sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

FELIZ ANO NOVO

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Primeiro olhar

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Senti saudades
Quando te conheci
De todos os dias
Da minha vida
Em que não te vi

Foi assim
Que te reconheci


MQ

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quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Mário Faustino - O mundo que venci deu-me um amor


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O mundo que venci deu-me um amor,
Um troféu perigoso, este cavalo
Carregado de infantes couraçados.
O mundo que venci deu-me um amor
Alado galoupando em céus irados,
Por cima de qualquer muro de credo,
Por cima de qualquer fosso de sexo.
O mundo que venci deu-me um amor
Amor feito de insulto e pranto e riso,
Amor que força as portas dos infernos,
Amor que galga o cume ao paraíso.
Amor que dorme e treme. Que desperta
E torna contra mim, e me devora
E me rumina em cantos de vitória.


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quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Cecília Meireles - Retrato


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Eu não tinha este rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios,
nem o lábio amargo.
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Eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração
que nem se mostra.
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Eu não dei por esta mudança,
tão simples, tão certa, tão fácil:
-Em que espelho ficou perdida
a minha face?


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terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Vinícius de Moraes - CONTRÁRIO DA MORTE É O DESEJO?

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O contrário da morte é o desejo?
O contrário do espetáculo é o fim?
O contrário do alheio é o que há em mim?
O contrário do nada é o que não vejo?
O contrário da sede é saciar-me?
O contrário da margem é a margem?
O contrário da fé é quem a desarme?
O contrário: os que ficam ou os que partem?
O contrário do contrário é a frase.
O contrário da frase é o abismo.
O contrário do abismo é a valentia.
O contrário do valente é a sua base.
O contrário da base é o seu batismo.
O contrário de Deus? O Homem cria.


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Ninguém me Conhece: 29) Nelson Machado, un Brasiliano

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Foi depois de um show em alguma cidade da Itália, não me recordo qual. Já era madrugada. Voltava ele pra casa (mais especificamente, Bolonha), cansado, com sono, pensando num bom banho quente, uma taça de vinho, quiçá. Naquelas ermas horas ele não podia imaginar que passaria cerca de um ano sem voltar pra casa. Tudo foi muito rápido, diria mesmo cinematográfico (as tragédias sempre têm um quê de cinema). Foi como na canção de Toquinho e Vinicius que dizia que "Ao cruzar a rua você está arriscando/ Pode estar na lua, pode estar amando/ Passa um caminhão, cruza uma perua/ O cara tá na dele, você tá na sua [...]". É, o cara tava na dele, ele tava na sua, de repente, numa fração de segundos, lá estavam ambos desafiando as leis da física, dois corpos ocupando o mesmo espaço. Agora não vem ao caso saber quem estava errado, este não é um roteiro de filme policial. Tampouco importa investigar o que sucedeu com o outro, visto que ele não passou de um (trágico) figurante nessa história. Importa saber o que aconteceu com o protagonista, Nelson Machado: A partir daí, sua vida se resumiu a sofrimento, dor, desilusão, sucessivas cirurgias de reconstituição, placas disso e daquilo pelo corpo... E o pior, segundo o diagnóstico do médico, ele jamais poderia voltar a tocar!

Voltemos no tempo pra relembrar uma noite bem distinta daquela. Mais precisamente no bairro paulistano do Bixiga, no finado (e saudoso) Boca da Noite. Nessa noite
Élio Camalle me apresentou a Nelson, seu amigo de longa data. Boa pinta, boa praça, boa prosa; noite passando fácil e ligeira e Nelson me contando um pouco de suas aventuras. Ele se formara em violão erudito, mas a paixão pela música popular levou-o a mudar de galho. Claro que o erudito ajudou na sofisticação harmônica, na disciplina com os estudos, mas João Gilberto venceu essa queda de braço com Villa-Lobos. Daí pra tocar em bares foi um pulo. Passagem pelo Rio, claro, e passagem (aérea) comprada (só de ida) pra Itália. História um tanto parecida com a de Vasco Debritto, com o qual, aliás, sua vida iria cruzar, mas a seu tempo. Por ora basta dizer que ele, de férias no Brasil, tinha feito um novo amigo: eu.

