Cultura é educação. Educação é cultura
Por Isabela Cribari
Deixo a Fundação Joaquim Nabuco. A instituição onde tive o prazer e a honra de participar à frente da Diretoria de Cultura. Fundação a qual meu avô, Antíogenes Chaves — com dedicação e serviços prestados muito mais relevantes que os meus — me ensinou a amar e respeitar desde a infância. Hoje, a sua memória dá nome a um dos prédios da Casa, enquanto Nelson Chaves, meu tio, nomeia o seu principal prêmio.
Foi urdida por este respeito que aceitei o convite, em 2003, para dirigir os trabalhos da Cultura. A responsabilidade maior, no entanto, era fazer jus ao pensamento tão contem¬porâneo de Gilberto Freyre. E colocar a cultura a serviço da formação e da educação do homem brasileiro. Sob este compromisso, montamos uma política cultural para além dos muros da instituição. Criamos interlocução de saberes. Apoiamos multidisciplinaridades. Promovemos a convivência e troca com estudantes. Mestres. Doutores. Artistas. Professores. Produtores. Profissionais liberais. A sociedade.
Implementei a política cultural que acredito. O princípio fundamental não era tão-somente levar o conhecimento da Fundação Joaquim Nabuco a outros lugares. Mas receber e partilhar conhecimentos de outros lugares e pessoas. Numa relação viva. De mão dupla. No serviço público é comum observarmos a postura reativa de alguns, reagindo muito e fazendo pouco. Justificativas para não fazer as coisas de fato acontecerem brotam todos os dias nos gabinetes. Os engessamentos a que as instituições públicas estão submetidas por si só já justificam parte dessa inércia. Mas encontrei uma equipe diferenciada na Fundação Joaquim Nabuco. Ao lado da equipe que entrou comigo (e que me honra chamar para sempre de parceiros valorosos), a “gente da Casa” teve perfil ativo ao invés de reativo. Reclamou pouco e fez muito.
Focamos nossa atuação nos princípios de formação que propiciasse a reflexão. A difusão educativo-cultural. O fomento para diversos setores, colocando a cultura a serviço da educação. Nisto seguimos o conceito basilar de “homem situado”. Como ensinou Gilberto Freyre. Mas também os passos de educadores como Adolfo e Bertha Lutz. Eles ensinaram que os bens científicos e culturais precisavam se transformar em instrumentos modernos de educação. Os passos de Roquette-Pinto. Da sua educação popular pelo rádio. Que criou a rádio educativa. Do educador Humberto Mauro, que montou o Instituto Nacional do Cinema Educativo. E colocou este bem cultural do país a serviço da educação. Como pensou e agiu o músico Villa-Lobos. Da música a serviço da educação.
Todos eles entenderam que situar o homem culturalmente era a forma de educar mais plenamente este homem. Este é o papel das políticas públicas. Organizar e difundir a cultura, organicamente. Elevar os conhecimentos da identidade nacional. Da língua. Da história. Dos costumes. Fizemos assim. Educação a serviço da cultura. Cultura a serviço da educação. Da edu¬cação. Não apenas da escola. Ivan Illich nos ensinou assim. Assim ecoaram os grandes educadores deste país.
Agradeço ao Ministério da Educação e à Fundação Joaquim Nabuco a possibilidade de contribuir para esta união. Agradeço à minha equipe. Aos servidores da instituição. Aos nossos parceiros e apoiadores por todas as ações. Cada uma delas. E não foram poucas. Destacamos a implantação, com o MinC, do Centro Audiovisual do Norte e Nordeste (Canne). A restauração e implantação de um centro cultural no Engenho Massangana. Deixo ali agenda marcada para visitação de 30.000 alunos da rede pública. A edição e publicação da Coleção Educadores. Um dos maiores projetos editoriais do país. Com distribuição de mais de 11 milhões de livros nas escolas públicas do Brasil.
A difusão do pensamento e a contribuição mais relevante de pensadores nacionais e estrangeiros para a educação. Da edição de importantes livros para a Presidência da República. Para o Ministério da Educação da França. Da realização do projeto Poemas Animados. Da adaptação do poema Morte e Vida Severina para os quadrinhos e para a animação. 50 mil escolas do Brasil alcançadas. Mais de 20 milhões de espectadores. Da criação do Cine Educação. Do cinema na¬cional como ferramenta pedagógica no conteúdo formal de educação nas salas de aulas. Convênio assinado para 1.000 escolas em Pernambuco. Acordos firmados para estender o programa para todas as escolas públicas estaduais do Nordeste.
A implantação do setor de arte-educação na Fundação Joaquim Nabuco. A reforma do Cinema da Fundação. A garantia de acesso gratuito a este cinema aos professores. A criação do concurso de roteiros de documentários Rucker Vieira. Um dos melhores prêmios do país. A criação do prêmio Mário Pedrosa de ensaios sobre arte e cultura contemporânea. Do concurso de videoarte. Todos de alcance nacional. A compra e acesso púlbico a um dos mais importantes acervos de videoarte da América do Sul. Dos cursos e de coleção de livros sobre estudos da cultura contemporânea.
Que cada ponto se transforme em vírgula. Caso se entenda no futuro o que aqui se fez.
Deixo a instituição com a certeza do dever cumprido com o Fernando — o Lyra, que me convidou a vir. Com o Fernando que me convidou a continuar — o Freire. Permaneço com a convicção de ter sido fiel aos ideais do criador. Ao pensamento tão atual do patrono. Permaneço firme nas minhas convicções mais profundas. Principalmente. Elas me movem a trabalhar com tamanha paixão.
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