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Três Quartas da Limeira era o nome do lugar onde chegamos, mato ainda. O pai, a mãe, meus irmãos e o cansaço de muitos dias de viagem, seguindo com seu Baldino e suas histórias.
Lugar do tudo por fazer, ermo. No mais de ano é que apareceram os vizinhos, seu Zequinha, dona Dalcina e a filharada. Foi meu primeiro medo: apareceram de repente, o rancho já estava erguido, já havia banco para sentar, o limpo para a primeira roça, a vaca leiteira e algumas criações; alegria do pai com seu Zequinha, oferecendo ajuda no que carecesse.
As primeiras colheitas, meu primeiro vestido de chita, meu segundo medo. Eu e Quinzinho, meu irmão, levando almoço para os baianos na roça; medo de cobra na palha de arroz onde brincávamos, esperando as vasilhas. Medo do cobreiro curado por Zé da Casca, benzedor agregado de seu Zequinha.
Meu terceiro medo, o pai contando histórias do invisível; noite escura, ele no meio dos baianos em volta da fogueira, na porta da casa. Ao seu lado, em pé, bem junto dele, não demonstrava não. Nesse dia, enquanto ele contava uma história do Ronca-Quente, aquele silêncio de mais medo que atenção, no descrever os passos do tinhoso, de dentro da casa ouvimos o barulho de passos na tábua larga do assoalho. Foi aquela correria. Nesse dia os baianos dormiram na sala, em cima da pilha de arroz já colhida. Eu e meus irmãos, juntos com o pai e a mãe, tão assustados quanto nós.
O quarto medo não tive, acostumei com as histórias dele para os baianos.
Num dia, contava que o ouro que roubaram em Arrependidos acabou nas mãos de um seu compadre que, escondido no mato, na hora em que o coletor e um companheiro amoitavam os alforjes. Ouviu.
- Abre um buraco bem aqui, perto dessas pedras.
O companheiro furou o buraco. O coletor perguntou.
- Como é seu nome todo companheiro?
- Custódio dos Anjos.
O coletor enquanto dava os dois tiros, rindo.
- Fica guardando o ouro e só entregue prá quem disser seu nome todo.
E enterrou o morto junto com o ouro.
O pai ria demais e dizia, para agradar, que o compadre dele era baiano.
Depois que o coletor sumiu das vistas, seu compadre baiano saiu do mato e chegou perto da cova.
- Seu Custódio dos Anjos, vim buscar o ouro.
Todos riram.
Foi nesse dia que notei o olhar, meu primeiro desgoverno, o corpo esquentou, o coração disparou e olhei também. A alegria estava ali, daquelas, também minha primeira.
Julho do ano nos casamos. No mutirão fizemos nossa casa de adobe perto da casa da mãe. Tinha dezesseis anos.
Meu segundo desgoverno, o corpo esquentou, o coração disparou, contei para a mãe primeiro, depois para Terêncio que me erguia para o alto. O pai jogava o chapéu e dava tiros, como naquela vez, quando chegamos e ele confundiu o barulho do veado perto da cerca e atirou; pensou ter matado uma onça e furou todo o chapéu, na alegria.
Meu terceiro desgoverno, o corpo esquentou, o coração disparou, minha primeira filha, Aurora. Ela, diferente dos meninos, nasceu junto com o dia. Alegria de Terêncio ao dar o nome Aurora.
Nesse tempo, mudamos dos Três Quartos da Limeira, minha primeira tristeza.
MQ
Leia a obra completa aqui: http://sertaodosaomarcos.blogspot.com/
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sábado, 28 de maio de 2011
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Tempos remotos, casas de adobe e um calor infernal. No finalzinho dos noves meses, mas uma criança nascia. O pai era só alegria, mas também havia muita correria. Normalmente, no mais tarde da noite é que a barriga doía. A mãe chorava muito e ajuda pedia. O pai corria no pasto e pegava a besta ruana, essa atrelada na carroça para a fazenda vizinha se dirigia. A parteira, mais ou menos já sabia. Num instante na carroça subia e na escuridão da noite sumiam. Ao se aproximarem da casa o chorinho da criança se ouvia. A parteira descia e se deparava com a mãe que sorria. Na valise velha e surrada uma tesoura havia; detalhe, sem nenhuma assepsia. Imediatamente o umbigo era cortado e bem no cantinho do quarto era enterrado. Nos dias seguintes, muita sopa de galinha se comia, essa acompanhada de cerveja preta aumentava o leite, esse dos mamilos escorria. Hum, mas também, vez ou outra acabava a alegria, pois, mormente, criança morria por causa do mal de sete dias. Pois é, tudo causado pela falta da tal da assepsia.
ResponderExcluirSeja benvindo Jorge, abraço.
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