vinicius, letrista da canção, será subtraída pra que dela sejam tirados os direitos do versionista. Mais um motivo pra que o letrista registre/edite suas canções na condição de compositor. Fica aí a dica.
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Mas passemos ao que interessa. Citei a importância do Caiubi no parágrafo acima, pois foi lá que cresceu e apareceu o talento do letrista Zé Edu Camargo (não, não se assustem, ele não tem parentesco com seu quase xará). O rapaz, levado pelas mãos do parceiro Sonekka, chegou por aquelas bandas como quem não queria nada, sentou, pediu uma cerveja e ficou lá, curtindo os artistas da casa. De repente, levou a mão esquerda à testa, pegou um guardanapo e começou a rabiscar nele uns versos, meio como se um Chico Xavier tivesse baixado nele. Logo veio um, roubou-lhe o guardanapo e o devolveu na semana seguinte, acrescido de uma canção. A história se repetiu uma, duas, várias vezes, até culminar na glória de ter um guardanapo subtraído por ninguém menos que Zé Rodrix. A partir daí bem que seu nome artístico poderia ter mudado pra Zé dos Guardanapos, pois o hábito deixou-o tão famoso por lá que não teve um que não requisitasse a sua parcela guardanapal. Eu, que já dava minhas guardanapadas em outras mesas, até diminuí o ritmo, pra não ser tachado de plagiador.
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Sou um compositor competitivo (no bom sentido, que é o do “importante é competir”) e, como tal, me roo de inveja quando vejo que alguém compôs algo que eu adoraria ter escrito. Sempre vem aquela pergunta: Por que eu não pensei nisso antes? E o Zé Edu, confesso, por meio de suas muitas e inspiradas letras, foi responsável, sem saber, por eu ter feito outro tanto delas. É o que, em arte, chamamos de inveja criativa. Mas, pra mostrar como a competitividade não chega às raias do antagonismo, mais de uma vez tivemos o prazer de compartilhar letras. A primeira vez se deu de forma rara. Estava o compositor Madan, na época, à frente de um projeto de canções pacifistas, por conta da guerra do Iraque, se não me engano. Era então Zé Edu ainda solteiro, assim que, em seu apartamento, devidamente manguaçados, três melodistas (Sonekka, Élio Camalle e Marcos Oliva) e três letristas (Zé Edu, Ricardo Moreira e eu) compusemos a doze mãos a bonita (e inédita) Salva-Vidas. Com intenções menos pacifistas e mais prazerosas, repetimos a(s) dose(s) outras vezes, sempre tendo um mutirão de compositores a postos.
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Caetano, certa vez, após ter assistido a um show da Nação Zumbi, comentou numa entrevista, referindo-se a este (o show), que o que mais lhe tinha agradado fora perceber que ele, Caetano, não exercera nenhuma influência sobre a música que faziam os rapazes do mangue beat. Da mesma forma, (quase) sempre me encanto com as letras de Zé Edu, tão diferentes das minhas, sejam em tema, sejam em estrutura, enfim, é como se tivéssemos vindo de escolas completamente diferentes, o que, ao que me consta, não é verdade. Temos mais ou menos a mesma idade e as mesmas referências, com uma ou outra diferença. A isto podemos chamar originalidade. O poder (conquistado pela experiência) de filtrar as referências e transformar em algo com assinatura própria. Ouso dizer que eu e Zé Edu honramos a tradição dos letristas, raça praticamente em extinção no atual cenário da música brasileira.
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Acho que é tempo de aproveitar o espaço pra explicar algo (se é que ainda não ficou claro). Recentemente dois acontecimentos ligados ao Ninguém me Conhece me chamaram a atenção: 1) Um amigo leitor do blog confidenciou, meio em tom de repreensão, que havia notado que nos textos dou espaço demais a mim e a Kana. 2) Algumas pessoas entraram em contato comigo pra saber o que precisavam fazer pra serem selecionados pros textos, o que muito me envaideceu, alguns amigos chegaram a me cobrar. As respostas aos dois itens estão interligadas. Escrevo, com raras exceções, a respeito de pessoas que, de uma forma ou de outra, pertencem a meu convívio, assim que, naturalmente, escrevo sob minha ótica de, digamos, testemunha ocular. Não poderia tratar de Zé Edu, por exemplo, que é parceiro, amigo, durante um tempo me passou trampos na Editora Abril, e é também companheiro de noitadas caiubistas, de forma impessoal. No mais, um blog é uma espécie de jornal no qual o patrão e o cronista são a mesma pessoa (a parte ruim é a falta de salário). Daí que as escolhas serão sempre tendenciosas, ou, na melhor das hipóteses, parciais. Afinal, se tenho um espaço livre pra escrever o que me der na veneta, por que não o aproveitar pra divulgar os meus? Por último, peço paciência aos ansiosos. Tenho muitos bons parceiros e pouco tempo, então as escolhas se dão meio que aleatoriamente.
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Voltando ao Zé Edu e à supracitada tradição dos letristas, é bom acrescentar, pra quem não o conhece, que o moço conseguiu algumas façanhas em sua carreira... E, como o espaço é dedicado a música, nem vou tratar de suas conquistas jornalísticas (sim, ele também é jornalista, digo mais, o José Eduardo Camargo, com sua carreira jornalística vencedora, com livros lançados – foi até entrevistado pelo Jô! –, suas muitas viagens a serviço do Guia Quatro Rodas etc., é quem paga as contas do Zé Edu), basta dizer apenas que entre os muitos parceiros do moço constam os nomes de Zé Rodrix, Guilherme Rondon, Alexandre Lemos, Vicente Barreto, Clarisse Grova, e até mesmo Celso Viáfora, que, na maioria das vezes, faz parcerias na condição de letrista. Ou seja, na bagagem do menino só há artigo de luxo. Sem esquecer o primeiro lugar conquistado no Festival de Ribeirão Preto, com o delicioso samba Arsênico (em parceria com Élio Camalle).
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Eu sabia que ele tinha um sonho de registrar em CD algumas de suas muitas parcerias, o que eu não sabia (já que nos vimos raramente no ano que se encerrou) era que o projeto já ia avançado. Apenas recentemente soube que neste ano que começa as melhores lojas do ramo terão em suas prateleiras, interpretado pela bela cantora Vanda Breder, o CD Uns Muitos, cujo repertório é inteiramente dedicado ao letrista. Antes de ouvi-lo já me brotou o pecado capital da inveja, que só não é maior que a vontade de adquirir meu exemplar. Quem sabe, ouvindo-o, a inveja criativa entre em ação novamente e nasçam outras tantas letras do lado de cá.
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Ouça algumas das guardanapadas de Zé Edu aqui: tp://clubecaiubi.ning.com/profile/oxdopoema
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quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

RUY GODINHO – ENTÃO, FOI ASSIM?