A parceria, no entanto, não foi tão fácil assim. Mandei-lhe umas letras (daquelas da pastinha verde), porém, nem estas eram boas, nem ele era bom em musicar letras. O negócio dele era fazer a melodia antes, como outros antes aqui relatados. Nessa época eu nem havia conhecido
Kana ainda, que foi com quem aprendi (a duras penas) a letrar melodias. Nelson voltou pra Bolonha e eu, pra Americanópolis. Acho que ainda nos vimos em suas férias posteriores, até que eu soube do acidente. Mas a estrela de Nelson brilhava ainda mais forte no céu escuro de suas noites frias naquele leito de hospital. Desenganado, desenganou o médico. Um ano depois, já estava tocando violão quase tão bem quanto antes. Claro que o cansaço vinha mais depressa, mas os dedos obedeciam ao comando do dono. Mais alguns meses e já estava de volta à sua velha rotina. Com um diferencial: Morador da Itália, acidentado lá, recebera do governo uma compensação em dinheiro que lhe possibilitou, entre outras coisas, gravar um CD com as várias canções inéditas que havia composto nos anos posteriores ao diagnóstico del dottore. Fosse no Brasil, ou estaria morto ou mal pago.

Ressuscitado, este Lázaro cantautore tinha pressa. E aqui entro de novo, pois fui justamente eu quem veio à sua memória quando pensou em letrista. Passou por cima da pastinha verde e resolveu me dar nova chance, dessa vez despejando em meu colo mais de uma dúzia de belíssimas melodias, pras quais me pediu gentilmente que pusesse letra, mas... Pra ontem! Nessa época me senti o próprio Chico compondo com Edu Lobo pra, sei lá, O Grande Circo Místico. Quero dizer, considerando as devidas distâncias, senti-me um profissional capacitado a trabalhar obedecendo a prazos curtos. O fim do ano chegou e, com ele, Nelson, esbaforido, querendo aproveitar aqueles poucos meses de férias pra gravar o tão esperado/adiado CD.

Mas muitos anos na Europa acabaram fazendo-o perder o contato com os músicos brasucas. Assim que, escolado pelo trabalho com
Kana em seus dois discos, acabei apresentando-lhe mais ou menos a mesma turma que gravara com ela seu Imitação. E no mesmo estúdio.
Acompanhei na íntegra a gestação deste Brasiliano (assim batizamos o CD), tão babão quanto qualquer pai (visto que todas as letras do CD eram minhas - uma, em parceria com Marciel Consani, é verdade). Quando, finalmente, com uma cópia em mãos, arranquei com fúria o plástico e pus a bolacha pra tocar em meu gasto aparelho de tanta quilometragem, conter a emoção não pude. Passou a ser meu cartão de visita. Todo mundo que vinha à minha casa não ia embora sem ouvir ao menos uma ou duas faixas do tal Brasiliano. Mais importante do que qualquer crítica de jornal foi presenciar a reação de
Adolar Marin ao ouvi-lo. O cara chapou! Tanto que, no dia seguinte, ligou-me perguntando se eu não havia sentido a falta de nada. Como eu não notasse, avisou-me: "Pega outra cópia com o Nelson, que aquela eu passei pro meu nome". Não é que o punguista me subtraíra o CD? Sorte minha que eu tinha outra de reserva. Futuramente, ao lançar seu não menos belo Atemporal, Adolar me confessou que durante todo o processo de gravação teve em mente atingir a qualidade do Brasiliano. Virou referência!

