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Descaso
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Os transeuntes que o socorreram não o conheciam; com ele, nenhum documento de identidade. Era apenas um velho que caíra na rua próxima e ficara inconsciente.
Deitado na maca, encostada na parede, esperava pelo atendimento.
Veio nos braços, desacordada, febre muito alta; o posto de saúde do bairro não tinha recursos, fora encaminhada até ali. No semblante da mãe chorando, resignação. Uma cadeira para acomodar a criança foi arrastada pelo chão.
Na maca vizinha, o rapaz urrava de dor com uma fratura exposta na perna amarrada com sua própria camisa; também esperava socorro.
O corredor comprido, mesmo assim insuficiente para tantos casos. Emergências de todo tipo se misturavam ao atendimento caótico que embrutecia todo dia os médicos, enfermeiras e os funcionários. Na verdade, não cuidavam da saúde de ninguém; amenizavam, isto sim, a doença de tanta escassez. Esta sim, era de verdade a emergência.
No meio da enfermaria improvisada no corredor, duas televisões ligadas na emissora mais assistida completavam o quadro.
As enfermeiras improvisavam o que podiam enquanto cada um esperava sua vez. Na maca, o velho começava a ter espasmos sem que ninguém visse.
Seus últimos momentos foram ali, enquanto, na televisão, o governo fazia a propaganda diária de suas realizações.
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MQ
domingo, 12 de fevereiro de 2012
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