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ANNA JÚLIA
(Marcelo Camelo)

Quem te vê passar assim por mim
Não sabe o que é sofrer
Ter que ver você assim
Sempre tão linda
Contemplar o sol do teu olhar
Perder você no ar
Na certeza do amor
Me achar um nada
Pois sem ter teu carinho
Eu me sinto sozinho
Eu me afogo em solidão
Oh Anna Júlia!
Nunca acreditei na ilusão
De ter você pra mim
Me atormenta a previsão
Do nosso destino
Eu passando o dia a te esperar,
Você sem me notar
E quando tudo tiver fim,
Você vai estar com um cara,
Um alguém sem carinho,
Será sempre um espinho
Dentro do meu coração
Oh Anna Júlia!
Sei que você
Já não quer o meu amor,
Sei que você
Já não gosta de mim
Eu sei que não sou
Quem você sempre sonhou,
Mas vou reconquistar
O seu amor todo pra mim
Oh Anna Júlia!
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Então, foi assim...

Alex Werner, produtor da banda carioca Los Hermanos1 é um sujeito tão tímido, mas, tão tímido que, se sua timidez não virasse música, viraria folclore. Menos mal que virou música: Anna Júlia.

Quem revela é a própria musa em entrevista à revista Marie Claire2: “Conheci o Alex na faculdade. Ele fazia Direito e eu, Jornalismo. Achei ele gatinho e fui conversar, mas a gente acabou não ficando porque ele era tímido. Eu tentava conversar e ele ficava nervoso. Foi passando o tempo e, de vez em quando, ele mandava recados pelos meus amigos. Eu nunca
tinha falado com ele direito, então a gente se cruzava na faculdade e não parava para conversar. Era uma situação chata”.

Se, por causa de sua timidez aguda, Alex não conseguia nem conversar, imagina outras coisas tão boas quanto. Mas, aos poucos, o rapaz teria progressos. Mínimos, mas teria.

“No final de 98, eu fui para a Europa de férias”, relembra Anna. “No dia da viagem, ele apareceu na minha casa e me levou uma flor. Achei muito bonitinho. Mas ele chegou quatro horas antes de eu ir para o aeroporto e eu ainda não tinha feito as malas... Foi nessa época que um amigo me disse que os garotos da banda tinham feito uma música para mim. Pensei
que ia ser algo me xingando, do tipo ‘Ô, garota, se toca! Deixa de ser besta e fala com meu amigo!’ ”

Quem se condoeu com aquela situação foi o vocalista da banda, Marcelo Camelo3, que resolveu fazer a música para ajudar o amigo a conquistar a garota da faculdade. “É uma canção sobre o amor de quem contempla, o amor do observador”, argumenta Camelo4, que a compôs sem a menor pretensão de gravá-la. Mal sabia ele que a ingênua balada, tempos depois, acabaria na boca do país inteiro, levando a Banda Los Hermanos a conquistar o disco de platina.

A homenagem causou surpresa em Anna Júlia. “Começaram as aulas e encontrei o Alex com o [Rodrigo] Barba numa festinha. Barba me convidou para o show seguinte da banda. Eu disse que não dava, já sabendo que iria. No meio do show, escuto o Marcelo falando: Anna Júlia, esta música é para você. O lugar estava muito cheio e a acústica não era boa, entendi muito pouco da letra. Eu ouvia Anna Júlia, Anna Júlia e ria nervosa. Pelo menos fiquei sabendo que não estavam me esculachando. Quando o show acabou, fui agradecer, mas não falei mais do que isso com o Alex. Nunca conseguimos conversar direito. Sempre acontecia alguma coisa para atrapalhar.”

E os progressos continuariam na vida de Alex, tímidos, mas significativos.

“Até o dia em que ele me ligou, dizendo que queria me ver. Foi em casa, super nervoso. Finalmente, acabamos ficando. Foi a única vez”, revela impiedosamente Anna.

Mas, até aí, o psicanalista – se Alex o tivesse - estaria satisfeito com os progressos.

“Um dia, o Alex me trouxe o single na faculdade. Você não tem noção do tamanho do negócio até ver seu nome na capa do disco. Em casa, quando pus para tocar, a voz do Marcelo era tão doce que comecei a chorar. Acho que a letra tem bastante o lado do Alex, fala mais do que ele via em mim. Na primeira vez em que ouvi a música no rádio, a locutora disse: ‘Anna Júlia, o que você fez?’ E eu pensando: Nossa! Esta sou eu!”

Anna Júlia foi gravada no CD Los Hermanos (1999), da Abril Music.
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1 Banda criada em 1997, por Marcelo Camelo (voz), Rodrigo Amarante (guitarra, flauta transversal e voz), Bruno Medina
(teclados) e Rodrigo Barba (bateria).
2 Edição de novembro de 2000.
3 04/02/1978 Rio de Janeiro-RJ.
4 Também em entrevista à revista Marie Claire, edição de novembro de 2000.
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Ruy Godinho
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terça-feira, 25 de janeiro de 2011

A LIBERDADE DA BELEZA

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Para meu mestre, Marcelo.
Mestre-aprendiz da liberdade
e da beleza.
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MQ

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segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

MARCO ANDRÉ - SÃO PAULO

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domingo, 23 de janeiro de 2011

Obrigado Maria


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Obrigado, Maria
Por deixar impregnado
Em minha carne, a tua

Pela maciez da pele
Sentida nas mãos
Todos os dias
Por beijos calados
Na lembrança da boca
- queria tanto mais -

Obrigado, Maria
Pelo alvoroço infantil
Da tua presença
E a sábia lucidez
Cravando-me verdades

Obrigado, Maria
Pelos teus olhos
Pousados da distância
No mais profundo dos meus

Não há destroços na tua ausência
E nem o que consolar
Não conheço o poder
Que dirige os mundos
Nem a tristeza que emana dele
Mas é dela que me visto todos os dias
Para pelo menos por instantes
Tirar enlevo do agora
E suportar a obsessão da angústia

Obrigado, Maria
Pelos intensos e plenos momentos
Em que tentamos
Dirigir nosso mundo possível

Obrigado, Maria
Por não perceber a saudade
Que já existia neles
E por consentir tudo o que
Podia ser coberto com palavras

Não conheço poderosos
Nem tenho um deus
Ou um demônio para aceitar
Ou ser perseguido
Talvez sejam iníquos por natureza
E a eles não interessa a nudez
E o despudor que contém o amor


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MQ
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sábado, 22 de janeiro de 2011

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

RUY GODINHO - RODA DE CHORO

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RODA DE CHORO – SÁBADO – DIA 22.01.11

O Roda de Choro deste sábado vai ser especial. Isso porque iremos reproduzir durante todo o programa, o concerto realizado pelo compositor e multi-instrumentista cearense Zé Menezes, no Teatro da Caixa Cultural, em outubro/2010, durante o lançamento do CD triplo Zé Menezes Autoral, em Brasília.