Foi munido de todas essas opiniões (
Camalle e Kana também o adoraram) que convenci o supracitado sr. Vasco Debritto a lançá-lo no Japão, por sua Koala Records. Lembro-me também de que, ainda na época das gravações, convidara Oswaldinho do Acordeon a tocar duas faixas no disco. Quando este foi embora, me agradeceu muito pela rara oportunidade que eu lhe dera de participar de um trabalho tão bom (palavras suas). Infelizmente, como nem tudo são flores, Nelson, marinheiro de primeira viagem, entregou seu CD nas mãos de alguns italiani furbi e acabou trilhando sua via-crúcis por burocráticas estradas até reaver o que era seu. Mas isso é uma outra história. A que interessa neste relato é a de um camarada que enfrentou a morte, venceu obstáculos e realizou um sonho. Claro que a vida continua, os sonhos se sucedem, e este não é um relato de autoajuda. Nelson, com seu CD debaixo do braço, aprendeu que realizar um sonho é apenas o primeiro passo nessa longa e esburacada estrada... E que sonhos custam caro! Ou seja, a verdadeira história começa depois do "e foram felizes para sempre"!Neste exato momento ele deve estar lá em Bolonha, passando frio e fundindo a cuca a imaginar como pode realizar seu mais novo sonho (que tem cara de uma equação daquelas matadoras de neurônios): voltar pro Brasil definitivamente sem perder a qualidade de vida e, mais difícil, sem perder la bella ragazza italiana que caiu em sua rede/lábia de pescador/cantor. De quebra, como o mundo não para pra que resolvamos questões urgentes, ainda planeja gravar um novo CD nas prováveis férias de verão (o brasileiro, claro). Já me contactou, inclusive, pedindo-me pra manter a agenda livre nos meses de janeiro e fevereiro. Como não temos mais que uma ou duas canções prontas, novamente imagino que este Chiquinho do Ceará vai ter que se virar em dois pra dar conta de mais este Cambaio.

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Ouça algumas das canções del brasiliano Nelson aqui: http://clubecaiubi.ning.com/profile/OXdoPoema

Leia as letras aqui: http://clubecaiubi.ning.com/profiles/blogs/nelson-machado

Nelson também está no Caiubi: http://clubecaiubi.ning.com/profile/NelsonMachado


Por Léo Nogueira - http://www.oxdopoema.blogspot.com/

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segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

VELHO MENINO

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Velho menino
(Eudes Fraga / Marcos Quinan / Paulo Fraga / Iranildo Pereira)

Estou cada vez mais velho
E sou cada vez mais moço
Sou presa fácil do tempo
Da vida que é meu esboço
Não há muita diferença
Entre o homem e o menino
Tenho os dois no mesmo compasso
Quando traço meu destino

Tenho tudo o que vivi
Não deixei nada pra trás
Da lembrança sou refém
Da saudade muito mais
Na consciência o caminho
E a vontade de lutar
Meu amigo eu sou o mesmo
Nunca fui de engabelar

O amor
Que me espera
Tem desejo pendurado
Na janela do olhar
Sou feliz, a vida é bela
Meu amor não tem idade
Perto dela

Agora estou...

Estou cada vez mais velho
E sou cada vez mais moço
Sou o senhor dos meus passos
Nos sonhos que não tem fim
Eu nunca conheci cansaço
O meu santo é meu padim
Meu torrão é quem me consola
Quando a dor esbarra em mim

Tenho tudo o que vivi
Não deixei nada pra trás
Da lembrança sou refém
Da saudade muito mais
Na consciência o caminho
E a vontade de lutar
Meu amigo eu sou o mesmo
Nunca fui de engabelar

O amor
Que me espera
Tem desejo pendurado
Na janela do olhar
Sou feliz, a vida é bela
Meu amor não tem idade
Perto dela

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Piano : Adelson Viana

Baixo : Aroldo Araújo

Percussão : Hoto Junior

Violão : Eudes Fraga

Vozes : Eudes Fraga e Marcus Brito

Arranjo : Coletivo

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RUY GODINHO - ENTÃO, FOI ASSIM?

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NERVOS DE AÇO
(Lupicínio Rodrigues)

Você sabe o que é ter um amor, meu senhor
Ter loucura por uma mulher
E depois encontrar esse amor, meu senhor
Nos braços de um outro qualquer?
Você sabe o que é ter um amor, meu senhor
E por ele quase morrer,
E depois encontrá-la em um braço
Que nem um pedaço do seu pode ser?
Há pessoas com nervos de aço,
Sem sangue nas veias e sem coração
Mas não sei se passando o que eu passo
Talvez não lhes venha qualquer reação
Eu não sei se o que trago no peito
É ciúme, despeito, amizade ou horror
Eu só sinto é que quando a vejo
Me dá um desejo de morte ou de dor.
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Então, foi assim...


