quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

Dentro do olhar - mq


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Olhava pela janela toda manhã.

Acordava e se vestia como para ir numa festa; os cabelos impecavelmente penteados na rotina de todos dias; a caneca de café esfriando numa das mãos e o mesmo livro aberto na página que nunca lia. Assim esperava, casual, nos preparativos e na postura.

Esperava, adivinhando o momento certo em que ela iria virar a esquina.

A roupa, sabia acertar só de vez em quando; o jeito dos cabelos, nunca conseguiu adivinhar como estariam. Era quase um ritual aquela espera. Quando ela aparecia, a sensação de propriedade; para ele, ela era sua.

As pernas torneadas na saia curta, combinando com sapatos de salto alto, e os cabelos amarrados como rabo de cavalo ou a calça bem apertada com cabelos soltos e sapato baixo. Enfeitava-se para ele e para as manhãs, era sua ilusão.

Nos domingos nem se levantava, ficava imóvel até a hora do almoço, deitado, sonhando com os dias passados e com a segunda-feira.

Nunca trocaram um olhar sequer; ela passava como se deslizasse pela calçada, ele fingia beber o café, virava a página do livro; tudo como se fosse um ensaio. Ao abaixar a caneca, ela saia do ângulo da visão. Ele suspirava, esticava a mão para as muletas e saía para o interior da casa.

Ele a amava e bastava tê-la todos os dias dentro do olhar.

Bastava fingir não invejá-la caminhar.

 

 

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