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Começou no Largo do Rosário, no
meio da tarde, o sol marcava em riste. Na rua lateral, descendo no passo,
vinham dois cavaleiros em proseio, delatando o sossego daquela hora, nem poeira
os cascos dos cavalos arrancavam do chão. O ar parado, naquele mormaço quente,
espantava até os cachorros para a sombra e beirais das poucas casas que iam
nascendo ali.
O primeiro respingo caiu nas mãos
de um dos cavaleiros que enrolava o cigarro de palha, bem na hora que ele
calcava o fumo com a lâmina do canivete. Com o respingo, veio como de muito
longe, o tropel parecendo boi bravo fugindo da boiada. E aí começou a chover de
verdade, o barulho foi aumentando e o fedor foi consumindo o normal do cheiro
do lugar. O povo começou a sair na rua sem saber o que era aquela chuva grossa,
os cavalos se inquietaram e começaram a pular derrubando um dos cavaleiros,
enquanto o outro mais sabido desmontou logo. O chão tremia, chegou a derrubar a
parede de adobe da segunda casa da rua. As mulheres começaram a rezar e gritar:
- Acode, Antenor!
- É o fim do mundo, meu Deus!
- Calixto, tira a Duvinha da casa!
O arraial todo virou um
pandemônio, era gente correndo pela rua gritando, era cachorro uivando, cavalo
correndo sem o cavaleiro, as portas das casas batendo e as telhas pulando fora
dos telhados. Ninguém atinava o que estava acontecendo, parecia o fim do mundo.
Com prazo de minutos, formou no
começo da rua principal aquela ventania que veio subindo como um redemoinho,
cegando os olhos de todos, aquele barulhão de mil bois passando desembestados e
aquela catinga, num céu anuviado, marrom.
De repente passou, ficou aquele
silêncio pesado e aquele cheiro, que ninguém conhecia, carregando o ar. Logo,
todos começaram a se juntar na porta da igreja em orações.
O monsenhor era o mais abalado de
todos devido à sujeira que escorria pela torre da igreja, recém pintada.
Passado o susto, a conversa era só
sobre o acontecido, cada um fazia sua conjectura.
- Vamos examinar, parece merda,
dizia o sapateiro Damim.
- É bosta de porco, completava o
intendente que era dono do maior chiqueiro do Arraial, portanto, conhecia o
excremento.
- Será que o vento levantou seus
capados do chiqueiro, doutor Benedito? Perguntou o monsenhor.
Aquela gente toda na porta da
igreja seguiu o monsenhor e o intendente até a casa deste para ver quantos
porcos faltavam no chiqueiro e qual o tamanho do estrago que aquele pé de vento
tinha feito.
Lá chegando, encontraram tudo no
lugar, não faltava nenhum animal mas os capados se assustaram com aquela
quantidade de gente.
No lusco-fusco da tarde, todos
reunidos agora na porta da casa do intendente, sem entender o acontecido, um
menino aponta para o começo da rua e diz:
- Olha! Outra pueira vem vino.
Todos firmaram as vistas naquela
direção e viram, assustados, o poeirão. Era Tiburço mais o menino Quelé tocando
a boiada. Tiburço chegou rindo.
- Da comitiva prá me esperá,
gostei! Mas do cheiro não! Boa tarde, seu padre. Boa tarde, doutor Benedito.
Tarde prá todos.
- Padre não, seu Tiburço,
monsenhor viu! Monsenhor! Repreendeu o religioso.
- O senhor tem alguma coisa a ver
com o que sucedeu aqui, perguntou o intendente.
- Não, doutor Benedito, dele passá
aqui não, mas o nó no rabo fui eu quem dei, pur isso a brabeza dele.
E foi saindo, ajeitando o berrante
para o toque de passagem, deixando a poeira no assombro de todos.
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