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Transitava por ali
todos os dias e naquele, quando foi passando, notou pela primeira vez. Era bela
e sensual. Parecia que olhava todos pela fresta da venda com indiferença.
Imóvel e séria.
Sentiu ser olhado
como se lhe copiassem o corpo e seguiu em frente. Aquela sensação o acompanhou
até o momento de atender seu cliente.
Começou a ouvir vozes
todas as vezes que passava por ela. No começo não entendia, pensou loucura. Seriam
poemas declamados iguais aos que seu primo fazia? Não, não eram.
Familiarizado com a
voz e, mesmo no meio do barulho da rua, foi conseguindo entender aos poucos.
Eram leis declaradas uma por uma, com todas as mudanças, parágrafos, artigos e
códices.
Loucura. Olhava os
passantes tentando comprovar se também estavam ouvindo aquilo.
Parecia que não.
Em muitos dias ficou
observando. Ela praticamente ensinava as leis. A inflexão, as pausas soavam de
um jeito diferente conforme a roupa e a aparência do transeunte.
Não podia ouvir a
palavra doutor ou ver alguém de terno e gravata que se calava
abruptamente. Esperava o passante passar, voltando a declarar suas excelências.
Era por isso que,
todos os dias, na porta do Palácio da Justiça, o guardador de carros urinava nos
pés da estátua bela, séria e sensual.
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