sábado, 4 de março de 2017

Bela, séria e sensual


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Transitava por ali todos os dias e naquele, quando foi passando, notou pela primeira vez. Era bela e sensual. Parecia que olhava todos pela fresta da venda com indiferença.

Imóvel e séria.

Sentiu ser olhado como se lhe copiassem o corpo e seguiu em frente. Aquela sensação o acompanhou até o momento de atender seu cliente.

Começou a ouvir vozes todas as vezes que passava por ela. No começo não entendia, pensou loucura. Seriam poemas declamados iguais aos que seu primo fazia? Não, não eram.

Familiarizado com a voz e, mesmo no meio do barulho da rua, foi conseguindo entender aos poucos. Eram leis declaradas uma por uma, com todas as mudanças, parágrafos, artigos e códices.

Loucura. Olhava os passantes tentando comprovar se também estavam ouvindo aquilo.

 Parecia que não.

Em muitos dias ficou observando. Ela praticamente ensinava as leis. A inflexão, as pausas soavam de um jeito diferente conforme a roupa e a aparência do transeunte.

Não podia ouvir a palavra doutor ou ver alguém de terno e gravata que se calava abruptamente. Esperava o passante passar, voltando a declarar suas excelências.

Era por isso que, todos os dias, na porta do Palácio da Justiça, o guardador de carros urinava nos pés da estátua bela, séria e sensual.

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