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Magro, muito magro. Andava pela rua
puxando o ambiente em volta pra dentro de si. Parecia, em tempo integral,
ensimesmado; como se tecesse uma malha improvável com o que percebia ao redor.
Quando menino, na adolescência, depois adulto, sempre fora assim.
Em qualquer lugar em que estivesse,
parecia não estar presente, nem era notado. E quando estava, pouco falava. Mas
sorria e ouvia parecendo não entender nada e, ao mesmo tempo, estudando cada
palavra, cada semblante à sua volta.
De vinho gostava
muito, uma taça só tomada em pequenos goles, enquanto sua fisionomia mudava, o
rosto ficava ríspido e nele uma possibilidade de mutação se desenhava. Era
quando desaparecia, como se algum caminho o tivesse tragado.
Nunca recusava um convite. Na hora
marcada estava lá, primeiro a chegar e a sair. Houvesse vinho, uma taça. Se
não, o tempo de se dizer ali, sem de verdade estar.
Dele não se sabia nada. Onde morava?
Tinha família? O que fazia pra viver? Nenhum amigo mais próximo, nem um amor.
Nada, um mistério...
Ao ser perguntado: moro aqui perto,
tenho um irmão que não vive aqui. E sua profissão, respondia de pronto: sou
poeta. Assim interrompia qualquer conversa sobre si. Profissão: poeta, era
tudo que se sabia dele.
Quando o encontraram, na praça em
frente, naquela manhã, apenas o silêncio transitava nas imediações, parecendo acompanhar
o corpo do velho poeta.
Na necropsia, o espanto. Nas suas
vísceras só havia poesia.
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