terça-feira, 31 de agosto de 2010

ROLANDO BOLDRIN - SR BRASIL

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BIRATAN

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RUY GODINHO – ENTÃO, FOI ASSIM?

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ALMA
(Sueli Costa/Abel Silva)

Há almas que têm
As dores secretas
As portas abertas
Sempre pra dor
Há almas que têm
Juízo e vontades
Alguma bondade
E algum amor
Há almas que têm
Espaços vazios
Amores vadios
Restos de emoção
Há almas que têm
A mais louca alegria
Que é quase agonia
Quase profissão
A minha alma tem
Um corpo moreno
Nem sempre sereno
Nem sempre explosão
Feliz esta alma
Que vive comigo
Que vai onde eu sigo
O meu coração

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Então, foi assim...
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O compositor Abel Silva1 escreveu duas letras e as ofereceu à parceira Sueli Costa2 para que ela as musicasse. Um ato rotineiro, nada demais. Tal qual quando compuseram Canção Brasileira, Coração Ateu, Jura Secreta, Música, Música, Voz de Mulher, indiscutíveis sucessos nacionais gravados por Simone, Lucinha Lins...

“Abel me deu as duas letras: Corpo e Alma”, afirma Sueli Costa. “Quando fui ler as letras, vi que Corpo daria um belo bolero, e Alma... foi estranho. Comecei a ler a letra e ouvi a música inteira, com arranjo e tudo. Fiquei muito assustada, pensando ser de autoria de alguma pessoa conhecida, Chico [Buarque], Ivan [Lins], e fiquei na minha, não disse nada ao Abel.”3

Algum tempo depois, Abel perguntou para Sueli se ela tinha gostado das letras. Sueli respondeu que já estava terminando a melodia de Corpo. E que depois faria Alma. “Meu medo era de que aquela música não fosse minha”, disse Sueli receosa de estar plagiando algum colega.

Naquela semana, a cantora Simone participara de uma festa comemorativa ao Dia do Trabalhador, 1º de maio, onde cantou Caminhando e Cantando (Pra não dizer que não falei de flores), de Geraldo Vandré, bastante emocionada, levando a platéia do Maracanãzinho ao delírio. Sueli que havia assistido ao show, também se emocionou.

Esquivando-se de uma explicação esotérica, Sueli Costa atribui Alma ao desempenho da cantora baiana. “Acho que fiquei impressionada com Simone e a música veio muito pela performance dela. Depois vi que a música não era de ninguém mesmo, ou melhor, era um presente de Deus ou das almas.”

No disco Corpo e Alma, lançado em 1982, Alma foi gravada por Simone, sendo muito bem recebida pelo público e pela crítica.

“É uma das minhas músicas mais executadas”, confirma Sueli. “E até hoje, só posso cantar Alma no final das minhas apresentações, porque o público inteiro canta. Se eu cantar antes parece que o show chegou ao final... aí... fica difícil terminá-lo.”



1 Abel Ferreira da Silva 28/02/1945 Cabo Frio-RJ.
2 Sueli Correa Costa 25/7/1943 Rio de Janeiro-RJ.
3 Entrevista concedida ao autor, em abril de 2006, por e-mail.



Ruy Godinho
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VIAJANTE OPANKA - O RECIFE DA CULTURA

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A POESIA DO MORRO


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http://veja.abril.com.br/blog/passarela/ensaio-geral/a-poesia-do-morro/

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segunda-feira, 30 de agosto de 2010

inexorável tempo

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não deixes que o tempo passe
desta maneira dentro de ti
os teus olhos já só me enxergam
na média distância
e os meus a ti também
nos emocionamos com o atemporal
do nosso amor
as lágrimas contidas
nos meus, nos teus olhos
marcando o inexorável tempo
que não nos demos
se de joelhos nos prostramos
um aos pés do outro
na penitência de não nos termos
serão nossos olhos
que já não se vêem de perto
o sinal de que
deixamos nossos corpos
não se pertencer
na atitude menos ousada
que poderia ainda
nos deixar desse amor viver


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MQ

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NELSON RODRIGUES

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“Nada mais cretino e mais cretinizante do que a paixão política. É a única paixão sem grandeza, a única que é capaz de imbecilizar o homem.”


Nelson Rodrigues

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GUIMARÃES ROSA

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Fotografia: MQ
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sábado, 28 de agosto de 2010

GONZAGUINHA

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MARIELZA TISCATE

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"Tento tocar a superfície de seus pensamentos
De leve
Para não assustá-los com minha presença
Constante

Quero muito
Mergulhar na alma de suas palavras
E dormir sob o véu escuro e estrelado
Das que ainda nem sabe
Que vão nascer

Consigo apenas pequenos adormecimentos
Colho algumas estrelas que lhe caem no caminho
E torço que semeiem nosso mar de estilhaços"

Acho que os apaixonados por poesia, no fundo, desejam algo desse tipo com seus poetas favoritos!



Marielza Tiscate -
http://maritiscate.blogspot.com/
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sexta-feira, 27 de agosto de 2010

RUY GODINHO - RODA DE CHORO

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RODA DE CHORO – SÁBADO – DIA 28.08.10

No 1º bloco o destaque vai para a Coleção Princípios do Choro e abordará obras do compositor Capitão Miguel Rangel, nascido provavelmente no Rio de Janeiro, talvez por volta do ano de 1845.

No 2º bloco o destaque é o LP O Violão Brasileiro Tocado pelo Avesso, com uma seleção de clássicos do compositor e violonista Canhoto da Paraíba, lançado pelo selo Discos Marcus Pereira, em 1977.

No 3º bloco o Roda de Choro festejará os 20 anos da parceria do pianista e arranjador Gilson Peranzzetta e o flautista e saxofonista Mauro Senise, sob o som do CD comemorativo Linha de Passe, lançado em 2010.

No 4º bloco a cantora brasiliense Zila Siquet, fará uma revisita ao programa, apresentando choros do CD Choramingando, de Jairo Mozart e Dinaldo Domingues, lançado em 2000.

No 5º bloco a tônica será a presença do Regional Choro & Cia, de Natal-RN, que não é apenas um Regional, mas um abrangente projeto cultural potiguar.



Ouça pela internet:

Rádio Câmara, Brasília:
www.radio.camara.gov.br (rádio ao vivo), sábados, 12h.

Rádio Roquette Pinto, Rio de Janeiro:
www.fm94.rj.gov.br
terças e quintas-feiras, 14h; quartas e sextas-feiras, às 2h.

Rádio Utopia FM, Planaltina-DF, quartas-feiras, 18h.



