quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

MARCELO QUINAN - 2009: O ano da desdigitalização

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2009: O ano da desdigitalização

Em 2009 desdigitalizarei.

Veja bem, isso não significa que sairei do Orkut, FaceBook, Flickr e
Twitter, ou que trocarei o iPhone por um celular monocromático que
apenas ligue e receba ligações. Não estou buscando isolamento.

Significa que, além de tudo isso, voltarei a escrever cartas. À primeira
vista não parece tão diferente de um email. E não é: o email nasceu
da carta. O que muda é saber onde as pessoas moram, colocar a
intensidade das palavras na caligrafia e rasurar sempre que um
pensamento atropelar o outro. Quem lembra se o remetente tem que
ir na frente ou no verso do envelope? Eu não. Eu escrevo 3 vezes
mais rápido no computador do que à mão, o que me leva à pergunta:
será que eu realmente penso no que escrevo pelo teclado? É claro
que esta é a velocidade que o dia-a-dia exige, mas a proposta não é
abandonar o digital. É dar tempo para o analógico.

Também montarei novamente meu laboratório fotográfico em casa.
Revelarei filmes tirados com minha câmera analógica, que não me
deixa ver como a foto ficou. Que me força a prever a foto. Que exige
que eu tenha olho pra focar, pra medir a luz (com a ajuda do
fotômetro), enquadrar, enfim... que me proporciona o prazer de
esperar pra ver como ficaram. O analógico é durão, as regalias são
menores. A alma do negócio é você e não a câmera.

O mesmo vale para os vinis, que nunca deixarão de existir. Pelo
menos pra mim: a duração perfeita, a sonoridade perfeita. Você tem
algum tipo de contato físico com a música, ao contrário do digital.
Citando Lenine, o futuro é vinil. Eu concordo. E não apagarei nenhum
MP3 do meu iPod por isso. Nem os do próprio Lenine.

Por fim, tirarei minhas mãos do castigo e voltarei a desenhar. Temos
mãos tão capazes e desperdiçamos esse potencial em pequenos
movimentos do mouse. Sei que produzir uma idéia no computador
corta caminhos, mas é justamente no caminho que estão as grandes
idéias. Por isso, vou pro papel. Não é o acabamento que me importa
neste momento, mas sim a certeza de que percorri o caminho
criativo com calma e cuidados suficientes. Certeza de que passei por
todas as experiências que aquele caminho proporcionava.

Desdigitalizarei para pescar os pensamentos leves, aqueles que
passam depressa demais e quase sempre são soterrados. Quero dar
mais chance e tempo para as intuições se manifestarem, pois é lá
que mora a genialidade. A velocidade das intuições pode ser supersônica,
mas o registro ainda é analógico.

Temos toda esta informação e tecnologia de que dispomos hoje nos
conduz para uma escala eletrônica da vida. Um ritmo quase
instantâneo. Quero voltar para a escala humana, de contato, ao
mesmo tempo em que uso todos esses novos recursos. Quero voltar
a dialogar com o lado lúdico das pequenas ações cotidianas, para,
enfim, subvertê-las em idéias autênticas.

Esse lado lúdico, aliás, me remete à infância e aos momentos em que
procuramos entender como as coisas funcionam, desmontando e
separando os componentes básicos. Fizemos isso até chegar ao
átomo e, mesmo assim, prosseguimos, dividindo, separando,
isolando. Agora precisamos de tempo pra absorver o funcionamento
das partes. No mundo digital, as partes já estão fragmentadas.
Poucos se permitem demorar para entendê-las em conjunto. Em
2009 quero voltar a conhecer todas as partes das pequenas ações
do meu dia-a-dia, do email à foto digital, da carta à revelação em
laboratório.

Se este resgate der certo, constatarei que minha vida não é nem
digital nem analógica, perceberei que é justamente a separação das
partes que gera o contraste. Se tiver sucesso, a noção de dois
universos separados vai se perder no momento exato em que os dois
lados estiverem em equilíbrio e harmonia. Terei, enfim, a experiência
completa.

Marcelo Quinan de Porto Alegre - Rio Grande do Sul
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2 comentários:

  1. eu tenho orgulho de dizer que eu morava no quarto ao lado desse gênio autodidata. Dizem que tá no sangue. Mas nao, "está", e o tempo é relativo, no quarto ao lado...

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