“As músicas de Lupicínio Rodrigues1 foram todas feitas para prostitutas”,
diziam seus amigos.

Mário Goulart2 conta que um desses amigos, o compositor carioca
Rubens Santos, disse-lhe certa feita: “Lupicínio, você parece o São Francisco”.
Lupi – como era tratado pelos amigos – pensou que tinha a ver com
os bichos que criava. “Ah sim, porque eu vivo cercado de pássaros, não
é?” Confessadamente maldoso Rubens explicou: “Não, Lupicínio, não é o
santo. É o rio. Porque você vive cercado de piranhas...”

Apelidado de Criador da Dor-de-Cotovelo pelo apresentador Blota
Jr., Lupicínio só fazia músicas autobiográficas. Afirmava que as mulheres
boazinhas nunca lhe deram nada. Mas as que o traíram lhe deram carro,
casa, bares e casas noturnas. Cada traição virava música, cada música virara
sucesso nacional, embora ele não precisasse sair de Porto Alegre, onde
nasceu e morreu.

Essa trajetória começou nos idos de 1940, ainda não com as mulheres
da noite pelas quais ele tanto se apaixonou e foi traído. Mas com a adolescente
Inah, filha de uma família tradicional gaúcha.

Inah morava em Santa Maria, região central do estado, para onde Lupicínio
foi transferido quando era cabo do Exército, aos 15 anos de idade.
Foi o primeiro amor da vida dele, amor que durou até mais tarde quando
ele retornou a Porto Alegre. Mas, a vocação para a boêmia não o deixava
parar em emprego nenhum, vivia a se deliciar dos prazeres da noite e não
se habituava à vida convencional. A família de Inah reclamava, pressionava-
o para o casamento de papel passado, como manda o figurino. E ele
sempre postergava. Diante de tanta pressão, Inah o ameaçou: se ele não se
casasse com ela, ela se casaria com o primeiro sujeito que encontrasse, nem
que tivesse que morrer de fome em conseqüência desse gesto. Lupicínio
não a levou a sério.

No dia 02 de fevereiro de 1946, dia da festa de Nossa Senhora dos
Navegantes, em Porto Alegre, também chamada pelo povo de Festa das
Melancias, ele a encontrou devidamente aconchegada nos braços de um outro
qualquer, um braço que nem um pedaço do dele podia ser. Inah foi à tradicional
festa religiosa de braços dados com o marido.

Assim nasceu um dos clássicos da dor-de-cotovelo, imortalizado na doce
voz de Paulinho da Viola, em gravação de 1973, no LP homônimo.



1 16/9/1914 Porto Alegre-RS 27/8/1974 Porto Alegre-RS.
2 Lupicínio Rodrigues, o poeta da dor-de-cotovelo: seus amores, o boêmio e sua obra genial.



Ruy Godinho
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domingo, 26 de dezembro de 2010

JAC. RIZZO - Afago


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Um véu de água
me escorre na lembrança.

Sou um mural
de imagens e vozes

mergulhadas na umidade do tempo,
refletidas na transparência das pedras.

Transmudo tudo:

Sinto a doçura no mar
e amargo gosto no mel

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Jac. Rizzo - http://jacrizzo.blogspot.com/
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sábado, 25 de dezembro de 2010

Rubem Braga - A palavra

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Tanto que tenho falado, tanto que tenho escrito - como não imaginar que, sem querer, feri alguém?
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Às vezes sinto, numa pessoa que acabo de conhecer, uma hostilidade surda, ou uma reticência de mágoas. Imprudente ofício é este, de viver em voz alta.
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Às vezes, também a gente tem o consolo de saber que alguma coisa que se disse por acaso ajudou alguém a se reconciliar consigo mesmo ou com a sua vida de cada dia; a sonhar um pouco, a sentir uma vontade de fazer alguma coisa boa.
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Agora sei que outro dia eu disse uma palavra que fez bem a alguém. Nunca saberei que palavra foi; deve ter sido alguma frase espontânea e distraída que eu disse com naturalidade porque senti no momento - e depois esqueci.
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Tenho uma amiga que certa vez ganhou um canário, e o canário não cantava.