Nascido em Jardim, interior do Ceará, em setembro de 1921, com toda a jovialidade dos seus 89 anos, Menezes esteve acompanhado no show por Daniela Spillmann (flauta e saxofone), Marcos Nimhichter (piano e acordeom), Marcelo Gonçalves (violão de sete cordas), Jorge Helder (contrabaixo) e Márcio Bahia (bateria).

Ouça pela internet:

Rádio Câmara, Brasília: http://www.radio.camara.gov.br/ (rádio ao vivo), sábados, 12h.

Rádio UEL FM, de Londrina, quintas-feiras, 21h.

Rádio Utopia FM, Planaltina-DF, quartas-feiras, 18h.



Produção e Apresentação: Ruy Godinho


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SWINGUEIRA 4 - RIO DE JANEIRO

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quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Ninguém me Conhece: 30) Pequeno Estudo sobre Marcio Policastro


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Por ser eu um letrista, tenho, naturalmente, uma queda por canções que contêm belos textos. Quando compro um CD, gosto de ler suas letras antes de ouvir-lhe as canções, só pra sentir, antes do musical, o impacto poético do trabalho. Claro que há melodias tão fascinantes que qualquer letra fica boa dentro delas. Quando recebo melodias assim pra letrar, sei, de antemão, que o trabalho vai ser muito facilitado (e prazeroso). Mas, hoje em dia, belas letras são um luxo cada vez mais raro e pra cada vez menos ouvintes. Os próprios letristas, no intuito de atingir o público, têm procurado construir letras mais acessíveis. O que é, de certa forma, fazer concessões. E a arte verdadeira não deve fazer concessões. Há uma canção do belíssimo cantautor argentino Charly García na qual ele diz "No voy a parar/ Yo no tengo dudas/ No voy a bajar/ Déjalo que suba". É mais ou menos isso o que penso. A arte, pra ser grande, tem que nascer da alma, não de pesquisa de mercado. E quem a consome que procure apurar sua sensibilidade. Quando pensamos, por exemplo, em grandes nomes da literatura como Dostoiévski, Proust, Joyce, Saramago, nosso Guimarães etc., não encontramos neles facilidades, nós é que temos que, com a fluência da leitura, adaptar o mecanismo de nosso cérebro pra alcançá-los.

Esse imenso prólogo foi pra situar a arte de Marcio Policastro, a quem considero, na atualidade, não um dos melhores compositores do
Clube Caiubi, mas um dos melhores compositores do Brasil. Policastro é um artista completo: letrista originalíssimo, dono de uma poesia urbana mordaz, ácida e ao mesmo tempo não desprovida de humor; melodista dos mais inspirados, capaz de ir do rock ao xote sem perder o estilo; cantor afinado; violonista de pegada "nervosa" e harmonias inteligentes, que sabe extrair de seu instrumento percussividade e certa sujeira roqueira; e, por último, é um belo exemplar de arranjador intuitivo, daqueles que sem academicismo sabem com que roupa querem vestir suas canções. Ah, ia me esquecendo de acrescentar que Policastro também é talentosíssimo pra musicar letras alheias, arte que desempenha com tamanha facilidade como se se tratassem de letras suas.

E por que você não conhece Marcio Policastro? Os adjetivos acima citados geralmente são dirigidos por críticos a artistas com algum destaque no panorama musical. Eu lhe respondo: Você não o conhece porque Policastro trabalha sem pressa. Seu primeiro CD vem sendo lapidado ao longo dos últimos anos com a paciência (e a boa mão) dos artesãos. Ele sabe o que faz e onde quer chegar. E sabe, sobretudo, que suas palavras não perderão o viço se demorarem mais um ou dois anos. A música de Policastro é como um bom vinho, melhora com o tempo. É moderna, mas sem cair na armadilha de ser demasiado moderna, pois o fim destas é perderem o prazo de validade em pouco tempo.

Conheci Marcio Policastro numa das primeiras noites em que fui ao
Clube Caiubi. Lembro-me até da primeira canção dele que ouvi, Cine Caiubi (parceria com Almir Teixeira). E já gostei de cara, principalmente pela ousadia de ele cantar versos que, de tão abusivamente femininos, davam a impressão de ser homossexuais: "Vê se te manca, sujeito/ e quebra logo esse clima/ eu sei, bem sei, é perfeito/ ficar me olhando de cima/ mas só que a noite é tão curta/ e a vida é muito mais curta ainda/ [...] Eu conheci ontem à noite um cara tão legal/ me disse que tá de passagem comprada pra Montreal/ achei demais, pois conhecer Quebec é o que eu mais desejo/ me convidou para fumar um beque e a gente deu uns beijo'".

E aí Policastro abriu sua caixa de Pandora e vi que a gama de assuntos do moço era um poço (alucinógeno) sem fundo. E o modo como ele escolhia as palavras pela sonoridade, sem subtrair-lhes o sentido, era de tirar o fôlego. Adentrei de ouvidos limpos nesse universo sacroprofano e me deliciei com a descoberta de uma música tão necessária nos dias de hoje, de ontem e de sempre. Mas à distância. Cheguei mesmo a ficar com certa vergonha de mostrar minhas letrinhas comportadas a um compositor tão anárquico. Mas acabei sendo levado até ele pela mão (literalmente) de sua namorada (hoje, esposa) Vanessa, que, com uma desenvoltura de velha conhecida, apresentou-se a mim dizendo que seu namorado queria me conhecer. Fiquei lisonjeado, ainda mais pela inusitada maneira como aconteceu. Cumprimentamo-nos e, superada a timidez (de ambos) inicial, em pouco tempo já nos tratávamos como irmãos. Ah, tem um detalhe: No começo, no
Caiubi, algumas pessoas nos confundiam. Nunca entendi bem o porquê disso, se eu sou bem mais bonito que ele. Mas essa é uma questão de importância reduzida, pois, em se tratando de talento, a beleza é só uma qualidade menor.

