terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

Cor da terra

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Cor de terra sobrepondo as gradações como se quisesse ter uma luminosidade propositadamente opaca.

Ficava na parede fronteiriça à porta, de maneira que, quem entrasse, não via imediatamente.

Ela viu, admirou e não conseguiu mais tirar os olhos. Comprou e levou para casa.

Alguns meses se passaram em muitas tentativas de achar o lugar ideal para pendurá-lo. Cada parede que experimentava, sentia que não era ali, parecia faltar alguma coisa. Em poucos dias ele se entortava ou amanhecia de cabeça para baixo muitas vezes a assinatura indecifrável mudava de lugar; não era loucura, ela media e comprovava. Um mistério.

Voltou à galeria, queria saber mais, qual a história daquele quadro? Quem era o artista?

 

- Não sabemos nada dele, quando compramos o negócio, já o encontramos na parede pendurado, ninguém sabe o nome do pintor - responderam.

Foi num dos quartos desocupados da casa que acabou sendo pendurado; quando aproximou o quadro da parede, a impressão que teve foi de um puxão para um encaixe perfeito. Ali ficou.

Para aquele quarto ela acabou transferindo seus afazeres, mudando seu cotidiano. Passava horas olhando a pintura.

Todos os dias aqueles tons alteravam a paisagem retratada, detalhes desapareciam ou iam se trocando, se rearranjando na textura, nas camadas de cores e sombreados.

Cada dia ela se trancava mais até que resolveu não sair mais dali.

Quando deram por sua falta e, ao arrombarem a porta, não a encontraram. Sentiram apenas um cheiro de orvalho recendendo e duas mãos saindo da paisagem cor da terra.

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