Deram-lhe receitas para fazer o canário cantar; que falasse com ele, cantarolasse, batesse alguma coisa ao piano; que pusesse a gaiola perto quando trabalhasse em sua máquina de costura; que arranjasse para lhe fazer companhia, algum tempo, outro canário cantador; até mesmo que ligasse o rádio um pouco alto durante a transmissão de jogo de futebol...mas o canário não cantava.
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Um dia minha amiga estava sozinha em casa, distraída, e assobiou uma pequena frase melódica de Beethoven - e o canário começou a cantar alegremente.
Haveria alguma secreta ligação entre a alma do velho artista morto e o pequeno pássaro cor de ouro?
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Alguma coisa eu disse distraído - talvez palavras de algum poeta antigo - foi despertar melodias esquecidas dentro da alma de alguém. Foi como se a gente soubesse que de repente, num reino muito distante, uma princesa muito triste tivesse sorrido..

E isso fizesse bem ao coração do povo; iluminasse um pouco as suas pobres choupanas e as suas remotas esperanças.

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sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

CAMILO DELDUQUE - Estrada do Mosqueiro - no carro do Felipe

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Aquele burro velho, parado no meio da grama queria falar comigo. Balançou o rabo, empinou as orelhas, sacudiu a cabeça e, meio aprumado, baliu. Sim, burro com voz de ovelha. Não, nada disso, aquele quadrúpede, notei, era irônico imitador de onomatopéias. Ele me chamou. Atendi. Não cheguei muito perto, atento, com medo de levar coice ou receber uma sonora gargalhada.
O eqüino mostrava os dentes como se fosse apresentador de televisão. Daí, perguntou, em boa imitação de voz humana, se eu lembrava de um sujeito da família dele que, lá pelas bandas da Galiléia, havia carregado um menino. Esse dito menino, quando adulto, tornara-se pregador eloqüente e, agora, era cantado em verso e prosa no mundo todo. Pensei com meus botões sobre o porquê daquele burro, no meio de um gramado mal cuidado, querer saber do parente tão distante. Matutei e, feito quem nada quer, convidei meu companheiro burro para tomarmos umas doses de cachaça no boteco da esquina. Mais por curiosidade, eu queria conversar. Ele, certamente, preferia continuar imitando onomatopéias e humanos. Bebemos todas e não conseguimos lembrar os nomes. Nem do jerico, nem do menino.

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quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

BOAS FESTAS

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SÃO FRANCISCO NORDESTINO

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São Francisco Nordestino
(Eudes Fraga / Marcos Quinan / Iranildo Pereira)

Deriva meu rio São Francisco
Espalha a colheita pela terra
Transborda meu rio
Não tarda mais não
Revela fartura
Pros nossos irmãos

Deriva meu rio São Francisco
E mata a sede do teu povo
São Chico das margens
Que vão para o mar
Entorna urgente
Chega de esperar

Molha os pés secos
Tira o sal do chão
Enche os leitos
Do meu coração

Nos traga então
A promessa do pão
Na semente espalhada
No ventre do sertão

Segue em paz com teu destino
De morrer sempre no mar
Mas deixa pelo caminho
Um pouco d’água
Pra mudar o descaso secular

São Francisco nordestino
Alivia o meu penar
Só te peço um pouco d’água
Daquela que vai pro mar
Velho Chico
Esse pouco é quase nada
E nunca vai te faltar

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Adelson Viana - Acordeon

Aroldo Araújo - Baixo

Hoto Junior - Percussão

Eudes Fraga - Voz e Violão

Arranjo Coletivo

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quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Vinícius de Moraes - ACONTECIMENTO

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Haverá na face de todos um profundo assombro
na face de alguns risos sutis cheios de reserva
Muitos se reunirão em lugares desertos
E falarão em voz baixa em novos possíveis milagres
Como se o milagre tivesse realmente se realizado
Muitos sentirão alegria
Porque deles é o primeiro milagre
E darão o óbolo do fariseu com ares humildes
Muitos não compreenderão
Porque suas inteligências vão somente até os processos
E já existem nos processos tantas dificuldades...
Alguns verão e julgarão com a alma
Outros verão e julgarão com a alma que eles não têm
Ouvirão apenas dizer...
Será belo e será ridículo
Haverá quem mude como os ventos
E haverá quem permaneça na pureza dos rochedos
No meio de todos eu ouvirei calado e atento, comovido e risonho
Escutando verdades e mentiras
Mas não dizendo nada
Só a alegria de alguns compreenderem bastará
Porque tudo aconteceu para que eles compreendessem
Que as águas mais turvas contêm ás vezes as pérolas mais belas