E, sim, ele me pediu uma letra! E esse pedido foi uma das melhores coisas que já aconteceram em minha... poderia dizer carreira? Enfim, foi algo deliciosamente desafiador pra alguém que se considera letrista. Ainda mais pra alguém que sempre se alimentou de suas influências. E foi assim que eu passei a compor letras, digamos, policastrianas. E, pra meu espanto, a química se deu, e, em pouquíssimo tempo, tínhamos dezenas de canções. Detalhe: quando desenvolvemos um estilo, por mais que "imitemos" terceiros, no final, sempre acabamos deixando nossa marca. Dessa forma, espelhando-me na poesia de Policastro, alarguei meus horizontes poéticos e tratei de assuntos novos, sob minha ótica, que ganharam melodias fulminantes dele. Nasceu dessa parceria um resultado deliciosamente híbrido. E foram tantas canções, que um dia ele me reclamou, desabafando: "Irmão, depois que te conheci minha obra poética diminuiu consideravelmente". É que, Policastro, embora não pareça, tem um lado caymmiano gritante, e eu, com minha safra sempre renovada, enchi-lhe os porões musicais de letras.

E a usina de canções continuou a todo vapor quando expandimos nosso leque de parcerias, com o advento do 4+1 (leia texto sobre
Álvaro Cueva), grupo formado por nós dois mais Álvaro e Alê Cueva e Kana. O 4+1 teve vida curta, mas espalhou alegria por São Paulo numa série de shows memoráveis, que sempre contavam com um convidado; gente boa como Tavito, Zé Rodrix, Élio Camalle, Lis Rodrigues e Ricardo Soares foram só alguns dos muitos que participaram. Como disse no texto do Álvaro, pelo fato de o 4+1 não ser uma banda e sim um grupo de solistas, não conseguiu durar o suficiente pra ao menos gravar o tão esperado (pelo menos por mim) CD.
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E seria realmente de se espantar se não se desse o fim que se deu, quando cada um dos membros tinha pelo menos um projeto paralelo. Policastro já andava por essa época arquitetando seu CD. E não parava de compor, o que dificultava e muito a escolha do repertório. E foi justamente ele o protagonista de um dos melhores shows a que assisti da turma caiubista. Marcio Policastro e banda fizeram um show espetacular no finado Villaggio Café, quando este ainda se localizava no bairro do Bixiga. Esse show, o primeiro solo de Policastro pós-Caiubi, deu-lhe o ânimo que faltava pra tirar o projeto da gaveta e trazê-lo à vida. De lá pra cá já vimos alguns dezembros, mas Policastro segue firme, com sua paciência de Jó e sua meticulosidade, experimentando, compondo, gravando. Tenho fé em que o ano de 2011 nos dará este tão especial presente. Anote aí em sua agenda o nome do moço, pra não esquecer. E peça pra Papai Noel, pro amigo secreto, pro namorado, ou vá lá na loja e compre você mesmo, enfim, dê-se de presente o universo musical de Marcio Policastro no Natal de 2011.

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Ouça alguns dos estudos de Policastro
aqui: http://clubecaiubi.ning.com/profile/OXdoPoema

Leia as letras aqui: http://clubecaiubi.ning.com/profiles/blogs/marcio-policastro

Policastro também está no Caiubi: http://clubecaiubi.ning.com/profile/MarcioPolicastro

Por Léo Nogueira


terça-feira, 18 de janeiro de 2011

A LIBERDADE DA BELEZA

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Fotografia: MQ
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segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

LUCINA - BRASÍLIA

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Primavera


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O verde engolia o silêncio
E invejava o instante
Inventando mormaços

Havia entrecortes de solidão
Espalhando ermos e sinais

Ali o inesperado
Era esperado
Entre suores e restos de adolescência
Como encanto conspirado
Em formas e zelos

Dois seres
Recitavam seus
Sins e nãos
Jurando um jeito de nascer


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MQ
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domingo, 16 de janeiro de 2011

RUY GODINHO – ENTÃO, FOI ASSIM?

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BRASILEIRINHO
(Waldir Azevedo/Pereira Costa)

O brasileiro quando é do choro é entusiasmado
Quando cai no samba, não fica abafado
E é um desacato quando chega no salão
Não há quem possa resistir quando o chorinho brasileiro faz sentir
Ainda mais de cavaquinho com um pandeiro
E o violão na marcação
Brasileirinho chegou, a todos encantou, pôs todo mundo a dançar
A noite inteira, no terreiro, até o sol raiar
E quando o baile terminou a turma não se conformou
Brasileirinho abafou
Até um velho que já estava encostado nesse dia se acabou.
Para falar a verdade estava conversando com alguém de respeito
Ao ouvir o grande choro eu dei logo um jeito
E deixei o camarada falando sozinho
Gostei, pulei, dancei, pisei, até me acabei
E nunca mais esquecerei o tal chorinho brasileirinho
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Então foi assim...
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O samba-choro Botões de Laranjeira, de Pedro Caetano e o choro Brasileirinho, do excepcional cavaquinista e compositor Waldir Azevedo1 têm em comum o fato de haverem sido criados a partir de solicitações infantis.

Botões de Laranjeira é abordada em outro capítulo. Brasileirinho, música obrigatória do repertório chorístico, nasceu de forma bastante curiosa. D. Olinda, esposa de Waldir Azevedo, tinha um primo de nove anos chamado Deoclécio. No Natal de 1944, provavelmente, ele ganhou num concurso promovido pelo jornal A Noite, um cavaquinho de plástico, que se tornou seu brinquedo favorito. Com o uso constante, o instrumento
ficou imprestável, todo quebrado e com apenas uma corda.

Meses depois, num domingo, Deoclécio se encontrava na casa de Waldir com o dito cavaquinho. Conhecedor dos talentos do músico, o garoto pediu para que ele tocasse algo no instrumento. Waldir tentou explicar que não ia conseguir tocar nada num brinquedo quebrado e que o cavaquinho de verdade que ele tinha estava guardado num armário da Rádio Clube. Deoclécio não aceitou a desculpa, protestou cheio de manha, insistindo em ser atendido. Para dar um basta à situação, Waldir pegou o tal cavaquinho das mãos do garoto e arriscou um solo na única corda que lhe restara, repetindo-o diversas vezes, até memorizá-lo.

