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A revelação não o surpreendeu;
suspeitava desde muito, na infância, na mocidade. Sempre uma coisa estranha,
espécie de comichão dando no centro do corpo e uma coisa saliente no pensamento
vazando inteira para as extremidades dos membros. A atenção redobrava, os
sentidos aguçava o raciocínio formulado com muita rapidez, quase aviltava o
interlocutor.
Ela era bela e sofisticada, curvava o
olhar enquanto falava, parecendo querer ser interrompida, confrontada com
alguma razão. Ele apertava os olhos e disfarçava dúvidas, não contracenava.
Ouvia. Só ouvia.
A revelação veio entre a intenção das
palavras. Claro como aquela tarde quente, estranha como as probabilidades do
seu corpo. Ele era um demônio...
Sim, um demônio, sentia, sentia ser.
Foi como um rastilho de pólvora aceso, seu pensamento correu o passado todo.
Era mesmo, lembrava-se a cada momento de suas transmudações ao longo da vida.
Queria rir, gargalhar, mas se conteve.
Impassível, ouviu a transgressão confessada, o desejo de remissão impresso na
voz. Viu nos olhos molhados nostalgia e nenhum arrependimento. O esforço que
ela fazia para inventar uma história já não tinha importância. Era só um espectador.
A beleza ele já roubara. O arbítrio da fé não o interessava. Apenas ergueu o
copo. Em silêncio, brindou ao pecado que a colocara inteira no seu inferno
particular.
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