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Ninguém me Conhece: 28) Enveredando pelas Canções de Rafael Leite

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Por onde andará Rafael Leite? Por onde andará Rafa? "Ninguém sabe do seu paradeiro. Ninguém sabe pra onde ele foi, pra onde ele vai". Soube de fonte fidedigna que agora tem uma banca de jornal lá pros lados da Lapa (a paulistana). Já outros juram que viram o elemento num ônibus, violão às costas, voltando pro Vale do Paraíba. Ainda há aqueles que têm certeza absoluta de que o foragido era o sujeito de chapéu que fazia cantoria no centro da cidade. Qual dessas informações estará correta? O certo é que, com o desmantelamento da primeira sede do Caiubi, ele, que era figurinha fácil no local, começou a rarear suas aparições até descobrir a fórmula da invisibilidade. Em certa ocasião, na casa de Tato Fischer, por um momento cri tê-lo visto, mas depois percebi que me equivocara, pois o tipo de penteado moderno e pinta de galã não correspondia à descrição do bigodudo de rabo-de-cavalo que eu conhecera outrora.
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Bem, partamos do princípio, quem sabe assim, no meio do caminho, possamos encontrar, não uma pedra, mas pistas que revelem seu paradeiro. Elementar, meu caro
Nogueira! Pois bem, conheci Rafael, que também atende pela alcunha de Milk (!), na casinha de que falei acima, na rua Caiubi, 420. Natural de Redenção da Serra, cidade que sumiu do mapa pra dar lugar a uma represa, o Milk... Olha só, coisa engraçada, lembrei-me de que numa dessas idas ao Japão conheci um músico que tinha o mesmo apelido, só que em pronúncia japonesa ficava Míruku! Voltando: Rafael (prefiro assim), natural de tão peculiar cidade (embora espicasse ínglichi e hablasse ehhpanhôl), trouxe no sangue as raízes de seu torrão e, quando se descobriu compositor, optou por ser universal compondo/cantando as coisas de sua aldeia. E coisas belíssimas! E, além de tudo, figura das mais carinhosas, deu-me de bandeja desde sempre o valioso presente de sua amizade.
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Anfitrião de primeira ordem, costumava abrir sua arejada e charmosa casa pros amigos (que não eram poucos), e lá rolavam inesquecíveis saraus etílicos, poéticos, tabacais, musicais, fraternais e outros ais. Cansei de sair de lá, altas horas, curado pra sempre das dores do mundo. Mas não sei se virei persona non grata ou se foi a vida mesmo que foi nos levando pra reuniões menos celebráveis.

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Apesar de "amigos de infância", eu nunca havia tido coragem de lhe mandar uma letra, visto ser ele um compositor de temática tão diferente da minha. Contudo, foi ele quem deu o primeiro passo nessa direção, ao me convidar, à queima-roupa, a parceirar. Não me fiz de rogado. Pensei, pensei, fui puxando pela memória as lembranças que guardava de seu universo poético, mas nada que prestasse me saía. Até que, por fim, imaginei a situação por um novo prisma: se eu lhe enviasse uma letra que ele sozinho podia fazer, qual seria minha contribuição à sua obra? Nenhuma! Assim sendo, minha opção era expandir um pouco mais seu universo, abrindo mais o compasso até que este englobasse o meu próprio. Foi assim que nasceu Patrocínio, nossa primeira cria. Nessa letra eu não falo de sua terra, mas de como se sentiria alguém de lá vivendo em metrópole tão poluente (em todos os sentidos). Ele, ao que me parece, gostou e acabou musicando-a. A letra é esta:

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Guardo no peito/ No centro do caos urbano/ Um caipira satisfeito/ Um sujeito interiorano./ Nem saudosista/ Nem amante do progresso/ Tenho alma de artista/ E arte não tem endereço./ Minha fazenda/ Mora dentro dos meus sonhos/ E sonhos não estão à venda/ Meu amor é lá que eu ponho./ Eu tenho sina/ De mambembe, de errante/ Porém, Deus me patrocina/ E a noite é minha amante./ Bebo cachaça/ Ouço o som dos passarinhos/ Passo à margem da fumaça/ Toda flor tem seus espinhos./ O meu legado/ Minha viola garante/ Então durmo sossegado/ E minha voz segue adiante.