À noite, quando foi trabalhar, Waldir comentou com os músicos do regional de Dilermando Reis – do qual fazia parte – o que havia lhe ocorrido. E começou a tocar o fragmento melódico. Jorge Santos2, o violonista do conjunto, gostou e foi logo criando uma harmonia no violão para acompanhá-lo.

Mais tarde, em pleno programa Alma do Sertão, apresentado por Renato Murce, na falta de uma das atrações, coube a Dilermando Reis a tarefa de improvisar números musicais sertanejos para cobrir o buraco. Na seqüência, Renato pediu a Dilermando que tocasse algo mais animado. Este alegou que estava com o dedo machucado e passou a bola para Waldir, que se justificou dizendo que não tinha nada preparado para o momento, já que sua função no regional era fazer apenas a base. Com o impasse criado e diante do fato de ser um programa de auditório, ao vivo, Marco Antônio Bernardo3 conta que Dilermando deu um ultimato:
“Toca, senão é despedido!”

Não restou alternativa para Waldir senão tocar repetidas vezes a melodia “sem-vergonha” que havia criado pela manhã. A uma nova ordem de Dilermando, Waldir improvisou uma segunda parte com naturalidade surpreendente, levando o público aos aplausos entusiasmados.

Quando o programa chegou ao fim, Dilermando se aproximou de Waldir, elogiou o choro e pediu que ele tocasse de novo. “Mas, como? Eu improvisei aquela porcaria na hora!” retrucou o compositor.

Sorte da musicografia brasileira que o programa foi gravado em acetato. Assim, Waldir pode reaprender o choro e incluí-lo no repertório do regional, batizado por Dilermando como Brasileirinho.

No ano de 1949, ao perder do casting da gravadora Continental o bandolinista Jacob do Bandolim4, Braguinha5, diretor da empresa na época, convidou Waldir para gravar o choro. O convite foi aceito, mas como não botava muita fé, reservou a ele o lado B do 78 RPM, registrando Carioquinha, um choro cadenciado, do lado A. Porém, Brasileirinho surpreendeu e transformou-se no maior sucesso, inclusive do carnaval de 1950 – fato raro para um choro – vendendo milhares de cópias.

Em julho daquele ano, Ademilde Fonseca gravou Brasileirinho (letra de Pereira Costa) com impressionante afinação e rapidez, fato que contribuiu bastante para a consolidação do título de Rainha do Choro Cantado.

O sucesso foi tanto que Waldir Azevedo ganhou uma pequena fortuna de direitos autorais, suficiente para que D. Olinda comprasse um apartamento novo no bairro do Grajaú, no Rio de Janeiro.



1 27/01/1923 Rio de Janeiro-RJ 20/9/1980 São Paulo-SP.
2 Jorge Geraldo do Espírito Santo.
3 Waldir Azevedo: um cavaquinho na história.
4 Jacob Pick Bittencourt.
5 Carlos Alberto Ferreira Braga


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sábado, 15 de janeiro de 2011

Juliana Caymmi - Nasce uma estrela


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Quem ouvir Juliana Caymmi cantar proporcionará a si mesmo surpreendentes momentos de felicidade. Seu canto tem a suavidade de quem sabe que pode encantar quem quiser. Ele pode ser dramático, ou mesmo mordaz; mas o que mais impressiona nele é a simplicidade com que soa, mesmo sendo tudo isso e mais aquilo.


Com jeitinho meio maroto, a voz de Juliana Caymmi veio sambar; com seu modo de interpretar, a roda se abre para melhor vê-la gingar; e até o tempo interrompe o seu passar para que ela esteja pronta para mudar sem que ele, o tempo, ao menos perceba que ele, para ela, não vai passar.

Ainda que seu sobrenome revele que ela é uma Caymmi (filha de Danilo, compositor de boa linhagem, e de Ana Terra, compositora de talento, além de neta do grande Dorival e sobrinha de Nana e de Dori), Juliana arrebata quem a escuta pela primeira vez. Sua voz é poderosa, de arrepiar os pelos.

E para ainda mais realçar seu timbre e sua afinação, os bons arranjos de Ricardo Matsuda, assim como os instrumentistas que os reproduzem, estão à altura da excelente cantora que a moça é.

Além dos violões, da viola caipira e do baixo de Matsuda, a acompanhá-la estão Ramon Montagner, Chico do Pandeiro e Lucas da Rosa (percussão); Cleber Almeida e Pepa D’Elia (bateria); Mané Silveira (flauta e sax tenor); Tiago Costa (teclados); Luis Kalau (violão de sete cordas); Rubinho Antunes (flugel horn e trompete); Daniel Romanetto (cavaquinho) e Beto Kobayashi (guitarra).

Para abrir Para Dançar a Vida (Kalamata), seu primeiro CD, Juliana uniu “Vento Noroeste” (Elpídio dos Santos e Juraci Rago) a “Flecha de Prata” (Danilo Caymmi): o poder da voz ampliando a força dos cantos praieiros.

A delicadeza da flauta e do violão estão em “Moço” (Juliana Caymmi). A flauta se destaca em intermezzo arrebatador. Juliana brilha.

“Porque Sou Carioca” (Juliana Caymmi e Ana Terra) é letra de mãe para filha. Coisa de craque.

Em “Não Só Pela Chuva” (Fred Martins e Marcelo Diniz), o trompete em surdina é vigoroso. A bateria e o baixo pontuam.

Apenas a viola caipira e o violão ponteiam suavemente. Juliana emociona no clássico “Desenredo” (Dori Caymmi e Paulo César Pinheiro).

Em “Coco Praieiro” (Eudes Fraga e Paulo César Pinheiro), o pandeiro dá a pisada, a zabumba vai, a viola brilha... Meu Deus!

“Pra Dançar a Vida” (Juliana Caymmi) começa com o violão e o baixo fretless. A bateria logo se junta a eles. Bela canção.

Piano, violão, baixo acústico e a bateria, tocada com vassourinhas nos pratos, criam a atmosfera para Juliana se deliciar com a linda “Guanabara” (Fred Martins).