Produção e Apresentação: Ruy Godinho
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Ninguém me Conhece: 5) Daisy Cordeiro, Absoluta

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Não me lembro de nada. Claro, tinha pouco mais de três anos de idade. Tudo o que sei foi de ouvir falar. E também do que me contaram tenho vaga lembrança. Dá a impressão de que minha família fez um acordo tácito como que pra apagar o ocorrido. Sei apenas que foi durante a Copa do Mundo de 1974. Naquele dia o Brasil jogava. Não me perguntem contra quem. Eu estava certamente diante da tevê, mas meus pensamentos infantis deviam estar vagando por universos que hoje me são inacessíveis. Assim como os meus, os pensamentos de minha mãe não estavam naquela tela. Ela, alheia a tudo, no quintal, pendurava no varal as roupas que acabara delavar. Que não deviam ser poucas. Estava grávida de não sei quantos meses. Havia uma terceira personagem que também não acompanhava o jogo: o cachorro do vizinho. Talvez irritado pelos fogos, num acesso de desespero, pulou o muro e resolveu descontar sua ira em minha mãe, que, ao perceber a indesejável visita aproximar-se, trepou numa árvore que havia no quintal (sim, havia uma árvore no quintal!), com inesperada agilidade, e pôs-se a gritar por socorro. Seus berros, contudo, foram inúteis. O máximo que conseguiram foi juntar-se aos da multidão. O jogo acabou, o cachorro se cansou, minha mãe desceu (ou caiu) da árvore e, alguns meses depois, deu à luz uma menina a quem jamais chegou a ver, pois nascera morta.
Morreu com ela meu sonho de ter uma irmã. Com os anos, outros sonhos (poucos) viraram realidade e outros tantos por sua vez também encontraram o descanso eterno no cemitério dos sonhos natimortos. E a vida prosseguiu por caminhos inescrutáveis até me levar pela mão ao apartamento onde vivia meu então recente amigo e parceiro Élio Camalle, lá se vão anos. Adoraria descrever com riqueza de detalhes aquele dia, pois me foi de imensa importância, porém, minha precoce esclerose terminaria por me fazer construir uma obra de ficção, e não um depoimento verídico. Assim sendo, contarei apenas o que se salvou em meu disco rígido.
Eis que a campainha tocou e entrou ninguém menos que Daisy Cordeiro. Eu a conhecia de nome. Sendo ela uma amiga de Camalle e companheira de armas (nessa guerra infindável que é a música), mais cedo ou mais tarde eu, recém-alistado, teria mesmo que a conhecer. Deslizava dentro de um leve e generoso vestido que não escondia um admirável par de pernas (pernas estas que tratei de resgatar na foto acima). Sua altura também era simpática, pois, em vez de afastar, aproximava. Por carecer, digamos, de altivez. O olhar um tanto estrábico acompanhado por um charmoso sorriso dava o toque final à receita.
Não me lembro do que comemos. Tampouco do que bebemos. Minha memória salvou apenas informações acerca da agradável tarde que passamos e que entrou pela noite. Em determinado momento veio à tona a famosa pastinha verde (quem não está inteirado leia o texto Boca da Noite – Parte I), que então morava temporariamente e de favor no apartamento de Camalle. Daisy depôs nela olhos ávidos, sentou-se no chão e começou a folheá-la. Enquanto isso, eu conversava com Camalle, fingindo indiferença mas notando que aos poucos uma transformação ocorria naquela criatura. Eu, que já havia visto um santo baixar num amigo de um amigo certa vez, identifiquei o processo, mas fui tranquilizado por Camalle, que dava sinais de que tudo estava sob controle e que aquilo sempre acontecia. Daisy, com uma mão tapando um ouvido, balançava a cabeça pra cima e pra baixo sussurrando palavras incompreensíveis, pigarreando e fechando os olhos de vez em quando.
O passo seguinte foi sair do transe e pedir a Camalle que pegasse o violão, no que foi prontamente atendida. Pude então testemunhar um momento mágico. De olhos arregalados (e ouvidos, idem) presenciava uma letra minha, que não passava de meras palavras jogadas num papel, ganhar contornos melódicos. Parecia um duelo no qual os dois duelistas estivessem do mesmo lado. Daisy cantava e Camalle acompanhava, às vezes se antecipando a ela, até que, por fim, estava pronta a canção, que, por uma feliz coincidência, tinha sido por mim intitulada Nós.
Como quando o sexo é bom e feito por vez primeira, o processo se repetiu e nasceu naquela mesma noite A Morena e a Paz, segunda parceria do trio num único dia. No meu caso, o deslumbramento era dobrado, pois, além de ser a primeira vez que via ao vivo um parceiro musicar uma letra minha, ainda tinha o agravante do método "cordeiriano" de compor. Hoje posso explicar (e entender) melhor: Daisy Cordeiro não é simplesmente uma das melhores e mais ecléticas cantoras brasileiras (o crítico Mauro Dias já escreveu que ela, além de ser extraordinária sambista, domina com naturalidade os mais variados ritmos), é também uma compositora dona de uma intuição ímpar. Embora não toque nenhum instrumento, guarda em seu cérebro a sequência harmônica exata de cada melodia que compõe, chegando ao extremo de corrigir desavisados violonistas.
Foi assim meu primeiro contato com Daisy Cordeiro. Outros encontros vieram, e a mágica se repetiu sem nunca perder seu encanto. Às vezes nem precisávamos compor pra detectar a magia, pois no caldeirão de Daisy há outras receitas além das musicais. Foi pensando nisso tudo que resolvi escrever este depoimento. Poderia, em vez disso, ter escrito acerca dos prêmios que ela já conquistou, dos projetos que encabeçou (e dos que produziu pra terceiros), dos dois CDs que gravou, dos mares que navegou e os céus que cruzou levada por seu (en)canto, mas isso qualquer repórter mais ou menos interessado, com o auxílio de São Google, poderia lograr. Optei por escrever o que nenhum deles poderia.
Zé Rodrix certa vez falou que os amigos são a família que escolhemos. Se esta afirmação é verdadeira, passo a confiar mais no tempo, que, por vias tortas, escolhe quais dos nossos sonhos irá realizar, sendo que alguns deles até já havíamos desistido de sonhar. Muitas Copas do Mundo depois, finalmente ganhei uma irmã.
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Ouça alguns dos muitos encantos de Daisy Cordeiro aqui:
http://clubecaiubi.ning.com/profile/OXdoPoema
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Por Léo Nogueira - http://oxdopoema.blogspot.com/
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CANÇÃO DOS POVOS DA NOITE - O BODE E A ÍNDIA VELHA

