oração
de floresta e rio
canto
de abertura (canto da terra)
a floresta range
num rio dentro de
nós
o rio ruge
na floresta aqui
em nós
orai por eles
orai por nós
sons de lendas
visagens que ardem
rogai por nós
mãos postas em
desafio
vento indo
rodopiando as
direções
da hora norte
rogai por ele
zelai por nós
corpos em eito de
águas
impregnados
escorrendo
anchos
esquecidos
orai por eles
rogai por nós
alma de floresta
esfarrapada
pungindo
orai por ela
rogai por nós
alma de rio
se amiudando
sumindo
orai por ele
rogai por ele
zelai por nós
afluentes homens
rios
calados passando e
vendo passar
leito lodo ruindo
homem vindo
da aridez de mãos
tardias
e intenções vazias
bisbilhotando
escolhendo
vindo
vindo
a floresta range
num rio
o rio ruge
na floresta
urge
urge
juntai os homens
rios
das margens e
matos
com seus calos
e terçados
juntai seus afluentes
em estridência de
águas
suas chuvas
em emoção de
pranto
juntai sementes em
húmus férteis
maternais
juntai seus
habitantes
mais primitivos
sabedores dos seus
mistérios
seres rudes
mas racionais
predadores de mãos
limpas e férteis
juntai floresta e
rio
suas entidades
suas lendas
em labaredas
o espírito dos
seus
mortos
que vivos
estão impregnados
nas suas águas
solidárias
no seu verde
calado
e quando todos
juntos
estiverem na
oração maior
que é reunir
somente um grito
será dado
escolhendo com as
entranhas
o que se quer
daqui
canto
da alma da floresta
resulto em
harmonia
no corpo
esparramado
esfarrapando
tocado pelo sol
possibilitando ainda
nascentes
vidas
resulto da
esperança
de habitantes
em convivência
de chagas
lacerantes
que cubro toda
noite
com uma colcha de
estrelas
canto
da alma do rio
do ventre
que venho
o ventre que tenho
traz saudade
da nascente
mas em abraços
recebo contente
todas as águas
que correm em mim
e toda a ferida
que purga por
dentro
quando rebento
na angústia de
desaguar
se cura no sal
que me é sina
de sempre
encontrar
canto
dos afluentes
seiva silenciosa
matando arredores
deixado nascer
o verde e o maduro
conduzindo o homem
rio
servindo-lhe mesa
farta
ensinando aonde ir
seiva silenciosa
canto dolente
afluentes
que depois viram
braços
entrando
alimentados
e alimentando
fertilidade
vão indo
convivendo
semeando
seiva e silêncios
com seus gritos
canto
do vento
tece os espaços
leva no ar
o bico dos
pássaros
canta
mensageiro de
sementes
em vôo livre
escolhendo
e se soltando
em liberdade
de pé de vento
e rodopio
misturado em
desalinho
nas copas
nos caminhos
desfazendo
pontaria
espalhando gestos
e intenções de
assobio
rindo
canto
das margens
sou lugar de
chegar
e partir
sou paralela
ponto por ponto
às
vezes, me aproximo
e quase beijo
receosa, me afasto
mas desejo
sou assim
indecisa por
inteiro
nunca me afasto
tanto
da outra margem
de mim
todos me querem
desde o olho
d´água
pensando que me
divide
até o outro lado
que tanto insiste
mas sempre faço
convite
quando espraio
em sedução
sou também
estrada, limitação
corro em águas
com a alma dentro
do chão
canto
da chuva
sou inesperada
e gosto assim
caio ou me espalho
onde quero
às vezes, sou
mansa
e acaricio
noutras, me
desalinho
inundo
vivo no ar
mas no fundo
gosto mesmo
de dar de beber
de embriagar
encher os rios
escorrer
fertilizar
canto
da semente
broto pelos cantos
corro em bicos e
corpos
voando
sei nadar
sonho em frutos
e viro galhos
entrelaço
crio espaços
quero o sol
sou o pólen no
labor
em mistura
de flor
semeada
dou-me inteira
sustento tua boca
abrigo-te sedutora
quando me busco
sozinha na terra
luto bravamente
pra ser de verdade
semente
canto
dos animais
no rasto
no risco d´água
na intenção de céu
em invisível
caminhar
também semeamos
nossos universos
somos muitos
entre floresta e
rio
em palmos
e gotas
no equilíbrio
de nós mesmos
canto
dos corpos
sou bainha que
recebe
a lâmina fria do
terçado
de terça a terça
de todas as
semanas da lida
vivo
espetado na
exuberância
que a simplicidade
não imita
sei andar
navego
e tenho liberdade
dos gestos
de conhecer até a
próxima curva
sou negado em
generosidade
de peixes e frutos
no desmazelo de
quem me aparta
sou também a
conformação
inconformada em
mim mesma
imito a floresta e
o rio
crio histórias pra
esquecer
lembrando
quem posso ser,
sendo
canto
das lendas
caminho
das histórias
de boca a ouvido
passando
de ido a indo
pra memória
de quem virá
verdadeiro
relato que é
possível contar
na palavra que
engole os rios
e faz a floresta
sonhar
canto
dos mortos
zelai por nós
em nossa hora
futura
vós que sois o
húmus
que esterca
floresta e rio
com a vida morta
de vossos corpos
em brio e semente
vós que com o
espírito
em prantos
quer por essa
terra
tão pouco e tanto
vós, com vossa voz
ancestral
nos ensina a
cantar
nossos vivos
vós que fostes
resplendor
possibilite essa
referência
ensina-nos a rezar
por todos nós
canto
das mãos
santas que no
remar
gestos de oração
rogam por nós
mãos que pedem
padecidas
que manuseiam
e se doam
que abraçam em
colheita
mãos que ferem
fenecendo
e que benzem
cortam
e são cortadas
que protegem
e que agridem
mãos postas
em carinho
ou em calos
na noite do teu
corpo
grito
dos reunidos
gritamos a hora
norte
da harmonia
possibilitar
da convivência
acrescentar
das feridas
cicatrizar
das cicatrizes
só lembrar
gritamos na hora
norte
escolher
limitação
conduzir
fertilidade
sustentar
nossa busca
e buscar
nosso destino
gritamos em hora
norte
que venham
somar e
multiplicar
a nossa
generosidade
gritamos a hora
norte
na história
do nosso canto
o sonho
também de nossos
mortos
que trazemos
por entre as mãos
canto
final (canto da terra)
nossos corpos
puros na impureza
de reinar
em floresta e rio
nossas mãos
vento e chuva
em floresta e rio
sementes
de afluentes
nas margens
reunidos
com quem vive
e vem viver
com quem morto
vem morrer
com quem cantamos
e canta nesse grito
o que se quer
daqui
.
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