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Depois, antes que se desse sua desintegração, ainda emplacamos outra, Matuto Sem Mato. Nesta eu já estou mais à vontade em seu habitat, e chego mesmo a ensaiar certo molejo caipira na poética. Vejam se concordam:

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Meu cabelo eu reparto ao meio/ Sou feio mas tenho opinião/ Dizem lá no lugar de onde venho/ Mais vale o empenho que a ilusão/ Não vai gel, nem chapéu, nem implante/ O importante é que é natural/ Eu sou virgem de piercing e brinco/ Mas dou cinco na horizontal./ Vivo bem sem colar nem coleira,/ Pulseira, pingente, rayban, anel/ Nos meus olhos não carece lente/ Pra ver no poente o azul do céu/ Minha barba não é desenhada/ Minha arcada dentária vai bem/ Os meus músculos ganham no grito/ Sem atrito nenhum com ninguém./ Deus quis assim/ Sou rico, sim/ Tenho muito sangue nas veias/ Meu coração/ É uma mansão/ E durmo sempre de barriga cheia./ Eu não uso relógio no pulso/ Que o tempo é avulso e não volta mais/ Nem careço de camisas caras/ Pois não tenho cara para tais/ Uso brim e não jeans desbotados/ Vou folgado num samba-canção/ Minhas calças precisam de cinto/ Mas me sinto mal num cinturão./ Sendo limpa, é qualquer cor de meia/ Pra mim, só alheia dá chulé/ É que eu sou um matuto sem mato,/ Sapato é o que cabe no meu pé/ No meu peito um amor levo dentro/ Sendo assim, entro em qualquer lugar/ Não me deixo fiar pela moda/ Mó de quê, se amanhã vai passar?/ Deus quis assim/ Sou rico, sim...

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Ah, vejam vocês, na letra acima usei o recurso que
Alexandre Lemos ensinou pra Lis Rodrigues. Pra quem não leu o texto dela, consiste em pegar uma canção que já existe e trocar-lhe os versos por novos. No caso da nossa Matuto sem Mato, a canção em questão foi Declaração de Bem, de Álvaro Cueva. Cantarolei os versos acima na melodia dele, depois, entreguei o resultado ao Leite (que frase sonora!), e ele me devolveu belíssima e distinta canção!
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Ainda sucederam dois fatos dignos de nota antes que Rafael Leite debandasse. O primeiro também vale uma aula de "letras". Rafael enviou uma letra pra
Kana, pra que ela a musicasse. Kana, estrangeira, e sem o cacoete de um Sonekka ou de um Camalle, por exemplo, encontrou imensas dificuldades pra transformar os versos de Rafa em canção. A primeira parte até que foi fácil, mas, chegando na segunda, ela travou. Não conseguia fazer que a letra coubesse na melodia que tinha em mente. Ao me relatar a triste situação em que se encontrava, dei-lhe uma sugestão: Pedi-lhe que esquecesse a letra e fizesse a melodia em que estava pensando e depois ma entregasse. E ela fez uma realmente encantadora! Em seguida, entrei eu, com minha experiência no artesanato das palavras. E o que fiz? Podei a letra de Rafael pra que coubesse na melodia de Kana. E como coube (vejam o resultado no link abaixo)! Ele, ao ouvir o resultado, emocionado, quis me dar parceria. Claro que não aceitei. Afinal, não acrescentei nenhuma ideia minha. O que fiz foi apenas o que Kana teria feito se fosse brasileira. Detalhe: a canção, batizada de Entre Canções que Ouvi, é uma homenagem a São Luiz do Paraitinga, porém, composta antes da tragédia que a abateu. Portanto, se já era bela, revestiu-se ainda de um caráter simbólico.
E eis que, antes de ir pra Macau, Rafael deu à luz o exuberante Veredas do Vale, CD onde correm leite e mel. E que, como bônus, ainda traz festivo texto de
Fernando Cavallieri. Esse delicioso Veredas nos faz enveredar por saudosos caminhos, caminhos estes capazes de causar arrepios de saudades até nos infelizes que nunca andaram por eles e, consequentemente, trazer-lhes lágrimas aos olhos. Claro está que, pra bem ouvi-lo, há que se ter os ouvidos apurados - e depurados -, aqueles que estão acostumados à poluição sonora podem ser acometidos por certa tontura pós-Daime. A estes, dou o conselho que escreveu Cavallieri: "Acendei a fogueira. Ide ao melhor alambique comprar a mais fina garapa. [...] venham banhar-se no leite viscoso e Sagrado, nas águas cristalinas purificadoras da música brasileríssima de Rafael Leite. Os que têm olhos de ver verão o Amor alinhavando com fio dourado cada canção, sutil e luminoso como um deus...". Falou?
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...E depois disso, um show aqui, outro acolá, e finalmente dele não se teve mais notícia! É favor quem souber seu paradeiro entrar em contato conosco... Mas, espere aí! Relendo agora meus rabiscos felizmente consertados pela máquina que tenho à frente, sou capaz de jurar que o "caboco" deve andar metido em algum estúdio preparando veredas outras. Queira Deus! - E ele há de querer!

