quarta-feira, 20 de abril de 2011

Ninguém me Conhece: 43) O Sublime Desespero de Rafael Iasi

.

Minha amiga Monika (assim mesmo, artístico, sem acento e com K) Mendonça é uma espécie de fã profissional. Começou na rua Caiubi, 420, aonde ia religiosamente (foi, inclusive, quem nos deu - a mim e a Kana - a primeira carona lá); em pouco tempo já era a, digamos, fotógrafa oficial dos eventos caiubísticos; em seguida se especializou em filmar as apresentações e disponibilizá-las no youtube. Hoje tem mesmo sua página lá (Brazil Autoral), repleta de preciosidades. Mas o tempo passou, e o Caiubi foi ficando pequeno pra ela, que levou sua câmera pra palcos outros. No fundo, no fundo (não tão no fundo assim), foi a maneira que encontrou de compensar sua frustração por não ser cantora ou compositora e assim manter-se perto do universo musical que tanto ama.



O que Monika não levou em conta foi que, independente de seus talentos desenvolvidos, ela já podia se considerar artista somente por ter trazido ao mundo a prole linda que possui. Estes, sim, verdadeiras obras de arte! Claro que não podemos esquecer os 50% de direitos autorais que cabem ao sr. Iasi. Mas o fato é que, frustrado ou não, o desejo de Monika se projetou em seu filho varão, Rafael Iasi, que o transformou em realidade. Deixemos então, por ora, Monika, que deve estar agora ocupada filmando artistas que trilham o caminho do sucesso, e tratemos do moço Iasi, nosso Rafa.


Minto. Lembrei-me de um detalhe interessante não acerca de Monika, mas dos fãs profissionais (e mesmo de uns amadores) em geral que acho relevante. Estes, na condição de profissionais, esperam também profissionalismo de seus ídolos. Vão aos shows, decoram as letras, são amorosos, perseverantes, divulgam, convidam os amigos etc. Em troca, esperam uma única coisa de seu ídolo: que ele, por sua vez, tenha êxito na carreira. Quando o tempo passa e esses fãs percebem que o artista não consegue se enquadrar no perfil dos vencedores, meio que (talvez inconscientemente) se envergonham de ter gastado todos aqueles tempo e dedicação com "projetos de malditos" e passam a buscar em outros artistas, mais novos e vigorosos, o solo fértil onde plantar seu amor de fã. Pode parecer meio cruel, mas num mundo de vencedores qual fã quer se ver ligado a um artista... Sei lá, digamos... A um artista desses que protagonizam os textos do Ninguém me Conhece? Atire a primeira pedra quem nunca abandonou um ídolo! Não sou Jesus, mas tampouco eu a atirarei...


Deixemos de nhem-nhem-nhem e vamos ao Rafa, pois! Conheci-o, como a tantos outros talentosos rapazes aqui já citados, no improvisado palco da rua Caiubi, com um sorriso contagiante, moço bonito que sempre foi, com a autoconfiança de quem tem o público na palma da mão, mais Paul Newman que James Dean. Aparentava mesmo ser muito mais jovem do que era, descobri depois. E, embora não fosse um excelente cantor, tinha charme e belas canções, além de presença de palco. Lembro-me de certa ocasião em que Zé Rodrix, numa das tantas vezes que apresentou as segundas autorais caiubistas, fez um comentário chistoso a seu respeito, ao chamar ao palco meu parceiro Policastro: "Com vocês, Marcio Policastro, que tem andado muito ultimamente com o bad boy Rafael Iasi".


Mas Rafa não é simplesmente um bad boy inconsequente. É um cara ousado, sim, sem medo de errar, questionador, desses que não pensam duas vezes antes de chutar o balde, pôr a mochila nas costas e se mandar sem rumo, como já fez mais de uma vez; no entanto, o moço persegue seus objetivos, e entre os principais está a busca por autoconhecimento (tocar or not tocar). Por conta disso já chegou mesmo a abandonar a música e a urbe e passar um tempo no campo, em contato com a terra, plantando e colhendo. Foi, podemos dizer, seu momento zen. Talvez tenha seguido à risca os versos da canção de Carlos Careqa: "Por que você quer ser artista,/ Por que você quer ser cantor?/ O campo precisa de gente/ Não tem mais agricultor".