E ela segue com “Paixão Latina” (Selma Boradian); “Aonde o Tempo Vai” (Ricardo Matsuda); “Sempre Viva (Amor Perfeito)” (Luis Perequê); e com a sua amorosa “O Tempo”.

Ao fechar com “Flor de Ir Embora”, de Fátima Guedes, Juliana Caymmi canta: “E lá vou eu/Flor de ir embora/Eu vou/Agora esse mundo é meu”. De fato, o mundo é seu, moça: cantando desse jeito, sua sina é ser reconhecida como uma grande intérprete.


Aquiles Rique Reis, músico e vocalista do MPB4
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sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

ENTÃO, FOI ASSIM? - RUY GODINHO

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RUY GODINHO - RODA DE CHORO

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RODA DE CHORO – SÁBADO – DIA 15.01.11

No 1º bloco o destaque vai para o grupo Nosso Choro, de São Paulo e o som do CD Primeira Classe, que contempla em seu repertório, composições de todas as fases do Choro.

No 2º bloco teremos o som do CD Avenida Brasil, primeiro disco solo do requisitado pianista, compositor e arranjador carioca Cristovão Bastos, lançado em 1996.

No 3º bloco a tônica vai ser o trabalho do renomado cavaquinista e compositor carioca Valmar Amorim e o som do CD Valmar Amorim e Waldir Azevedo, lançado em 2010.

No 4º bloco teremos um momento de afago à sensibilidade: a revisita do CD O Mestre Leo Peracchi e a Jazz Sinfônica – Canções de Tom e Vinícius. Repertório impecável, arranjos do Mestre Leo Peracchi, interpretado por divas de nossa música, acompanhado pela Orquestra Jazz Sinfônica de São Paulo.

O 5º bloco traz o CD Luiz Junior, com a performance deste excepcional violonista, compositor e arranjador piauiense, radicado em São Luís-MA.

Ouça pela internet:

Rádio Câmara, Brasília: www.radio.camara.gov.br (rádio ao vivo), sábados, 12h.

Rádio UEL FM, de Londrina, quintas-feiras, 21h.

Rádio Utopia FM, Planaltina-DF, quartas-feiras, 18h.


Produção e Apresentação: Ruy Godinho
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quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Sem sonhos


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Onde está o riso, Maria
E tuas mãos abençoadoras
Onde está o dia, Maria
E o teu olhar amoroso

Nenhum contentamento existe
Falta tua voz cominando
Minha rebeldia

Onde estão os riscos, Maria
Que corri nas madrugadas
Embriagado de volúpia
Sonhando plenitudes

Agora sonhos não há
Só as horas procurando
Alguma harmonia
Nos restos de lembrança
Da vida loureira
Brilhando devaneios

Não há sonho, Maria
Mas não se apiede de mim
Porque vivida a vida está
No futuro do meu passado
E nele nascida
Sempre estarás



MQ
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quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Patativa do Assaré - O Vaqueiro

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Eu venho dêrne menino,
Dêrne munto pequenino,
Cumprindo o belo destino
Que me deu Nosso Senhô.
Eu nasci pra sê vaquêro,
Sou o mais feliz brasilêro,
Eu não invejo dinhêro,
Nem diproma de dotô.

Sei que o dotô tem riquêza,
É tratado com fineza,
Faz figura de grandeza,
Tem carta e tem anelão,
Tem casa branca jeitosa
E ôtas coisa preciosa;
Mas não goza o quanto goza
Um vaquêro do sertão.

Da minha vida eu me orgúio,
Levo a Jurema no embrúio
Gosto de ver o barúio
De barbatão a corrê,
Pedra nos casco rolando,
Gaios de pau estralando,
E o vaquêro atrás gritando,
Sem o perigo temê.

Criei-me neste serviço,
Gosto deste reboliço,
Boi pra mim não tem feitiço,
Mandinga nem catimbó.
Meu cavalo Capuêro,
Corredô, forte e ligêro,
Nunca respeita barsêro
De unha de gato ou cipó.

Tenho na vida um tesôro
Que vale mais de que ôro:
O meu liforme de côro,
Pernêra, chapéu, gibão.
Sou vaquêro destemido,
Dos fazendêro querido,
O meu grito é conhecido
Nos campo do meu sertão.

O pulo do meu cavalo
Nunca me causou abalo;
Eu nunca sofri um galo,
pois eu sei me desviá.
Travesso a grossa chapada,
Desço a medonha quebrada,
Na mais doida disparada,
Na pega do marruá.

Se o bicho brabo se acoa,
Não corro nem fico à tôa:
Comigo ninguém caçoa,
Não corro sem vê de quê.
É mêrmo por desaforo
Que eu dou de chapéu de côro
Na testa de quarqué tôro
Que não qué me obedecê.

Não dou carrêra perdida,
Conheço bem esta lida,
Eu vivo gozando a vida
Cheio de satisfação.
Já tou tão acostumado
Que trabaio e não me enfado,
Faço com gosto os mandado
Das fia do meu patrão.

Vivo do currá pro mato,
Sou correto e munto izato,
Por farta de zelo e trato
Nunca um bezerro morreu.
Se arguém me vê trabaiando,
A bezerrama curando,
Dá pra ficá maginando
Que o dono do gado é eu.

Eu não invejo riqueza
Nem posição, nem grandeza,
Nem a vida de fineza
Do povo da capitá.
Pra minha vida sê bela
Só basta não fartá nela
Bom cavalo, boa sela
E gado pr’eu campeá.

Somente uma coisa iziste,
Que ainda que teja triste
Meu coração não resiste
E pula de animação.
É uma viola magoada,
Bem chorosa e apaxonada,
Acompanhando a toada
Dum cantadô do sertão.

Tenho sagrado direito
De ficá bem satisfeito
Vendo a viola no peito
De quem toca e canta bem.
Dessas coisa sou herdêro,
Que o meu pai era vaquêro,
Foi um fino violêro
E era cantadô tombém.

Eu não sei tocá viola,
Mas seu toque me consola,
Verso de minha cachola
Nem que eu peleje não sai,
Nunca cantei um repente
Mas vivo munto contente,
Pois herdei perfeitamente
Um dos dote de meu pai.

O dote de sê vaquêro,
Resorvido marruêro,
Querido dos fazendêro
Do sertão do Ceará.
Não perciso maió gozo,
Sou sertanejo ditoso,
O meu aboio sodoso
Faz quem tem amô chorá.


