sábado, 20 de novembro de 2010

ANGÉLICA TORRES LIMA

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Elegia

Enfrentar tuas roupas
teus espelhos, tua louça,

trocar os colares, o leque
o terço, o lenço bordado

é descer léguas ao fundo
da cisterna do quintal

é voar meio a crepúsculos
sulfurinos violáceos

rodeando os pequizeiros
vizinhos do natal.

O tempo em grão
debulhado na palma
da mão, com sal.

Seguir sem teus passos
ecoando no final
da tarde de janeiro

o carnaval
sem teu sorriso
vermelho derradeiro

e a quarta de cinzas
sem sinos ecoando
em nossa caminhada

de mãos dadas,
entre malacachetas e estrelas
da manhã fevereira.

Esmiuçar tuas coisas
à luz perolada
do quarto acortinado

é restar muito só,
sob luas e sóis e céus
à luz urbana pontilhada

no silêncio
da estrada
de chegada

é transportar a geografia
acinzentada na memória
do retrato, vazio

ao antúrio
enterrado
em tua cova.


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