segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

Cheio de morte - mq


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Sabia o quanto tinham sido caros, o amor e a paixão misturados a tanta mágoa. Sabia que não sabia da dor, ajudando a enterrá-los. Será que o perdão fora exumado? Em que momento eles foram morrendo? Perguntava-se.

De alguns não se lembrava exatamente quando e como aconteceu, era como se tivesse convivido com eles em decomposição. Talvez por intuição ou teimosia restasse alguns dentro de si.

Seria algum tipo de ressurreição - a reflexão - não aceitar, aceitando? Teria sentido, algozes cheios de vida, perfumar a lâmina? A razão banhar e vestir o sentimento sem assinar o óbito, sem conduzi-lo até o fim? Perguntava-se.

Muito não sabia; queria ter estado presente em cada enterro, mas a morte era assim, colhia só o instante, como numa plenitude e cada sentimento, em seu último alento, prometia recorrências; ficariam mantidos nos sentidos, como membros amputados, vivos por dentro.

Havia morrido demais, vivido demais e sentia nostalgia, saudade, rancor e autopiedade; eram os fantasmas assombrando.

No ser, a angústia sustentava carpideira os velados e os indigentes, com sua voz estridente. Urgência acompanhando a criatura insepulta, mas cheia de morte.

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domingo, 28 de fevereiro de 2016

Choro Carimbó

 
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sábado, 27 de fevereiro de 2016

Luz - mq

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sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Ler poesia - mq


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João, amigo de Carlos, perdeu-se de Clarisse. Clarisse, irmã de Vinícius, tinha mau hálito e queria Augusto, que não suportava Yêda, por ser muito pedante.

Thiago olhava para Olga profundamente, mas ela queria Mário, com seus braços enormes. Ele sempre achava que ia morrer de câncer e de amores por uma outra aluna chamada Angélica, que amava Paulo, que teve a pretensão até de se casar com Marisa, mas essa só tinha olhos para Affonso, enquanto flertava com Ademir.

Todos conheceram Rubens, irmão de Camilo e Renato, gostando de Valéria, que um dia esbofeteou Mário numa esquina.

João encontrou Yêda e foram infelizes, tendo filhos um atrás do outro. Clarisse foi amante de Mário apenas por uma noite, ele fumava muito. Augusto demorou a se descobrir, virou travesti e saiu do país para se operar e mudar de sexo. Carlos está na política, assessor. Clarisse casou-se, tem dois filhos e diz ser feliz. Vinícius virou evangélico e mora no interior.

De Thiago, as únicas coisas que se sabe: tem muito azar e ainda mora com a mãe. Olga gasta sua herança viajando o mundo. Angélica é médica e está separada de Paulo desde o último ano.

Marisa sofreu um acidente, é paraplégica. Affonso cria gado no norte e faz um tratamento atrás do outro para acabar com a obesidade. Ademir é piloto internacional, nunca conseguiu encontrar uma companheira. Rubens e Valéria são casados e comerciantes. Camilo é treinador de futebol e o irmão, Renato, é funcionário público, casado com uma mulher linda.

Todos eles, misturados ou não, têm um vazio no nome, nunca leram uma poesia.

 

 
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quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

Trilha D'água

 
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quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Embriagados - mq

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A conversa se arrastou por mais de duas horas. Mágoas, demandas, traições e ressentimentos era um rascunho se desenhando.

Justificavam o que parecia justo. Um afirmava o amor. Outro escolhia não amar mais e dizia isso claramente. Os dois estavam mentindo.

Metáforas tiraram a afiação das palavras. Deslealdades, covardias e falta de limites foram imputadas a razões egoístas, como coisa do humano convivendo no amor.

Os melhores momentos não faziam parte daquele ato.

O que um idealizou do outro não estava mais no gesto dos olhos, tinha se perdido em momentos diferentes. Faziam falta.

Para um, viver tudo que pudesse. Havia muita vida em si. Para o outro, o melhor do que tivesse, havia muita morte em si.

Na mesa, a toalha manchada de molho, a bebida que não embebedava. Era um momento comum.

Quantidade e qualidade provavam da mesma perda, a verdade dizia suas mentiras e a mentira, suas verdades.

Em volta, na outra mesa, a decepção começava a beber com o ódio; o perdão pedia a conta e tentava retirar o amor e a paixão embriagados do local.
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terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

Marujada - MQ

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segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Cor-de-terra - mq


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Cor-de-terra, sobrepondo as gradações como se quisesse ter uma luminosidade propositadamente opaca; ficava na parede fronteiriça à porta de maneira que, quem entrasse, não via imediatamente.

Ela viu, admirou e não conseguiu mais tirar os olhos. Comprou e levou para casa.