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O Bode e a Índia Velha
(Marcos Quinan)

Arranjo de Base - Eudes Fraga
Arranjo de Cordas - Roberto Stepheson
Violão - Eudes Fraga
Cello - Manoel Antônio
Viola - Ivan Zandonada
Violino - André Cunha
Oboé - Carlos Prazeres
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VIAJANTE OPANKA - RECIFE DO CORDEL

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quinta-feira, 26 de agosto de 2010

EU SOU CABOCA - PATRÍCIA BASTOS


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O ritmo e o canto amazônicos brilham na voz de Patricia Bastos, uma ótima cantora Sobre o Rio Amazonas, à direita e à esquerda, se lançam o Içá e o Caquetá, o Jumundá e o Juruá, o Trombetas e o Jari, o Xingu e o Tocantins. Feito um só, vêm correndo entre selva, ilhas e praias, servindo aos povos da floresta. A todos marcando a pele e o sangue, emprenhando-os de identidade e orgulho.
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Os animais e os pássaros se achegam à mata. À diversidade da fauna se soma a vida vegetal. Lá estão também os índios e os ribeirinhos. Todos em comunhão reforçam vínculos e se entregam a relacionamentos de lógica ímpar: é o rio Amazonas e a floresta amazônica doando seu ar místico secular aos que deles se aproximam para ali permanecer.
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Assim, plenos de mistérios, a Amazônia e o rio Amazonas soam trombetas para anunciar que mais uma de suas filhas vem para se distinguir. E ela vem ela toda faceira lá de Macapá, abençoada pela densa mata e pelo rio mar: Patricia Bastos, que se valendo do Projeto Pixinguinha de Editoração, gravou Eu sou caboca, seu quarto CD.
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Por esse bom disco, vislumbra-se seu destino de cantora que tem nítida em sua alma a importância do seu cantar amazônico, marcado a ferro em sua personalidade.
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Para cada levada seu instrumento, sua linguagem, sua ancestralidade, marabaixo, batuque, lundu, maracatu, carimbó, samba, retumbão, jongo, alujá. Sobre eles a música vem como pororoca rio abaixo. Sobre eles o versejador cria rimas com a força de expressivas orações.
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Interligadas pela pele do curimbó, pelas sementes do ganzá e por outros tantos instrumentos que dão à música o sentido pleno de ser quando unida à poesia, as catorze faixas do álbum são de plena unicidade. E o que não falta em Eu sou caboca são competentes instrumentistas, ótimos melodistas e inspirados letristas.
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Os arranjadores Adelbert Carneiro, Aluisio Laurindo Jr., Paulo Bastos e Dante Ozzetti (este, arranjador da sua “Demônio de Batom”, que tem letra provocante do poeta Joãozinho Gomes), arregimentaram formações que deram ao repertório a força que carece e merece a voz de Patricia Bastos.
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As especiais participações vocais de Nilson Chaves em “Filho de Uaranã” (Rafael, Pedro e Rita Altério), ritmo quente marcado por percussão calorosa, e de Vitor Ramil em “Pequeno Pescador” (Vicente Barreto e Joãozinho Gomes), canção de raro lirismo, realçam a cumplicidade que Patricia ainda quer maior, pois já conhece o valor da integração solidária entre o rio e a floresta.
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O repertório é exemplo de como Patricia bem o sabe escolher. Celso Viáfora vem com a sua bela “Crença” e com a percussiva “Eu Sou Caboca” (com Joãozinho Gomes). A conhecida “Natureza”, de Rosinha de Valença e Leci Brandão (“Ê, natureza/ Ê, natureza tão bom...”) aclara a competência da intérprete e chama adjetivos: cafuza buliçosa, mestiça calorosa, índia caudalosa, cantora de respiração encaixada, de suingue contagiante, voz delicada, mas firme, agudos precisos, emoção encorpada... Patricia Bastos.


Aquiles Rique Reis, músico e vocalista do MPB4



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ELEIÇÕES BRASILEIRAS




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A verdade na mentira é a mentira da verdade
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MQ
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LUCINHA BASTOS E FILÓ MACHADO - BELÉM

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JAC. RIZZO - Pensando em tardes azuis

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Nas noites em que não durmo, fico ouvindo o silêncio, pondo lembranças no colo, amores acariciando.

Se o sono é escasso, noites e eu, choramos juntas. E o lamento agudo e fundo, como uma faca, nos corta, nos fere no mesmo aço.

Abro janelas e portas, empurro o teto pro alto, que a tristeza cresce, precisa de muito espaço.

Palavras soltas, num eco,
fantasmas que me atormentam,
crepúsculos sombrios,

uma canção delicadíssima,
pedaços de lugares,
deslumbramentos tardios
e muitas, muitas tristezas
no vento.

A noite é escura e imensa
e num ritual quase macabro
ateamos fogo às vestes,
nos queimamos.

Depois morremos nus e ateus,
pensando em frias tardes azuis,
sem crença, sem luz, sem Deus.


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Jac. Rizzo - http://jacrizzo.blogspot.com/
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quarta-feira, 25 de agosto de 2010

VIAJANTE OPANKA - VOANDO ALTO

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RONALDO FRANCO

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Para Iô

Quando o amor se sabe amor
A pescaria é urgente:
De no silêncio nos falarmos
Com as palavras
No anzol do tempo.

Sem isca de conclusão
Sem histórias inventadas
Sem canoa do cotidiano
Sem remos no destino
Sem leme nos olhos
Ancorados no beijo.

Somos peixes
que piscam
à tentação de durar
na extensão
do nosso aquário particular...


Ronaldo Franco - http://ronaldofranco.blogspot.com/

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terça-feira, 24 de agosto de 2010

NELSON RODRIGUES

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Nelson Rodrigues por Tito Oliveira

“Quem pensa com a unanimidade não precisa pensar.”

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Nelson Rodrigues - 17 peças de teatro, 9 romances, 5 contos, 13 crônicas, 7 telenovelas e 23 filmes, todos baseados em suas obras.

Biografia Resumida da vida de Nelson Rodrigues no Projeto Releituras http://www.releituras.com/nelsonr_bio.asp
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RUY GODINHO – ENTÃO, FOI ASSIM?