Não discuto com os irmãos Valle quando dizem que "a mão que toca um violão se for preciso faz a guerra", mas as finas mãos de Iasi não nasceram pra manusear uma enxada, muito menos fuzis. Deixemos de lado o garoto que amava os Beatles e os Rolling Stones, e também enxadas, pás, foices, fuzis, tacapes, tridentes... O instrumento do moço é o violão. Por falar em instrumento, uma das primeiras letras minhas que ele musicou só podia mesmo ser cantada por ele, que, com coragem e cara de pau devidas, como se cantasse uma canção infantil, não poucas vezes (e sem camisa de força, nem de vênus), entoou, pra uma plateia incrédula (embora talvez crente), a polêmica O Pau Nosso. Não transcrevo a letra aqui porque pode haver crianças na sala...


Mudando de pau pra cavaco, informo que Rafael Iasi é um de meus cantautores caiubistas prediletos. Sua música sabe equilibrar-se com naturalidade sobre o fio tênue da versatilidade e escapar de rótulos sem cair na rede (que não há em seu picadeiro). Pop, rock, samba, xote? São apenas ferramentas das quais se utiliza, variando de acordo com a letra que tem em mente (ou em mãos, caso sejam estas de terceiros). Da mesma forma, sua poesia flerta com a fina ironia, o deboche, ou mesmo o panfletarismo, sem perder o conteúdo. E Iasi, quando é pra meter a mão na massa, não pensa duas vezes. Em certa época de sua vida gastou uma grana enoooorme pra gravar em qualidade radiofônica uma única canção. Com o dinheiro gasto poderia ter gravado um CD inteiro, mas preferiu primar pela qualidade e lançar um single, que bem poderia ter tido o mesmo título do recém-nascido CD de Lis Rodrigues, Artista de Sinal. Explico: Iasi, com o tal single na mochila, teve a ideia ousada de vendê-lo nos semáforos, o que, além de lhe ter rendido muitos trocados, ainda chamou a atenção de muita gente e virou até notícia de rádio (pena que não tenha virado sucesso de rádio).

Resumindo: Iasi é um compositor mais que necessário em tempos vazios em que a maioria "fala demais por não ter nada a dizer". E é justamente uma pena que ele, que tem tanto a dizer, ande mesmo calado, sumido. Tenho saudades do tempo em que estávamos mais próximos, sempre com uma ideia na cabeça e um violão na mão. Espero sinceramente que ele não tenha voltado pro campo, a não ser que seja pro campo do Rondon, onde este tem um belo estúdio. Agora acabou de me vir à mente uma curiosidade: será que é mal de Rafael essa coisa do sumiço? Tem um Alterio que se enfurna em sua fazenda, um Leite que se esconde sob o teto de uma banca de jornal, um Barreto que vai pra Paris, um Iasi que vai pro campo... Sumir or not sumir...

Demorei pra falar dele pela dificuldade mesmo de encontrar disponíveis suas canções, que lembro só de memória (e de youtubadas). Por isso, mais uma vez, tive que recorrer à SuperMonika. Espero que as gravações que postei na página caiubista de meu X do Poema consigam fazer jus ao que ele é ao vivo. Termino com uma paráfrase conhecida:

Rafael Iasi, quando é que tu vai gravar CD?





***





Ouça alguns dos sublimes desesperos de Iasi aqui.

Leia as letras aqui. (Obs.: Por falta de gravações minimamente audíveis, acabei postando apenas canções de Iasi em parceria, mas o moço manda muito bem em parceria consigo próprio. Esperemos esse bendito CD sair pra comprovar)


Rafa Iasi também está no Caiubi.



Por Léo Nogueira
.

Nenhum comentário:

Postar um comentário