Alguns meses passaram-se, em tentativas de achar o lugar ideal para pendurá-lo; cada parede que experimentava, sentia que não era ali, parecia faltar alguma coisa. Deixava por uns dias.

Ele se entortava ou amanhecia de cabeça para baixo. A assinatura do artista parecia mudar de lugar; não era loucura, ela media e comprovava. Um mistério.

Voltou à galeria, queria saber mais, que história tinha, quem era o artista?

- Não sabemos nada dele, quando compramos o negócio, já o encontramos na parede pendurado -responderam.

Foi num dos quartos desocupados da casa; quando aproximou o quadro da parede, a impressão que teve foi de um puxão para um encaixe perfeito. Ali ficou.

Para aquele quarto ela acabou se mudando e mudando seu cotidiano, passava horas olhando a pintura.

Todos os dias a figura quase disforme retratada parecia ir desaparecendo, se rearranjando, trocando tons, mudando camadas de cor como se transformasse em terra. Cada dia ela se trancava mais no quarto, até que resolveu não sair mais dali.

Deram por sua falta e, ao arrombarem a porta, não a encontraram, sentiram apenas o cheiro forte de terra orvalhada.

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domingo, 21 de fevereiro de 2016

Carvoeiro

 
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sábado, 20 de fevereiro de 2016

Carvoeiro - mq

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sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

Varanda da Noite

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quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

Fava - mq

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quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Espelho - mq


 

Costume, acordar de manhã, sentar-se na cama com os dois pés bem plantados no chão, segurar com as mãos cada lado da barriga, pegando por baixo como se a levantasse.

Na frente do espelho ficava olhando, perdida na estética do pensamento. Sonhava mudar, dar um jeito nas rugas, puxar o rosto, fazer aquele tratamento moderno para a lanugem e, principalmente, tirar um pouco da gordura localizada. Falava com o espelho, receitando; ouvia da imagem possibilidades, certezas e simulações.

O local tinha sido escolhido de tal forma que, formando o ângulo com o chão, o espelho pudesse refletir fielmente o que incidia, inclusive os pensamentos, numa leitura de dimensões e percepções muito precisa.

Quando quebrou, os muitos pequenos pedaços se espalharam no chão. Os cacos acinzentados perderam a propriedade refletora e deixaram escorrer de dentro, como se sangrasse, os fragmentos de todas as imagens que já lera.

O espelho novo foi colocado no mesmo quadro de madeira, na mesma distância da parede e no mesmo ângulo do chão.

Instalado, manteve as digitais do operário, apenas por instantes; sua superfície lisa e brilhante logo se autolimpou. As propriedades de reconhecer e refletir as imagens demoram aquela tarde inteira e uma noite para serem processadas e  permitir ler o ambiente, quase imutável, que faria variar em cada posição de olhar.

A alma acordou lânguida; sentou-se na cama, segurou com as mãos cada lado da barriga, suspirou e foi para a frente do espelho novo.

Suspirou novamente e aí ouviu a infâmia: - gorda.

 

 
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terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

Caixeiras do Maranhão

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segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

Vila da Telha - mq

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domingo, 14 de fevereiro de 2016

Diagnóstico - mq


 

Mais que um choque, não conseguia racionalizar. A notícia começou a tremer o corpo inteiro, foi dada com cuidado, mas só produziu a desarmonia que ele levou para casa.

Tinha ficado mais de cinco dias no hospital fazendo exames, não sabia que existia tanto procedimento, tanta tecnologia para diagnosticar as doenças. Não sabia que os médicos se interessavam tanto por um paciente, que existiam tantos psicólogos, assistentes sociais e psiquiatras. Porque tinha aceitado se submeter àquilo, queria apenas ficar sozinho, não conviver com ninguém, não ter que conversar, que obedecer. Que merda, pensava.

Quase nada do que disseram entendeu, explicações demais. Médicos demais, reuniões demais. A única coisa clara era o que mais o desgostava, teria que viver sempre com alguém por perto, mesmo quando estivesse dormindo; nada de portas trancadas, foi a única recomendação. Nenhum procedimento era possível no caso, nenhum medicamento foi recomendado.

A pergunta do médico responsável chocou-o mais ainda. Poderia apresentar seu caso num congresso médico? Propunha-se a cuidar dele enquanto vivesse, se ficasse em observação para que o estudassem mais detalhadamente. Que absurdo, pensava.

Não sabiam explicar, mas no lugar do coração tinha o cérebro e no lugar do cérebro o coração. Se não pensasse, morreria na hora.

Quando chegou em casa. O telefone não parava de tocar; logo a campainha, e começaram a chegar os parentes, os amigos, repórteres querendo entrevista. Seu caso já estava em evidência na imprensa.

Era o caos.

E foi no meio desse caos que ele pensou muito e tomou a decisão: parou de pensar.