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TELETEMA
(Antonio Adolfo/Tibério Gaspar)

Rumo estrada turva,
Sou despedida
Por entre lenços brancos
De partida
E em cada curva
Sem ter você
Vou mais só
Corro rompendo laços
Abraços, beijos,
E em cada passo
É você quem vejo
No telespaço
Pousada em cores
No além
Brando corpo celeste,
Meta – metade,
Meu santuário,
Minha eternidade,
Iluminando
O meu caminho
E fim
Dando a incerteza
Tão passageira,
Nós viveremos
Uma vida inteira,
Eternamente,
Somente os dois mais ninguém...
Eu vou de sol a sol,
Desfeito em cor,
Refeito em som,
Perfeito em tanto amor...


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Então, foi assim...

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Adonis Karan, produtor conhecido no meio televisivo – criador do Festival Universitário da Música Popular Brasileira, em 1968 (que revelou um naipe de compositores do calibre de Gonzaguinha, Aldir Blanc, Ivan Lins, Silvio da Silva Junior, César Costa Filho e outros), e do
atualíssimo Festival de Chorinho do Rio de Janeiro – apresentou ao seu amigo compositor Tibério Gaspar1 uma moça que ambos apelidaram carinhosamente de Turquinha. Logo Tibério e Turquinha começaram a se encontrar. “Ela dizia que gostava muito de mim, mas eu não botava fé nas suas juras de amor”, afirma Tibério. “Eu achava que era apenas mais um caso sem compromisso. Ela, no entanto, sem que eu soubesse, estava pretendendo um relacionamento mais duradouro. Esses desencontros são normais na vida.”2

Um dia, ainda no início do namoro, Turquinha ligou para Tibério e o convidou para sair. Era domingo. Tibério entediado deu uma desculpa alegando que tinha um compromisso na manhã de segunda e preferia ficar em casa. Sugeriu amavelmente um encontro na segunda à noite ou, talvez, na terça. Turquinha insistiu: “Poxa, mas eu queria tanto ver você hoje. Estou com saudades. Será que a gente não pode tomar um chopinho no Baixo Leblon, bater um papo e depois você volta pra casa?” Tibério arrematou: “Não vou, não. Não leve a mal, mas hoje não dá. Prefiro ficar por aqui até o sono chegar”. E realmente ficou em casa. Ela saiu com os amigos pro Baixo Leblon.

Alta madrugada, voltando pra casa em Copacabana, Turquinha pegou carona com um casal de amigos, espremida no banco de trás de um Karman Guia. Ao passar nas proximidades do Jardim de Alah, o carro sofreu um grave acidente.

Amanhecendo o dia, mais ou menos às seis da manhã, Tibério foi acordado pelo amigo Adonis Karan ao telefone: “Olha, eu tenho uma péssima notícia pra lhe dar. A Turquinha faleceu num desastre de automóvel. O corpo está na capela do Cemitério S. João Batista”.

A notícia chocou profundamente o poeta, que imediatamente se dirigiu ao local informado. Chegando lá, aproximou-se lentamente da urna e ficou a contemplar o rosto sereno da moça rodeado de flores. O pensamento em confusão reprisava freneticamente o diálogo que tivera na noite anterior. “Ela estava no caixão deitada, muito bonita. Não teve grandes escoriações. Não estava deformada. O Antonio Adolfo3 havia me dado uma música pra fazer letra. Aí eu cheguei à frente do caixão e comecei a versejar como se fora ela me dizendo:

Rumo, estrada turva, sou despedida
por entre lenços brancos de partida
em cada curva sem ter você vou mais só
corro, rompendo laços abraços beijos...”

Ali no ambiente triste do velório nasceu Teletema (gravada originalmente por Regininha para a novela Véu de Noiva, da TV Globo, em 1969, e, posteriormente, obteve o 2º lugar no II Festival Internacional de Atenas-Grécia numa performance inesquecível da cantora Evinha).


1 Tibério Gaspar Rodrigues Pereira 11/9/1943 Rio de Janeiro-RJ.
2 Entrevista concedida ao autor, em abril de 2006, em Brasília.
3 Antonio Adolfo Maurity Sabóia 10/02/1947 Rio de Janeiro-RJ.



Ruy Godinho




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GUIMARÃES ROSA

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Fotografia: MQ
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domingo, 22 de agosto de 2010

JAC. RIZZO - Um pedaço de estrela

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Preciso vir aqui, às vezes, para despejar uma impressão. Registrar uma emoção que um momento qualquer despertou em mim. E isso não é a poesia. Não aquela que sai de mim, num instante, sem qualquer motivo ou razão, espontânea, e é nada. Uma faísca apenas, que se desprende da grande labareda que sou eu, dentro de mim. A poesia é como o vento, sopra em qualquer direção e para nada. Vem, vai, retorna. É tempestade de vez em quando, ventania quase sempre, vendaval ou brisa leve.

O ator e agora cantor, Wagner Moura, foi iluminar o programa da Marília Gabriela e inundou de brilho, com o seu carisma, a minha tarde, neste sábado. Senti uma enorme necessidade de dizer alguma coisa dele. De falar nele e não 'de nada'. De escrever sobre como ele é encantador. E eu que tenho idéias esquisitas sobre muitas coisas, me deparei, de repente, com outras idéias que estão fora de padrão. E todas muito simples e singelas.

Quando começo a pensar em Deus e como Ele seria, esbarro sempre em constatações do tipo 'não sei' e não devo ter nenhum sentimento de culpa em relação a isso. Lembro das palavras de Mencken, aquele irreverente jornalista americano, da metade do século passado, que quando era inquirido sobre a sua total falta de crença religiosa, dizia que podia falar mal Dele e acusá-lo de todo tipo de crueldades e injustiças, pois Ele o vinha tratando bem e com grande polidez, até. Mas que não podia esquecer o modo bárbaro com que tratava a maioria do resto da humanidade.

Wagner jogou uma pequena, mas vigorosa luz sobre tanta obscuridade. Ele disse, só e apenas, que tudo poderia ser diferente se entendêssemos que Deus somos nós. E eu acrescento que tudo pode partir de nós. A maldade ou a bondade, a dor ou o prazer, a luz ou a escuridão. Tudo. Os céus e os infernos somos nós. Essa felicidade que desejamos eterna, não existe. E depois, nenhum espetáculo, por melhor que seja, pode durar para sempre. De minha parte, já demoli os altares todos, quebrei estátuas, apaguei imagens e encerrei as discussões com Deus. Qual seja o sentido da vida humana é coisa que ignoro. Às vezes, suspeito que não haja nenhum.

Mas a outra que há em mim - pois somos vários - me faz lembrar que sou, nesse universo imensurável, um pedaço daquela estrela que brilha no alto, na imensidão do infinito. E minha alma se enche de emoção! Talvez seja a parte divina se revelando em mim...Talvez..



