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Surgi entre os fios de teus cabelos.
Nasci ali de uma hora para outra, em poesia.
Morei em cada um e os vi branquear pouco a pouco.
Assim é porque meu ninho são tuas histórias e serei tua mãe e teu pai, o sertão, o pó, a lágrima arredia, a carne navalhada, os sons, os cantos, os pensamentos soltos com os quais semeastes florestas e florestas.
Nascerás de mim, está escrito. Serei o útero e inverterei a ordem da vida para que venhas ver o mundo outra vez. Nos esquecidos da memória o resgate do menino. Viverás a sina do poeta: recontar os passos na estrada em cânticos que jorram da boca de teu povo, mas não da tua. Contarás todos, um a um, porque meus olhos serão ternos e desejarão sorver-te a vida e fazê-la parte de meu sangue e de meu riso.
Eu vim sem avisar-te. Achei de encontrar-te quase em sono, entre teus devaneios ainda, no lugar que é teu, e que, mesmo acompanhado, estás só e não pertences a ninguém a não ser a ti mesmo.
Achei de aparecer assim, nua, tão nua que abriste os olhos com força e sei que sorveste minha vida inteira por eles.
Agora que ela entrou em ti nos pertencemos.
Quando teus olhos sugaram os meus naquela primeira noite, eu chorei por dias e dias. Fiquei ali na beira de teu leito, cada noite. Queria entrar em teus sonhos e pesadelos. E entrei. Por mágica do destino, talvez, nem tentastes me impedir. Estavas em teu canto solitário e deixaste a porta entreaberta. No saguão havia festa, pessoas amigas riam e cantavam em tua sala, nas varandas. As árvores vergavam à tua lembrança agradecidas, e havia também o cortejo dos caboclos, sertanejos, das rendeiras, carpideiras, negros, índios. Eles passavam e cantavam em tua porta. Era a mais linda procissão que já se viu. Estavam vivos de novo graças a pulsação de tua mente forte, profunda. Estavam vivos e lembrados. Cantavam e erguiam estandartes, facões, enxadas, chapéus de couro e palha. Jogavam para o céu estrelas coloridas que lá se fixavam e vinham habitar de novo tua mente viva. Projetavam nas paredes da cidade, no coração do povo adormecido, um chamado, um apelo, uma ordem. Sejamos o que somos e mais ainda. Sejamos o que fomos e mais ainda! Ousemos o que nunca seremos!
Eu estava ali, sentada ao teu lado e não via nada de mim.
Tinhas olhos acesos e logo querias cantar-me. Querias mais. Querias que te pertencesse urgentemente, porque sofres de urgências desde sempre. Mas eu... apenas segurei tua mão em silêncio e dizia sem palavras o amor imenso que te daria dali para a frente.
Então, vi teus olhos fecharem. Abraçaste a mulher e não soltavas minha mão da tua. Ficamos assim madrugada afora.
Eu velei teu sono inteiro, de ponta a ponta.
E quando foi manhãzinha, o sol mal nascia, tudo era claro e era eu que dormia.
Sonhei em meu berço, sonhos de criança. Havia um homem com olhos de estrelas e ele cantava palavras bonitas.
E o vi. Segurava minha mão pequena e não havia mais ninguém naquele quarto vazio.
Somente eu e ele.
Habitava meus sonhos e sorrisos de quem recém nasceu para o mundo. Recém nasci e não sei de nada a não ser daquela mão segura na minha como se me dissesse: não deixo que sumas. Não sumirás porque agora tens a mim para velar por tua história.
Foi assim, dum inesperado puro, que tudo começou.
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terça-feira, 24 de novembro de 2009
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Adorei!
ResponderExcluirLi e reli...
A leitura foi mágica, a medida que lia, me deliciava visualizando cada cena descrita.
Marielza, Parabéns pelo belo texto!
Quinan, obrigada sempre por tudo isso.
Edilene,
ResponderExcluirUm abração.