Todos os dias, ela parecia um
ponteiro de relógio, na mesma hora passava na esquina rumo à igreja. Todos os
dias, ele estava esperando com aquele cheiro de não dormido, de banca de jogo.
Olhava fixo cada movimento de corpo, cada semblante dela.
No começo, denotava aversão por
encontrá-lo. Nunca olhava nos seus olhos de verdade, sempre o fazia de longe
meio rabo de olho.
Ele não; esmiuçava no olhar cada
pedaço do corpo, cada gesto, olhava querendo.
Com o tempo, Celeste foi
acostumando encontrar Tartulfo, foi ousando observar discretamente. Veio o primeiro
sorriso, as primeiras palavras trocadas.
Um dia, Tartulfo a acompanhou até
a igreja; em outro foi à porta de sua casa e, num tempo, acabaram se casando.
Gosto a família não punha, tinha muita birra dele, mas sua madrinha Altina
sempre dizia:
- Homem,
mesmo que não preste, é sempre bom ter um.
Com jeito, Tartulfo foi
conquistando um por um da família e com o tempo já tinha a confiança de todos,
até um à-meia com o cunhado no alambique arrendado de Mané Ditinho, tinha.
O sogro no começo não queria o
casamento da filha com aquele sujeito, agora era o que mais admirava o genro
que demonstrou ser trabalhador, dedicado à filha e, ainda, tinha largado a
banca de jogo.
Vindo de longe e sozinho no mundo,
Tartulfo achou neles o que mais queria na vida. Os negócios com o cunhado
prosperavam rapidamente e logo compraram o alambique de Mané Ditinho, com um
pedaço de terra já formado de cana, do outro lado do Braço, na combinação de
mudar o alambique para lá.
Quando chegaram para desmontar o
barracão, Eulâmpio apareceu, como quem não quer nada, montado numa mula preta e
velha.
- Fosse o nhôr num levava não, o
home que montô ele era gente enfezada com um tudo, rogou praga, diz que tinha
parte com o diabo e o tinhoso é quem faiz a cachaça prele e só trabaia do lado
de cá do rio.
Riram muito, enquanto faziam a
mudança, e não deram a menor importância achando muita tolice aquela conversa.
Nos dias passando, o caibramento
do barracão quase pronto, a destilaria de cobre já no lugar, a cana amontoada
pronta para o primeiro destilo, alegria uma só, de Tartulfo, do cunhado e do
sogro, sempre por ali.
À medida que a lenha queimava,
eriçando o fogo, a alegria era maior pelo pouco tempo gasto na montagem do
alambique e pelo lugar achado na curva do rio, em terra própria.
- O primeiro gole é do meu sogro,
gritava Tartulfo, rindo todo.
Quando o sogro ia falar que era
muita lenha e o alicerce estava mole, a terra tremeu e a destilaria de cobre
foi andando dentro do barracão, pulando feito sapo, derrubando o esteio que
ficava no rumo do barranco. O telhado quase pronto foi abaixo e ela, enganchada
numa pedra a uns vinte metros para frente, restou, tangendo a margem do rio.
Foi um susto em todos, menos para
Eulâmpio que vinha chegando na sua mula velha. Num gesto de mão, sem apear do
animal, chegou perto, colheu com um coité da bica de cobre, o gole primeiro e falou.
- É garapa seu moço. Num avisei
nhôr que o diabo só faiz cachaça do lado de lá do rio.
.
Boa tarde, poderia divulgar novamente que as inscrições do Festival Expressão Livre estão abertas?
ResponderExcluirDetalhes em www.festivalexpressaolivre.com.br
Att,
Organização Festival