O crime: uma facada no companheiro de
esquina; motivo: a traição da cadela que lhe dava amor.
O barulhento vizinho sentiu ciúmes e,
da gentileza do início, acabou por tomá-la à força, uma vez, duas, três, até
impor a rotina.
Descoberto naquela manhã, a briga foi
como um duelo que a cadela presenciava, grunhindo em volta. A ferramenta
afiada tomou corpo de faca e tal qual abriu um ventre.
A morte rondou o estuprador, os
médicos a espantaram.
O amante desapareceu sorrateiro, com a
cadela soluçando nas mãos, fugiu pouco, a polícia prendeu.
Ficou a cena na esquina, suspensa, e
quatro anos de prisão.
O animal dali não saiu; passava dias e
noites cheirando os cantos, a calçada, o lugar da casa de papelão e restos de
madeira que a limpeza pública, comprovado o abandono, demorou a recolher.
Quando o sedutor voltou em ataduras,
olharam-se. Ela triste e assustada, ao vê-lo resignou-se e, pensando no outro,
por ali ficou definhando submetida, mas rondando o quarteirão, decerto
procurando entender sua razão.
Durou poucas semanas até, numa
segunda-feira, jogar-se debaixo de um ônibus qualquer.
A cena na esquina novamente ficou
presa no ar e o arrogante sedutor colheu todas as noites de solidão do lugar.
Aberta a cela, a saudade ardia e a
vingança pairava no ar; o comborço já não havia. Alguma doença o comera pelos
pulmões. Morreu em cena, na esquina, esperando o companheiro e parente sair da
penitenciária para, juntos, chorarem a falta da cadela.
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