Cor-de-terra, sobrepondo as gradações
como se quisesse ter uma luminosidade propositadamente opaca; ficava na parede
fronteiriça à porta de maneira que, quem entrasse, não via imediatamente.
Ela viu, admirou e não conseguiu mais
tirar os olhos. Comprou e levou para casa.
Alguns meses passaram-se, em
tentativas de achar o lugar ideal para pendurá-lo; cada parede que
experimentava, sentia que não era ali, parecia faltar alguma coisa. Deixava por
uns dias.
Ele se entortava ou amanhecia de
cabeça para baixo. A assinatura do artista parecia mudar de lugar; não era
loucura, ela media e comprovava. Um mistério.
Voltou à galeria, queria saber mais,
que história tinha, quem era o artista?
- Não sabemos nada dele, quando compramos o
negócio, já o encontramos na parede pendurado -responderam.
Foi num dos quartos desocupados da
casa; quando aproximou o quadro da parede, a impressão que teve foi de um puxão
para um encaixe perfeito. Ali ficou.
Para aquele quarto ela acabou se
mudando e mudando seu cotidiano, passava horas olhando a pintura.
Todos os dias a figura quase disforme
retratada parecia ir desaparecendo, se rearranjando, trocando tons, mudando
camadas de cor como se transformasse em terra. Cada dia ela se trancava mais no quarto,
até que resolveu não sair mais dali.
Deram por sua falta e, ao arrombarem a
porta, não a encontraram, sentiram apenas o cheiro forte de terra orvalhada.
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