sexta-feira, 7 de agosto de 2009

CAMILO DELDUQUE

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Pobre diabo


O palácio de estilo mourisco, pintado de um branco surrado, construído bem no centro da pracinha em forma de ferro de engomar, agoniava o povo com histórias sobre a sua origem.

Do outro lado da rua, bem conservada, uma igreja de poucas portas, com nenhuma abertura que desse ao Palácio Mourisco.

Naquela cidade só se trabalhava até as quartas-feiras.

As missas matinais de todos os domingos e todas as quartas, na Igreja de Poucas Portas, lotavam. A nave principal acomodava mais as pessoas idosas que mais cochichavam sobre os seus amanhãs. E poucos rezavam de verdade. E é pouco provável que algum daqueles fiéis conhecesse, do outro lado da rua, o interior do Palácio Mourisco.

Só nas calçadas da Igreja de Poucas Portas existiam mendigos. Só ali estavam os vendedores de bugigangas.

Quando chegavam as noites das quartas-feiras, os pedintes, os mercadores e as outras pessoas se recolhiam as suas casas até o Domingo chegar. E então voltavam a Igreja de Poucas Portas para, quase sempre, passar o dia inteiro rezando, cochichando, ganhar e receber esmolas, comprar e vender bugigangas.

O Palácio Mourisco, de ar feudal, tinha os cunhais de argamassa corroídos, parecendo polainas envelhecidas. Lembrava as penúrias de um velho asilo abandonado.

Nos dias sem missa comentavam que um diabo andava pelas ruas. Muitos falavam ter escutado, saindo da boca da noite o som surdo de passadas fortes. Alguém já escutara a zoada característica de uma carruagem passeando suas rodas na rua lisa de paralelepípedos. O diabo mesmo nunca alguém contou ter visto.
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