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Há sertões sem fim dentro de quem desprotege a existência das emoções vindas de fora, e reinventadas nas cacimbas e grotões da alma que abre bem os olhos para as dimensões imensuráveis do mundo. Generosidade no olhar e no transbordar esse olhar sobre o tudo em volta. Guimarães Rosa faz isso com a gente. Mexe com o ritmo do pensar, muda o foco do jeito como vemos as cores, as pessoas, a obra interminável da natureza e as pegadas do ser humano na estrada de si mesmo.
Tem uma coisa de emocionar inesperadamente, de fazer rir do impensável mais simples e de fazer deter a observação na densidade do mais complexo. Não há frase por ele escrita impunemente, nada escapa do enlaçar do raciocínio, que nele é como olho d’água brotando, brotando e sempre brotando. Não se pode ser o mesmo, ou a mesma, depois de vislumbrar a limpidez de um personagem criado por João Guimarães Rosa. São como espelhos que falam, que resmungam, que inquietam.
E nós estamos lá, dentro deles e eles dentro de nós, mesmo que seja aos pedaços, na proporção de nossa capacidade de enxergá-los e de nos reconhecer com coragem. Há uma sensação de plenitude, de pertencimento ao universo das emoções e buscas que são de todos. O amor, a amizade, as contradições dos apegos, as sinuosidades da maldade, a serenidade da sabedoria. Tudo isso em linguagem que decodifica os mistérios desse pertencer entre homem e natureza, ainda que parecendo um código próprio, só dele.
E bem de repente a gente quer do fundo da alma integrar esse falar que parece truncado, mas que sai dizendo de tudo por tudo que tem dentro da gente. E aí reside a natureza dos sertões que nos habitam. Essa força que faz caírem as civilidades expostas em artificialidades engessadas, em modos e pensares arrumados em prateleiras de bom senso, em conceitos concebidos antes da vivência sincera com o mundo e com as pessoas.
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Márcia Corrêa - http://novopapeldeseda.blogspot.com/
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quinta-feira, 23 de julho de 2009
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