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TELETEMA
(Antonio Adolfo/Tibério Gaspar)
Rumo estrada turva,
Sou despedida
Por entre lenços brancos
De partida
E em cada curva
Sem ter você
Vou mais só
Corro rompendo laços
Abraços, beijos,
E em cada passo
É você quem vejo
No telespaço
Pousada em cores
No além
Brando corpo celeste,
Meta – metade,
Meu santuário,
Minha eternidade,
Iluminando
O meu caminho
E fim
Dando a incerteza
Tão passageira,
Nós viveremos
Uma vida inteira,
Eternamente,
Somente os dois mais ninguém...
Eu vou de sol a sol,
Desfeito em cor,
Refeito em som,
Perfeito em tanto amor...
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Então, foi assim...
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Adonis Karan, produtor conhecido no meio televisivo – criador do Festival Universitário da Música Popular Brasileira, em 1968 (que revelou um naipe de compositores do calibre de Gonzaguinha, Aldir Blanc, Ivan Lins, Silvio da Silva Junior, César Costa Filho e outros), e do
atualíssimo Festival de Chorinho do Rio de Janeiro – apresentou ao seu amigo compositor Tibério Gaspar1 uma moça que ambos apelidaram carinhosamente de Turquinha. Logo Tibério e Turquinha começaram a se encontrar. “Ela dizia que gostava muito de mim, mas eu não botava fé nas suas juras de amor”, afirma Tibério. “Eu achava que era apenas mais um caso sem compromisso. Ela, no entanto, sem que eu soubesse, estava pretendendo um relacionamento mais duradouro. Esses desencontros são normais na vida.”2
Um dia, ainda no início do namoro, Turquinha ligou para Tibério e o convidou para sair. Era domingo. Tibério entediado deu uma desculpa alegando que tinha um compromisso na manhã de segunda e preferia ficar em casa. Sugeriu amavelmente um encontro na segunda à noite ou, talvez, na terça. Turquinha insistiu: “Poxa, mas eu queria tanto ver você hoje. Estou com saudades. Será que a gente não pode tomar um chopinho no Baixo Leblon, bater um papo e depois você volta pra casa?” Tibério arrematou: “Não vou, não. Não leve a mal, mas hoje não dá. Prefiro ficar por aqui até o sono chegar”. E realmente ficou em casa. Ela saiu com os amigos pro Baixo Leblon.
Alta madrugada, voltando pra casa em Copacabana, Turquinha pegou carona com um casal de amigos, espremida no banco de trás de um Karman Guia. Ao passar nas proximidades do Jardim de Alah, o carro sofreu um grave acidente.
Amanhecendo o dia, mais ou menos às seis da manhã, Tibério foi acordado pelo amigo Adonis Karan ao telefone: “Olha, eu tenho uma péssima notícia pra lhe dar. A Turquinha faleceu num desastre de automóvel. O corpo está na capela do Cemitério S. João Batista”.
A notícia chocou profundamente o poeta, que imediatamente se dirigiu ao local informado. Chegando lá, aproximou-se lentamente da urna e ficou a contemplar o rosto sereno da moça rodeado de flores. O pensamento em confusão reprisava freneticamente o diálogo que tivera na noite anterior. “Ela estava no caixão deitada, muito bonita. Não teve grandes escoriações. Não estava deformada. O Antonio Adolfo3 havia me dado uma música pra fazer letra. Aí eu cheguei à frente do caixão e comecei a versejar como se fora ela me dizendo:
Rumo, estrada turva, sou despedida
por entre lenços brancos de partida
em cada curva sem ter você vou mais só
corro, rompendo laços abraços beijos...”
Ali no ambiente triste do velório nasceu Teletema (gravada originalmente por Regininha para a novela Véu de Noiva, da TV Globo, em 1969, e, posteriormente, obteve o 2º lugar no II Festival Internacional de Atenas-Grécia numa performance inesquecível da cantora Evinha).
1 Tibério Gaspar Rodrigues Pereira 11/9/1943 Rio de Janeiro-RJ.
2 Entrevista concedida ao autor, em abril de 2006, em Brasília.
3 Antonio Adolfo Maurity Sabóia 10/02/1947 Rio de Janeiro-RJ.
Ruy Godinho
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