domingo, 22 de maio de 2011

ANA TERRA

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Homens

Por Ana Terra, do Rio de Janeiro



Vivências e memórias de uma poetisa e letrista da MPB.


Homens, melhor tê-los. E aprender com eles o que nos ensinaram por meio da poesia, da literatura, das artes, quando dominavam sozinhos esses territórios. O amor romântico é uma invenção do masculino. Fruto da inteligência emocional para tornar menos árida a luta pela sobrevivência e a reprodução da espécie. Afinal, o que fazer no intervalo entre um ato sexual e outro? Como me ensinou um amigo: quem ama é o homem, a mulher confia.

Mas há os desencontros, desacertos e uma grande discussão entre natureza e cultura, como se os humanos não fossem filhos dos dois. E agora a nova lei que equipara abuso a estupro, para o bem e para o mal.

Homens não são objeto de desejo das feministas radicais de gênero, que acreditam ser o órgão sexual do homem, assim como o machado, uma arma utilizada desde a pré-história para atemorizar as mulheres e mantê-las sob seu jugo. E que toda sedução masculina é um estupro, só que alguns homens se dão ao trabalho de comprar uma garrafa de vinho.

A teoria oficial do estupro, nos Estados Unidos, originou-se no livro de Susan Brownmiller, Against our Will (Contra nossa vontade), lançado em 1975, que apresenta o estupro como crime de violência e não de sexo.

A doutrina do “bom selvagem”, aliada à percepção da década de 1960, quando o sexo deixa de ser visto como sujo e passa a ser encarado como natural, e como o que é natural é bom, o estupro sendo um mal não teria vinculação com o sexo. Como se o sexo não fosse também cultural e um tsunami fosse bom porque é um fenômeno da natureza.

A idéia das feministas passa a ser uma avaliação consensual e, em 1993, a Organização das Nações Unidas (ONU) declara: “O estupro é um abuso de poder e controle no qual o estuprador tenciona humilhar, envergonhar, embaraçar, degradar e aterrorizar a vítima.”

Essa idéia foi posta em dúvida quando, em 2000, é publicado A natural of rape, do biólogo Randy Thornhill e do antropólogo Craig Palmer. A lógica apresentada na pesquisa é que havendo possibilidade de procriação, mesmo que pequena, poderia ser uma “tática oportunista”, uma ação selecionada, e não excluída, do processo de seleção natural. “Ou poderia ser subproduto de duas outras características da mente masculina: o desejo por sexo e a capacidade de praticar violência oportunista para atingir um objetivo.”

Esses cientistas não apresentam nenhuma justificativa moral para o estupro, pelo contrário, apresentam cenários onde haveria maiores possibilidades de ocorrência e fazem sugestões para evitá-lo. Também sugerem que a aversão das mulheres ao sexo forçado teria origem na sua natureza biológica: a fêmea é que escolhe o macho para copular, selecionando os genes que desejam para dar continuidade à espécie. Essas idéias incendiaram o campo feminista e a crítica em geral: os autores haviam desrespeitado um tabu.

A questão principal que se apresenta é que se o estupro e sua proibição estão presentes em todas as sociedades humanas, o que pode ser feito para diminuir sua ocorrência?

Legislação com graves punições é uma óbvia medida, afinal o papel da cultura é afastar o homem de sua natureza animal e instituir regras civilizatórias. Quando os laços da civilização se afrouxam, no caso de guerras e ausência do Estado, o estupro é uma prática muito mais frequente do que gostaríamos de supor. Assim como a tortura, amplamente divulgada, infringida por soldados americanos, homens e mulheres, a prisioneiros iraquianos, por exemplo.

A relação sexual evidentemente deve ser consensual mas, excluindo os casos praticados por psicopatas e os de guerra (considerando-os uma patologia coletiva), até onde pode ser razoável atribuir toda responsabilidade ao homem?

Quando depois de aceitar o jogo de sedução, uma mulher concorda em ir para o quarto de um homem? Temos o famoso caso do lutador Mike Tyson que rendeu uma boa indenização à vítima e cadeia para o acusado. Neste, como em tantos outros, não existiria um consentimento implícito da mulher? Não podermos desconsiderar o puritanismo da sociedade americana e a consequente hipocrisia, além da indústria de indenizações, que é uma instituição naquele país.

No oposto ao puritanismo, o que dizer dos bailes funk do Rio de Janeiro onde se praticam, pública e anonimamente múltiplos “estupros consentidos”? E o que pensar do argumento que justifica a violência como expressão legítima dessas comunidades?

E por que não se discute seriamente a precoce erotização das crianças pelos programas infantis da televisão. E por que confundi-los com a prática em voga de dar “selinho” e dizer “eu te amo”, como se essas expressões fossem destituídas do erotismo que, na verdade, contêm? O ato sexual é para adultos. Às crianças deve-se permitir a infância. E todas as fantasias que lhes cabe em suas mentes infantis. E não as nossas. Será que para elas um tapinha não dói?

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