segunda-feira, 12 de outubro de 2009

SERTÃO D'ÁGUA - NA INTENDÊNCIA

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continuação...



Na Intendência





A sala de espera que dava acesso ao gabinete do intendente estava cheia. Num canto, cônego Gaudêncio conversava com Dr. Cavalcante, irmão do bispo; no outro, o presidente do conselho ouvia com muita atenção o major Eustáquio da Brigada Militar. Aguardando na ante-sala, Dr. Artur, da Província do Pará; Dr. Pedro Nobre, da Folha do Norte, cada um sentado de um lado do sofá.


No gabinete, o intendente, em conversa reservada com o tenente Felópio, da capitania, e o desembargador-chefe de polícia Dr. Otávio, inteirava-se do resultado do patrulhamento da baía. Ouvia atentamente:

- Nada foi encontrado de anormal, as alvarengas patrulham dia e noite. Foram interceptadas dezenas de embarcações. Em nenhum caso constatamos fatos Somente o diz-que-disse de alguém que contou que alguém viu, mas nada que merecesse investigação. Tudo leva a crer que a história não passa de invenção de alguém mexendo com a crendice do povo.

- E as mortes, a mulher molestada? perguntava o intendente.

- Se o senhor considerar o misticismo do povo, tudo que acontecer de ruim na cidade vai ser atribuído à visagem.

- Essas mortes foram investigadas com rigor? perguntava o tenente ao chefe de polícia.

- Com muito rigor! Ainda estamos investigando os casos da Vila do Pinheiro. Temos uma morte que foi ataque do coração, outra por afogamento. Segundo atestam os médicos legistas, a senhora atacada não foi encontrada para esclarecimentos; o marido levou a família para o interior de Bragança. Na Vila do Pinheiro, as investigações estão atrasadas porque os corpos já tinham sido sepultados, mas confirmamos. A moça morreu com a cabeça esmagada, o pai de santo foi degolado.

- Se a teoria do tenente está certa, vamos espalhar que as alvarengas conseguiram encontrar o tal ser e o prendeu. O que o senhores acham? Propôs o chefe de polícia.

- Teremos que administrar uma multidão que vai querer vê-lo preso. Vamos ouvir o comandante da brigada. Pedindo pra chamá-lo, o intendente ficou pensativo, imaginando já dar a notícia aos jornais, cujos responsáveis mandara chamar.

A opinião do comandante foi de propagar a notícia de uma outra forma, dando como caçada pelas alvarengas e abatida a tiros. Houve uma unanimidade entre os presentes que passaram a planejar os próximos passos. A comunicação oficial seria feita ainda no dia, a tempo de sair nas manchetes. O intendente iria adiar a reunião com os jornais para o outro dia. A capitania colocaria mais duas alvarengas patrulhando o mais próximo da orla possível, para que fossem mais notadas. Na hora combinada, os disparos seriam intensos e que fossem simulados destroços de uma canoa, uma mortalha... coisas desse tipo para se ter o que mostrar.

continua...


MQ
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