Jac. Rizzo -
http://jacrizzo.blogspot.com/
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sábado, 21 de agosto de 2010

CIA TEATRAL CORES NA ROTUNDA - MACAPÁ

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VIAJANTE OPANKA - COMIDA MONGOL. ÉCA OU UAU?

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ASSOCIAÇÃO FOTOATIVA APRESENTA - LARGO CULTURAL DAS MERCÊS - BELÉM

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Ninguém me Conhece: 4) Vlado Lima, 86% Mau

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A verve ferve nervosa no verbo perverso (frente e verso) de Vlado Lima. E na prosa. E na rima. Anárquico, sarcástico, circense, cigano, nonsense. De humor mordaz, sem mordaça, desbocado, manguaça, vindo lá das bocadas. Lotado. Mora longe e é folgado. Não o convide pra jantar! Ele aceita (e ainda pede a receita). Não lhe ofereça a maçã. Não lhe apresente a irmã! Ele aceita. Não lhe apresente o seu pai! Vai que ele vai… Vlado é uma trombada de Chacrinha com Jece Valadão na banguela (na janelinha), na contramão, a 300 km por hora em noite de lua cheia, com multa, juros e mora (“pronto pra trair seu coração depois da última ceia”). Contam que Zé do Caixão, quando o viu na carreira numa sexta-feira da Paixão (13)… amarelou! E Vlado sussurrou: “Reze”. Vlado é o rebento resultado do cruzamento de Mano Brown com Aldir Blanc… Num baile funk. É uma tabelinha de Felipe Melo com Kaká. Tango, bolero, chachachá. John Wayne. John Fante. Inferno de Dante. É perifa, é pife, PF, é rifa, é blefe. É geral, é Juventus x Portuguesa, é neandertal, maluco beleza, agitador cultural. É marginal. E é poeta. Penetra. Pirata. Viralata. Cama de gato. E tá na febre do rato! Vlado não é de etiqueta, é de estampa. Pimenta malagueta. Panela sem a tampa. Seu Madruga. Che Guevara. Uga uga! Sem Odara. Churrasco na chácara, carrasco (sem máscara) do bom-gostismo vigente. Palita os dentes e arrota Freud ouvindo a dupla Pink & Floyd. É um cara mau. 86% mau! Comeu o lobo e disse “miau”! É pau. É pedra. É o fim do caminho… Um homem na estrada. Um torto sozinho. Quando “a solidão uiva como um cão sem dono” atrapalhando, dos justos, o sono, Vlado gargalha, com aquela ruiva (ou seria morena?), no gogó uma metralha, na mão esquerda, um goró. É canalha (e não manda fulô). Vade retro, coisa ruim! “Naquele dia o sol ardia e acho que só chovia em mim”. O puteiro das universitárias é seu parque. Aonde vai só pra encontrar Joana, a dark, tomar umas brejas, dar uns beijos (e uns bocejos), falar de política, filosofia e outros micos. Cê sabe, essas coisas, Sócrates, Platão e Zico. Sambista roquenrol, Adoniran de guitarra, ray ban em noite de sol, coça o saco e escarra, peida em elevador (na maior classe), come pizza, toma passe, adora cair na night. Literalmente! Ri da high society, inventa mas não mente. Orgulho nacional, três vezes vice-campeão do torneio internacional de futebol de botão. No palitinho, então... Vixe! Nossa! Saída pela esquerda, mon cheri. Caminho da roça. Corta as unhas dos pés com alicate. O mano do açougue é seu alfaiate. Dizem que tá gravando um CD (pirata) e pra lançamento já tem data: até o próximo Natal estará à venda em casas de má fama, tendas de tarô, na mão da cigana, com o flanelinha, seu dotô!, enfim, em todos os camelódromos de responsa do Brasil. Zil zil. Ótimo presente pra dar pro amigo (da onça) ou de amigo secreto pra aquela mina do RH (mó tesão) que só ouve Araketu, Vercilo e Charlie Brown (jr.). Adora cozinhar, Kurosawa, Mazzaropi, mangá, Ultraman, Tom (Waits) & Jerry (Lewis), filmes do Tarzan. É DJ de festinhas retrô à lá anos 70. Recita (no original) Bashô (ou tenta). Pôs pra correr “o cara” e tomou o ponto, lá onde Judas vendeu as botas e Zorro, o Tonto. Contrabandeia versos proibidos e fanta uva vencida. Com recibo. Vlado Lima não fuma nem trafica (ipsis litteris); só come, não fica (ficar é pros ultrapassados). Vlado Lima se multiplica. Capaz das maiores proezas, escova os dentes com mostarda, falha mas não tarda, come buchada de bode sem camisinha e, de sobremesa, paçoquinha, passa fermento nos chifres e pimenta nas feridas (pra sentir a dor de um bolero), chuta o balde e volta pra estaca zero, vaca holandesa, vinho (suave) de mesa. Toma até gemada com kriptonita! Mas se vê um metrossexual… vomita! Se vê um mendigo comendo um pão amanhecido, pede um teco. E um tico. Um sujo numa noite perdida. Vê faroeste e torce pro cavalo do bandido. Lê Dostoiévski em quadrinhos (bem alto, pra irritar os vizinhos), compra Playboy pra ler a entrevista, (e pendura na maçaneta do banheiro: ocupado, não insista!). Com seus três superacordes faz canções que até Ricardo Soares duvida. Prazeres da vida, diários de bordes. Quando dorme, o duende é que o vê. Dá entrevistas na língua do P. Na maior larica, comeu farofa em encruzilhada (ou terá sido feijoada?). Fortemente influenciado por Rimbaud, Rambo, Batman e Robin (Hood). E, se espirrar, f... saúde! Vlado Lima não é flor que se cheire. Quem me contou foram Rafinha, Rogéria, Rosemeire. Em tempos de politicamente correto, manda pra casa do reto o eufemismo (tá aí talvez o porquê de ter tido dificuldade com a faculdade de jornalismo). Ex-coroinha, ex-cantor de inferninhos, excomungado por fazer paródia com a Ladainha... Organizador do Sopa. De Letrinhas. Pau. Pedra. Fim do caminho… Um homem na estrada. Um torto sozinho. Naquele dia o sol ardia e acho que só chovia nele. Mas ele é mau. Não tem medo nem do IML. Homem que é homem não chora. Essa coisa salgada que salta pelos poros e anda pela pele é agonia destilada, segundo ele. Vlado Lima é mau. 86% mau. Não queira conhecer os outros 14%! Mas Vlado Lima é um mau necessário. A nos acordar de um bem sonolento. Porrada no pâncreas dos otários. E olha que nem é violento! Cara feia pra ele é feiúra mesmo. Tá com tudo e não tá pra torresmo. Vem da Vila Ré (de ré) (de pijama) na contramão. Pobre de marré, marrento, sem um tostão. O Chapolin das músicas perdidas e das almas encardidas. O Sílvio Santos dos descrentes. O Elvis Presley dos malas. Se você nunca ouviu, tire as crianças da sala! E os doentes. O cara é mau! E manhoso. O cara é foda. E odeia Caetano Veloso. João Gilberto, então... Nem se fala! Tirem as crianças da sala! Não veio pra salvar porra nenhuma. Mas também aceita entrar numas. Prepare o seu coração. E o cotonete. Ele curte brincadeiras de mão. E (não) sabe onde (se) mete. Tá vendendo um violão. Já namorou uma chacrete. Já leu até o Tinhorão. Ainda vê videocassete. Montou um bar no Taboão. Ou lá na casa do cacete. Gosta de vodca com limão. De vez em quando picha o 7. Mas manja de fazer canção. Paro pra não jogar confete. Cartas de recomendação: favor tratar com a Suzethe.