 
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sábado, 13 de fevereiro de 2016

Mandacaru

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sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

Jabaroca - mq

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quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Despedida - mq


 

Disso me encarrego, dos teus sapatos, da lógica dos teus vestidos, dos pequenos acertos – de lembrar, de esquecer, de guardar.

Não misturo minhas mãos a tapas e agressões, meu egoísmo é solidário e solitário – o tempo não pode voltar.

Vai que haverá ainda muitas noites de luar, pisa neles, posa neles – deslumbras.

Meu caminho nunca se acabará, não tenho destino, o que me ungiu foi dor de mundo – nada acalmará.

Disso me encarrego, do teu sentimento, da mágica de algum momento, de não te esquecer – minha estatura.

Não misturo o que não pondero, um poeta pode dizer minhas palavras e ser em vão – desacato e sei desatar o azar.

Vai que é vida, o mundo escolhe e se deixa escolher, a sede de algum ponto de vista, está na água – nasça na sua viagem.

Meu rosário é desigual, contém todos os erros que são o meu jeito também, contém o direito pertinente de tê-los – meus algozes.

Disso me encarrego, da mentira das mãos, do que não era preciso, e da urgência de algum olhar; me encarrego do silêncio – maior palavra.

Não misturo o que me deste com o que fizeste calar, subestimaste minha hora e a obra-prima que foram os instantes - amarga boca.

Vai, a cena é tua, freqüenta o perigo de ser feliz, a necessidade do teu corpo poderia ser o meu e a dele o teu, era tempo ainda, mas deixa a tristeza do nosso amor no silêncio – bebo a falta.

Esse é meu tanto de mágoa transposto para o amor que carrego – tanto e tão pouco.

 
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quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Manariano

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terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

Maria Fragmentada - mq

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segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

Terra Morena

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domingo, 7 de fevereiro de 2016

MANARIANDO

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No escuro - mq


 

Mesmo jeito, mesma mesa, mesma bebida, mesmice no olhar triste. Ela o via quase todos os dias no bar. Bebia uma garrafa inteira, pagava a conta e ia embora. Um apaixonado, diziam os habituais.

Aproximou-se o mais que pôde e, a cada vez que conversavam, tentava induzi-lo a abrir o coração, contar do amor que sentia.

Um dia ele bebeu demais e precisou ser levado para casa, precisou chorar suas mágoas; aceitou o carinho e a atenção dela em ouvi-lo. Acordou no meio da manhã, sozinho, nu como gostava de dormir e com uma música suave programada no aparelho de som. A cabeça doía, quem era ela? O que tinha acontecido? Já era fim de tarde; lembrou-se que eram amigas de infância; lembrou-se de ter conversado muito, de um perfume embriagador, do calor de um corpo nu. Teria sonhado? Lembrou-se da música, do prazer. Tinha gostado; estava escuro, muito escuro.

Outra noite. Chegou no bar, mesma mesa, mesma bebida. Esperou. Ela nem se sentou, de pé mesmo o convidou para saírem dali, tinha uma proposta.

Sabia tudo sobre a pessoa que ele amava, conhecia-a muito bem desde a infância; sabia do que gostava e do que não gostava, seria um segredo, não diria a ninguém.

No escuro, podia fingir ser ela como na noite anterior.

 

 
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sábado, 6 de fevereiro de 2016

Janela Fechada - mq

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sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

Assim Será

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quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Laranjal - mq

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quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

Telelém

 
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terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

Descaso - mq


 

Os transeuntes que o socorreram não o conheciam; com ele, nenhum documento de identidade. Era apenas um velho que caíra na rua próxima e ficara inconsciente. Deitado na maca, encostada na parede, esperava pelo atendimento.

Veio nos braços, desacordada, febre muito alta; o posto de saúde do bairro não tinha recursos, foi encaminhada até ali. No semblante da mãe chorando, resignação. Uma cadeira para acomodar a criança foi arrastada pelo chão.

Na maca vizinha, o rapaz urrava de dor com uma fratura exposta na perna amarrada com sua própria camisa; também esperava socorro.

O corredor comprido, mesmo assim insuficiente para tantos casos. Emergências de todo tipo se misturavam ao atendimento caótico que embrutecia todo dia os médicos, enfermeiras e os funcionários. Na verdade, não cuidavam da saúde de ninguém; amenizavam, isto sim, a doença de tanta escassez. Esta sim, era de verdade a emergência.

No meio da enfermaria improvisada no corredor, duas televisões ligadas na emissora mais assistida completavam o quadro.

As enfermeiras improvisavam o que podiam enquanto cada um esperava sua vez. Na maca, o velho começava a ter espasmos sem que ninguém visse.

Seus últimos momentos foram ali, enquanto, na televisão, o governo fazia a propaganda diária de suas realizações.

 


 

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

Canoa - mq

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