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segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

RUY GODINHO - ENTÃO, FOI ASSIM?

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SOZINHO
(Peninha)

Às vezes, no silêncio da noite
Eu fico imaginando nós dois
Eu fico ali sonhando acordado, juntando
O antes, o agora e o depois
Por que você me deixa tão solto?
Por que você não cola em mim?
Tô me sentindo muito sozinho!
Não sou nem quero ser o seu dono
É que um carinho às vezes cai bem
Eu tenho meus segredos e planos secretos
Só abro pra você mais ninguém
Por que você me esquece e some?
E se eu me interessar por alguém?
E se ela, de repente, me ganha?
Quando a gente gosta
É claro que a gente cuida
Fala que me ama
Só que é da boca pra fora
Ou você me engana
Ou não está madura
Onde está você agora?
Quando a gente gosta
É claro que a gente cuida
Fala que me ama
Só que é da boca pra fora
Ou você me engana
Ou não está maduro
Onde está você agora?
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Então, foi assim...
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Clariana Alves só soube que foi a musa inspiradora do grande sucesso
nacional Sozinho, no decorrer de 1999, quando Peninha1 passou a contar a
história da canção em entrevistas, depois da repercussão causada com a
gravação de Caetano Veloso.

Sozinho nasceu com alma feminina. O compositor e cantor Peninha
escreveu a letra em 1995, inspirado na filha Clariana Alves. Ela tinha 14
anos e estava sofrendo por um namorado que a deixava muito só. “Um dia,
sem querer, escutei uma conversa dela com ele ao telefone. Eu estava com
o violão e fiz a música, baseado na solidão que ela estava sentindo. A letra
tem as palavras e a alma dela. Tanto que pensei que tinha feito uma canção
para adolescentes. Acho que a música pegou tanto por causa dessa pureza
de sentimentos”, diz Peninha em entrevista à revista Marie Claire2.

A canção, grafada como Sozinha, foi gravada pela primeira vez por
Sandra de Sá ainda em 1995.

“Antes disso, meu pai sempre dizia que essa música era a ‘minha cara’.
Eu ficava brava, achava que ele estava tentando me dizer que meu relacionamento
era ruim. Hoje vejo que ele passou na letra uma preocupação
comigo”, diz Clariana para a mesma revista. “Sempre que brigávamos, meu
namorado punha a música e me dizia: ‘Pense bem’. Uma vez terminamos,
ele foi à minha casa e colocou o CD do Caetano no repeat. Ouvi a música
a noite inteira e acabei voltando. Até hoje, toda vez que ele ouve a música,
me liga. Nossos amigos o chamam de ‘Sozinho’. Ele sempre fala que, se a
gente não casar, eu vou estar velhinha e me lembrar dele toda vez que ouvir
essa música.”

Sozinho, de Peninha, foi gravado por Tim Maia e Sandra de Sá, mas
foi com a gravação de Caetano Veloso, do CD Prenda Minha, de 1998, que a
música explodiu no país inteiro.

1 Aroldo Alves Sobrinho 17/02/1953 Rio de Janeiro-RJ.
2 Edição de novembro de 2000.



Ruy Godinho
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domingo, 9 de janeiro de 2011

SUELI ADUAN - As mãos


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Uma mulher passou ao meu lado
Na tarde silenciosa.
Andava vagarosa.
Arrastava os pés.
Único barulho do seu ser.
Em suas mãos pêras.
Em seus olhos fundos.
A calma, o vagar.
A perplexidade.
Olhei-a
Ela também a mim
A professora de piano
As mãos tão ágeis de outrora.
Hoje seguram pêras.
As pêras.
As horas.
O ser.
Tudo apodrece.


http://sueli-aduan.blogspot.com/
http://escritoslinguagemnocorpo.blogspot.com/
http://oficiodeescrever.blogspot.com/
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sábado, 8 de janeiro de 2011

JAC. RIZZO - Desordem de mim


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A poesia é isso
- quando ela bate no peito -
descarrilamento da alma
desassossego.

As palavras saem dos trilhos sobre os quais deveriam rodar. E assim, livres, elas não precisam de lógica ou de bom senso. Correm soltas por campos abertos, desconhecendo destinos. É assim, quando a palavra escolhe ser poesia. Se aventura por caminhos estranhos, muitas vezes por despenhadeiros, por precipícios, numa corrida insana. Eu sempre a deixo sair, como os amores que teimo em deixar soltos, feito cavalos selvagens. Deixo o sentimento se extraviar, desamparado, levado tantas vezes por águas turbulentas, numa enxurrada de emoções. A poesia é assim...

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Jac. Rizzo - http://jacrizzo.blogspot.com/
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sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

VINICIUS DE MORAES - A GENTE NAO FAZ AMIGOS, RECONHECE-OS

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"Tenho amigos que não sabem o quanto são meus amigos, nem percebem o amor que lhes devoto e a absoluta necessidade que tenho deles.


A amizade é um sentimento mais nobre do que o amor, eis o que permite que o objecto dela se divida em outros afectos, enquanto o amor tem intrínseco o ciúme.

Eu poderia suportar, embora não sem dor, que tivessem morrido todos os meus amores, mas enlouqueceria se morressem todos os meus amigos! Ate mesmo aqueles que não percebem o quanto são meus amigos e o quanto a minha vida depende de suas existências...

A alguns deles não procuro, basta-me saber que existem. Esta mera condição me encoraja a seguir em frente pela vida. Mas porque não os procuro com assiduidade, não posso dizer-lhes o quanto gosto deles.

Muitos não sabem que estão incluídos na sagrada relação de meus amigos. Mas é delicioso que eu saiba e sinta que os adoro, embora não o declare, nem os procure.

E, às vezes, se os procuro, noto que não têm noção de como me são necessários, de como são indispensáveis ao meu equilíbrio vital, porque fazem parte do mundo que, tremulamente, fui construindo e tornaram-se alicerces do meu encanto pela vida. Se um deles morrer, ficarei torto para um lado.

Se todos morressem, desabaria!

Por isso é que, sem que eles saibam, rezo pela vida deles e me envergonho porque sei que essa minha prece é, em síntese, dirigida ao meu bem-estar. E talvez fruto do meu egoísmo...
Por vezes mergulho em pensamentos sobre alguns deles. Quando viajo e fico diante de lugares maravilhosos, cai-me alguma lágrima por não estarem junto de mim, compartilhando daquele prazer....