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Ouça algumas das malvadezas de Vlado Lima aqui:http://clubecaiubi.ning.com/profile/OXdoPoema
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Por Léo Nogueira - http://oxdopoema.blogspot.com/
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CANÇÃO DOS POVOS DA NOITE - MULAS NO CORTE



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Mulas no corte
(Marcos Quinan)


Arranjo - Fernando Carvalho
Violões – Fernando Carvalho
Flautas - Roberto Stepheson
Ovinho/Triângulo - Marcos Amma

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sexta-feira, 20 de agosto de 2010

ENTÃO, FOI ASSIM? - RUY GODINHO - BRASÍLIA

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RUY GODINHO - RODA DE CHORO

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RODA DE CHORO – SÁBADO – DIA 21.08.10

ESPECIAL “A HISTÓRIA DOS REGIONAIS”

O RODA DE CHORO deste sábado, 21.08.10, vai ser especial. Durante todo o programa desvendaremos a história dos grupos regionais: sua origem, a razão do nome, a importância como formação musical para a música brasileira, a parceria das rádios com os regionais, a função tapa-buraco na programação das emissoras, os principais grupos e algumas curiosidades interessantes.

No repertório: Os Oito Batutas, Choro Carioca, Grupo Carioca, Regional do Benedicto Lacerda, Regional do Canhoto, Época de Ouro, Água de Moringa, Caraivanas e Nosso Choro.

Ouça pela internet:

Rádio Câmara, Brasília:

www.radio.camara.gov.br (rádio ao vivo), sábados, 12h.

Rádio Roquette Pinto, Rio de Janeiro:
www.fm94.rj.gov.br
terças e quintas-feiras, 14h; quartas e sextas-feiras, às 2h.

Rádio Utopia FM, Planaltina-DF, quartas-feiras, 18h.


Produção e Apresentação: Ruy Godinho



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BATATINHA

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RÁDIO ATMOSFERA - RIO DE JANEIRO

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XXXI FESTIVAL INTERNACIONAL DO FOLCLORE DE CARUARU

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quinta-feira, 19 de agosto de 2010

VIAJANTE OPANKA - UM DIA LADO B EM SÃO PAULO

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FERNANDO MERLINO, JAMIL JOANES, ERNELTON SILVA, JÚLIO MERLINO, JOSÉ ARIMATÉIA E JOANA DUAH - RIO DE JANEIRO

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Ninguém me Conhece: 3) A Felicidade Segundo Élio Camalle

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Existem dois grupos de seres iluminados: o grupo ao qual pertencem, por exemplo, Noel Rosa e Chico Buarque, cujo brilho é capaz de cegar já à primeira vista; e o grupo que tem como membros, entre tantos outros, Cartola e Luiz Gonzaga, cujo brilho vai ganhando intensidade com o passar do tempo, como um lampião a gás que se transforma paulatinamente em holofote. Os primeiros parecem brilhar como o sol, naturalmente; já os
segundos forjam sua iluminação com o suor do trabalho árduo de cada dia, até que o metal resplandeça e tudo pareça tão simples que nem se perceba o quão complexo foi chegar a tal.

A este grupo pertence Élio Camalle. Cantor que emprestou seu talento aos bailes e bares da vida. Crooner, aprendeu a ser cronista do que viu, ouviu, viveu e cantou. E como cantou! O vasto repertório do cancioneiro brasileiro já saiu por seu gogó noites a fio qual fosse oração. Jovem, produziu-se, virou artista antes de sê-lo verdadeiramente. Mais estética que atitude. Mais gana que graça. Cabelos longos, roupas de estreia, poses pra fotografia, fumaça de cigarros, degraus e quedas; Camalle, imaturo, queria subir, como seus ídolos. Versátil, camaleônico, aprendeu a cantar o que era deles melhor que eles e a compor como eles. Nessa época aprendeu a fazer Mágicas. Acreditou que o sol degelaria o coração que já não saltasse; correu atrás de alheias morenas anarquistas, "pra lá de meia-noite, pra cá de Bagdá"; cantava um velho coração batendo dentro de um peito que pensava ser o seu, mas no seu batia um jovem coração de um anjo feliz e selvagem brincando de ser rei alucinado. Era bonita a roupa, pá, mas o rei estava nu.

Acreditou na magia fazendo truques. Sobreviveu Gabriela, mas Camalle tinha que se afastar dos ídolos, de forma doída, voltar-se a si e ao que queria que esse “si” fosse de fato. Entranhou-se. Estranhou-se. Embrenhou-se na selva do ser, e, assim, voltou ao início pra recomeçar, diferente. Doeu, como dói o parto, como dói a partida. Nessa época foi rebento, Cria, criança, brincante. Perdeu a cabeça no meio da rua. Viu seu crânio rolar pra dentro da boca de lobo, cheia de juízo. E ouviu sua voz, vinda "dos gritos de negros escravos", "dos povos aflitos de revolução". Pedia pra ser deixado só, não queria mais a influência, queria estar cheio dos sentimentos mais puros que habitavam seus guetos. Deixou que seu silêncio, que sofria de carência, falasse pelos cotovelos e contasse histórias sem pé nem cerebelo. Um silêncio que produzia "ruídos vilões de paixões abaladas, baladas em decibéis incompatíveis com as normas do condomínio" dos velhos astros, arrastando os pés e transbordando vasos sanguíneos. Lembrou-se das coisas que seu pai dizia sem dizer. E, pra não perder a juventude e resolver sua vida no Viaduto do Chá, deixou-se errar à vontade, como todo jovem. Errando, adolesceu e cresceu. Seu caminho era quase seu.
Crescido, passou a indagar acerca de sua existência. Foi mesmo às cruzadas em busca de seu graal, que, se não era santo, ao menos lhe era sagrado. Mosqueteiro, foi um dos quatro cavaleiros de um apocalipse que não veio. Os demais eram Luiz Gayotto, Madan e Kléber Albuquerque. Um do um do um. Um por todos e todos por um. Aprendeu a conjugar seu verbo, que era singular, no plural. O século novo chegou e o que era um do um do um virou cada um pra si, cada cavaleiro indo lutar suas próprias batalhas. Camalle se viu só outra vez. Ficaram as canções...
Mas agora ele era adulto já. Aprendeu a dar a volta ao mundo sem sair do “si”. Já não era truque. Era troca. Nessa época foi além de Antes e Depois do Fim do Mundo; viu édens e apocalipses diários; exibiu seu planetário; "só, a ver navios", colecionou desvarios; e percebeu que o que se esperara guerra nas estrelas era, na verdade,"guerra no chão da cidade". E que "não há bem que sempre dure, nem mal que não se acabe". A via láctea era pouco. O sistema solar era pouco. Ser um só era pouco. Provou da fruta dos camarins. Aprendeu que "só existe agora", qualquer que seja o hoje. Sugou da vida o ouro, o marfim. E, quando pensou que havia chegado ao fim, descobriu que o fundo do poço é um fundo falso. E abriu a caixa (de papelão) de pandora.
Foi então que aprendeu a ser bicho preto, cão farejador. Aceitou sua natureza. Despiu-se de máscara, de casca. Já não bastava ser adulto. Foi assim, chorando no tempo, que o velho menino deu-se conta de que sua ruína sem saída era, na verdade, e por que não?, o caminho. E que não tinha que subir, como seus ídolos, tinha, sim, que, ao ver as placas de "pare", seguir em frente, como o Pedro Archanjo da Tenda dos Milagres de Jorge Amado. Desceu da cruz autoimposta, olhou nos olhos do boi da cara preta e viu um bicho bobo e sem sal. Percebeu que não "existe uma prisão mais perpétua que essa: o nosso próprio umbigo". E foi assim que se deu. Suas mágicas, revoltas, destruíram seus mandraques. Era, enfim, o fim de uma lida, o começo de outra estrada. Sem mágicas. Sem truques. Restava agora só o homem, despido de personagens, sobrevivendo a água, pão e poesia, justamente este homem a quem ele não dava nada, nem a ponta do cobertor, o bicho dentro da casca.
E foi assim que, sem que se desse conta, Camalle aprendeu a voar, pois percebeu que "a dor dá asas" e "a gente voa sem geografia. Mesmo que doa, dá à pessoa a sabedoria". Quando descobriu, reconheceu seu bartruque e aprendeu a felicidade. Não a de Tom Jobim, muito menos a dos "baladeiros, sambistas, MCs, torcedores e funkeiros", mas a sua, a felicidade de um homem só, que sabia fazer festa da solidão, esta mesma solidão que lhe "abriu a janela e disse 'clique aqui e seja feliz'". Foi o que ele fez. Agora ele podia gritar às Yolandas, Madalenas, espanholas: "Eu não te amo mais!" e buscar "um caso que case com o dia de hoje" e que só vá embora quando ele morrer. O chato mesmo é que agora ele é realista! Descobriu que sua doença moderna é a própria cura. E ele, que nem nadar sabia, flutuou de alegria quando se deu conta de que há "esse mar de opções, esse mundo contramão, esse santo livre arbítrio, o divino sacrifício de mudar de opinião". Na dúvida encontrou seu Deus. Ele, que havia visto seu crânio rolar "pra dentro da boca de lobo", reencontrou-o, este "crânio duro [...] que não pensa" no que foi. Agora está pronto pra ensinar as coisas que aprendeu sozinho. Iluminou-se.
Alguém poderá me perguntar como posso afirmar isso tudo. E eu responderei que estive a seu lado todos esses anos, seu irmão mais novo, copiando-lhe os erros, aprendendo com seus acertos, discutindo, brigando, parlando, compondo, bebendo, rindo, chorando, aprendendo com ele a ser único, ensinando-lhe um pouco também, enfim, compartilhando essa vivência que só a amizade dá de graça. E vale ouro. É deste ouro que estou falando. Este ouro que o tempo forjou e que hoje se chama Élio Camalle, um dos artistas mais completos e criativos do Brasil. Um cara que pesa e sabe o que compõe e o que canta; domina (e doma) o palco; suinga e sangra; sua e soa; é movido a energia solar, pois aprendeu, na oficina do tempo, que o brilho da originalidade, embora não sendo fácil de ser obtido, ou por isso mesmo, quando alcançado, passa a fazer parte do indivíduo, irremediavelmente. Nesse patamar, a inspiração é tão natural e imprescindível quanto a respiração.Hoje é dia de estrelas. Hoje é dia de ver, ouvir e provar Élio Camalle.

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Ouça algumas canções das várias fases de Élio Camalle aqui: http://clubecaiubi.ning.com/profile/OXdoPoema
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VITOR RAMIL E MARCOS SUZANO - BELÉM

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quarta-feira, 18 de agosto de 2010

PAULO CÉSAR PINHEIRO - RIO DE JANEIRO

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WANDA MONTEIRO - ESPELHOS

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Que agonia de Sina


Esta

De dormir pela metade

De sono intercalado de espanto

Rasgado de tempo

Cansado de descanso

De sono cortado

Entrecortado

Assombrado

Por espelhos de alegorias
Fantasmas do ontem de Mim

De sono invadido
Por películas de

REALIDADE

Que escorrem


Encharcando o meu leito

Afogando o meu Sonho


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ELIZETH CARDOSO

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terça-feira, 17 de agosto de 2010

LEI 12.244 - BRASIL

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Lei de número 12.244 - determina a obrigatoriedade de todas as instituições educacionais públicas e privadas de todos os sistemas de ensino do Brasil a manter um acervo de livros na Biblioteca de, no mínimo, um título para cada aluno matriculado. Cabendo a cada instituição determinar a ampliação deste acervo conforme sua realidade, bem como divulgar orientações de guarda, preservação, organização e funcionamento das mesmas. O prazo para o cumprimento é de, no máximo, 10 anos.