Se alguma coisa me consome e me envelhece é que a roda furiosa da vida não me permite ter sempre ao meu lado, morando comigo, andando comigo, falando comigo, vivendo comigo, todos os meus amigos e, principalmente os que só desconfiam ou talvez nunca saibam que são meus amigos!

A gente não faz amigos, reconhece-os.”

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quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

CAMILO DELDUQUE - Santo atrevido


Para o querido pássaro Marcos Quinan


Lá no fundo da sala
O mogno seco entalhado
Olha o santo atrevido
Escrever coisas de encanto
Madeira que deve ser
O espírito santo da inspiração

Asas de anjo
Alma de arcanjo
Violão de acorde afinado
Afinidade em vez de afinação

O homem que a deus
Se recusa tanto
Acusa-se sob o manto
Tentando de vez entender
Na insensatez do saber
Um outro no canto da espera
Que brinca na boca da fera
A fêmea devoradora
Sereia da solidão


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quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Entrega

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Queria um dia
Enrodilhar-me no teu corpo
E sair do meu mundo
Entrando no teu
Trazendo o teu mundo
Pra dentro do meu
Entregando-te ereto
O amor dos meus gestos
Enquanto são meus



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MQ
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terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Desesquecer


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Todos os dias
Desesqueço teu olhar
Sonho com as rimas
Que as palavras
Sabem me dar

Todos os dias
Dentro de um verso
Esqueço os instantes
Em que não estás

Todos os dias
A saudade volta
Ao poema onde sei
Que sempre estarás

Todos os dias
Perco-me no tempo
Desesquecendo de te lembrar


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MQ
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segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

RUY GODINHO - ENTÃO, FOI ASSIM?

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ESCRAVO DA ALEGRIA
(Toquinho/Mutinho)

Eu que andava nessa escuridão
De repente foi me acontecer
Me roubou o sonho e a solidão
Me mostrou o que eu temia ver
Sem pedir licença nem perdão
Veio louca pra me enlouquecer
Vou dormir querendo despertar
Pra depois de novo conviver
Com essa luz que veio me habitar
Com esse fogo que me faz arder
Me dá medo, vem me encorajar
Fatalmente me fará sofrer
Ando escravo da alegria
Hoje em dia, minha gente
Isso não é normal
Se o amor é fantasia
Eu me encontro ultimamente
Em pleno carnaval
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Então, foi assim...

Quando a produtividade da parceria Vinicius & Toquinho naturalmente
entrou em recessão, havia uma turma de críticos que duvidava que
Toquinho1 conseguisse manter o nível de criatividade. E olha que ele já
havia feito Samba Para Vinicius, com Chico Buarque - escondido do homenageado
por causa do terrível ciúme que Vinicius2 sentia dos parceiros.
Compôs Que Maravilha, com Jorge Benjor e principalmente a produção de
altíssima qualidade – mantida paralelamente ao casamento musical com
Vinicius – com o baterista e compositor Mutinho3, que inclui a emocionante
O Caderno, Turbilhão, Ao que vai chegar e Escravo da Alegria.

Esta última tem uma história especial. É do tempo das intermináveis
temporadas universitárias pelo interior de Minas Gerais, viajando por estradas
onde são freqüentes aqueles enormes caminhões que exibem frases
conhecidas como “filosofia de pára-choque”. Geralmente são juras de amor,
pequenas orações, pensamentos, promessas de fidelidade e de breve retorno,
além de poesia de gosto duvidoso.

O carro em que Toquinho viajava se aproximou da traseira de um caminhão
e permaneceu alguns minutos, antes de fazer a ultrapassagem. Foi
então que ele leu a seguinte frase: “Se o amor é fantasia, eu me encontro em
pleno carnaval”.

Toquinho a achou linda. Tudo a ver com seu estado de espírito. Ele
que tinha a fama de irrecuperável garanhão, solteiro convicto e namorador
compulsivo, tinha acabado de ser interceptado em pleno vôo. Seu coração
fora tocado de forma avassaladora pela mineira Mônica e estava apaixonadíssimo,
em estado de graça, achando tudo lindo.

Chamou o parceiro Mutinho e fizeram o samba. Toquinho afirma a
João Carlos Pecci4 que: “Depois dessa frase linda [a música] já estava praticamente
feita. Era só procurar as palavras, a melodia, e colocar na ordem”.

Mais uma prova de que o amor é transformador. Uma simples filosofia de
pára-choque virou um belo samba. “Uma verdadeira declaração de amor à Mônica,
minha mulher”, confessa Toquinho.

Após o desencarne do Poetinha, Toquinho, sem grandes alardes, continuou
sua bonita trajetória. Fez diversas músicas com compositores da Itália – país
onde brilha sem que o Brasil tome conhecimento – entre elas, a eterna Aquarela,
que merecerá destaque em outro volume.


1 Antonio Pecci Filho 06/7/1946 São Paulo-SP.
2 19/10/1913 Rio de Janeiro-RJ 09/7/1980 Rio de Janeiro-RJ.
3 Lupicinio Rodrigues Sobrinho.
4 Toquinho: 30 anos de música.



Ruy Godinho
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domingo, 2 de janeiro de 2011

Maria


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Não troque teu nome, Maria
Porque no teu nome
Está a construtura
De todas as horas
Nelas escondo meus medos
Entrego a compunção ao silêncio
E vivo o amargo do descrédito

Não toque em teu nome, Maria
Porque nele está minha forma de fé
Que suporta as tentações

No teu nome, Maria
Está entretecida a vida
E o prumo do meu coração

Por isso, Maria
Nunca troque teu nome não


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MQ
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sábado, 1 de janeiro de 2011

VERGONHA

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Sete sentidos


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Em cada olhar
E no caminho das mãos
No ouvir a voz
Sentir o perfume
E o gosto do teu corpo
Deixei na lembrança
Enlevo também
De sentir saudade

Pertenci...

Sete sentidos
Com todos eles te amei
No possível do tempo
Se estando perto
Em estando longe
Com cada um deles
No amor destinado trancei
Em cada deles mais sete criei
E dos sete mais sete
E desses mais outros e outros
Decerto retrancei

Pertenci...

Num jeito de amor
Descobri tantos sentidos
Embrutecidos definhando
Pedindo razão para formalidades
E pequenos rancores

E na concretude
Um sonho tardã
Foi arrancado só dos instantes
E pôs face na tua ausência

Pertenci...


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MQ
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