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VINÍCIUS DE MORAES

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O compositor, poeta e diplomata Vinícius de Moraes foi promovido à categoria de embaixador, em uma homenagem póstuma.
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VIAJANTE OPANKA - O LADO B DA 25 DE MARÇO SP

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RUY GODINHO – ENTÃO, FOI ASSIM?

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FEMININA
(Joyce)

- Ô mãe, me explica, me ensina, me diz o que é feminina?
- Não é no cabelo, ou no dengo, ou no olhar, é ser menina por todo lugar.
- Ô mãe, então me ilumina, me diz como é que termina?
- Termina na hora de recomeçar, dobra uma esquina no mesmo lugar.

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Costura o fio da vida só pra poder cortar
Depois se larga no mundo pra nunca mais voltar

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- Ô mãe, me explica, me ensina, me diz o que é feminina?
- Não é no cabelo, ou no dengo, ou no olhar, é ser menina por todo lugar.
- Termina na hora de recomeçar, dobra uma esquina no mesmo lugar.

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Prepara e bota na mesa com todo o paladar
Depois, acende outro fogo, deixa tudo queimar

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- Ô mãe, me explica, me ensina, me diz o que é feminina?
- Não é no cabelo, ou no dengo, ou no olhar, é ser menina por todo lugar.
- Ô mãe, então me ilumina, me diz como é que termina?
- Termina na hora de recomeçar, dobra uma esquina no mesmo lugar.

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Então, foi assim...


Hermeto Pascoal costuma dizer que todo mundo canta. Que aquilo
que a gente chama de fala, nós estamos a cantar, assim como os passarinhos. “Eu tenho a percepção desde criança – minha mãe ficava conversando com as amigas dela, e eu ficava perto, dizia: Mãe, ela tá cantando!... Mãe dizia: ‘Não, estamos conversando meu filho, que é isso?!’ ” Para ilustrar o que chamou de o Som da Aura, o Bruxo1 gravou o disco Festa dos Deuses (1992), em que musicou um discurso do ex-presidente Collor (Fx. 5 Pensamento Positivo), o ator Mário Lago recitando um poema (Fx. 9 Três Coisas) e uma filha dele dando aula na piscina (Fx. 8 Aula de Natação). “Estão todos cantando, está tudo lá, afinado. Eu toquei o que eu escutei. Tanto que é a música deles – a música tem o nome deles.”2

A cantora, compositora e violonista Joyce3 concorda plenamente com Hermeto. Diz que um simples diálogo doméstico pode virar música. Pelo menos foi o que aconteceu com a música Feminina, criada por volta de 1976, início de 1977.

Joyce lembra que Danilo Caymmi era freqüentador assíduo de sua casa. “Ele ia muito lá... A minha filha mais velha, a Clarinha, era pequena, tinha quase 5 anos e não conseguia dizer o nome dele corretamente. Só o chamava de Daliu. Clara dizia: ‘Mãe, o Daliu ligou’. Ela atendia ao telefone e dizia: ‘Mãe, é o Daliu que quer falar com você.”4

Talvez, por conta das inúmeras viagens, Danilo passou um longo período sem aparecer por lá. Clara, sentindo sua falta, um belo dia chegou para a mãe e, com uma fala cantada de criança, perguntou: “Oh! Mãe, cadê o Daliu?” Ao que Joyce respondeu – não menos cantado: “Ele tá na Bahia tocando com a Gal.”

Nascia, no diálogo de saudade, a linha melódica de Feminina, onde na pergunta de Clara se encaixa: Ô Mãe, me explica, me ensina. E na resposta de Joyce: Não é no cabelo, no dengo ou no olhar.

“Quando a música pintou já veio com essa frase musical”, explica Joyce. “Aí foi só ir criando a história, tirando tudo o que não era elefante – como diz o escultor – e a coisa foi tomando esse rumo.”

Se a melodia nasceu do diálogo, a letra teve como foco a necessidade de Joyce em responder à sua mãe que a criticava por não ser feminina. “Aí já sou eu me explicando lá com a minha mãe que passou a minha infância toda dizendo que eu não era feminina, que eu não gostava de roupa de organdi. Depois quando eu fiquei adolescente, que eu não gostava de salto alto, de batom. Tinha essa coisa de que isso não é feminino, essa roupa não é uma roupa feminina e não sei mais o quê. Isso era pra provar pra ela, pra minha mãe, que – aí o Freud – que ser feminina é outra coisa. Que não precisa você ser perua para ser feminina. Você pode ser feminina de outra maneira. Então, nessa música, tem eu falando pra minha mãe, tem a minha família falando pra mim.”

Em seu processo criativo, Joyce sempre compõe primeiro a música. “É uma conexão direta com Deus. Eu pego o violão e sempre sai alguma coisa. Na vertical a inspiração é imediata e funciona com a maior facilidade do mundo. Letra já é uma coisa que dá um pouquinho mais de trabalho. E quando eu faço letra eu começo, geralmente, pela sonoridade da música, o que as sílabas estão sugerindo. Depois, então, a música vai tomando o seu rumo. Aí vem o outro processo. Você vai tirando tudo o que não serve pra história. E a partir dos sons você vai contando essa história, que às vezes toma um caminho inesperado. No caso de Feminina, foi assim.”

Feminina foi gravada em diversos momentos da carreira de Joyce. Em 1980, no LP Feminina; em 1989, no LP Joyce ao Vivo; em 1994, no CD Revendo Amigos; em 1996, no CD The Essential Joyce – 1970-1996 e, em 2004, no DVD Banda Maluca ao Vivo. Há ainda o registro em 1979, do Quarteto em Cy, no LP Quarteto em Cy em 1.000 Kilohertz.

“E eu acho muito engraçado é que as pessoas dizem: ‘Poxa, essa música explica tudo’. E pior que explica mesmo. O negócio de ser feminina, o que é ser feminina, o que não é ser feminina. Quer dizer: não é no cabelo, no dengo ou no olhar. É outra coisa. E no fim das contas é uma mandala, porque termina na hora de recomeçar”, conclui Joyce, cheia de feminilidade.




1 Apelido como é conhecido Hermeto Pascoal.
2 www.alomusica.com.br acessado em junho de 2007.
3 Joyce Silveira Moreno 31/01/1948 Rio de Janeiro-RJ.
4 Entrevista concedida ao autor, em junho de 2007, em Brasília.


Ruy Godinho

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LUCIANA SANDRONI - RIO DE JANEIRO

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GUIMARÃES ROSA

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Fotografia: MQ
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segunda-feira, 16 de agosto de 2010