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P.S. Astrologia nunca foi meu forte, mas acho que não deve ser simples coincidência o fato de o moço fazer aniversário no mesmo dia em que o fazem Woody Allen e... este escriba!


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Enverede você também pelas canções de Leite aqui: http://clubecaiubi.ning.com/profile/OXdoPoema

Leia as letras
aqui: http://clubecaiubi.ning.com/profiles/blogs/rafael-leite

Leite também está no Caiubi: http://clubecaiubi.ning.com/profile/RafaelLeite


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Por Léo Nogueira

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terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Sempre-viva


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Maria:
Maria?
Maria.
Maria,
Maria;
- Maria –
“Maria”
Maria...
Maria!
Mar’ia
(Maria

Parte de mim


MQ

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segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

RUY GODINHO - ENTÃO, FOI ASSIM?

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NO RANCHO FUNDO
(Ari Barroso/Lamartine Babo)

No rancho fundo,
Bem pra lá do fim do mundo
Onde a dor e a saudade,
Contam coisas da cidade...
No rancho fundo,
De olhar triste e profundo,
Um moreno canta as mágoas,
Com os olhos rasos d’água...
Pobre moreno,
Que de noite no sereno,
Espera a lua no terreiro,
Tendo um cigarro por companheiro,
Sem um aceno, ele pega da viola,
E a lua por esmola,
Vem pro quintal desse moreno!
No rancho fundo,
Bem pra lá do fim do mundo,
Nunca mais houve alegria,
Nem de noite, nem de dia!
Os arvoredos,
Já não contam mais segredos,
E a última palmeira,
Já morreu na cordilheira!
Os passarinhos,
Internaram-se nos ninhos,
De tão triste essa tristeza,
Enche de trevas a natureza!
Tudo por que?
Só por causa do moreno,
Que era grande, hoje é pequeno,
Para uma casa de sapê.
Se Deus soubesse,
Da tristeza lá da serra,
Mandaria, lá pra cima,
Todo o amor que há na terra...
Porque o moreno,
Vive louco de saudade,
Só por causa do veneno,
Das mulheres da cidade...
Ele que era,
O cantor da primavera,
Que até fez do Rancho Fundo,
O céu melhor que há no mundo...
O sol queimando,
Se uma flor lá desabrocha,
A montanha vai gelando,
Lembrando o aroma da cabrocha...
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Então, foi assim...
No Rancho Fundo, um dos mais belos clássicos da música popular,
composição de Ari Barroso1 e de Lamartine Babo2 é uma parceria, pelo
menos nesta música, bastante interessante. Dizem que Lamartine Babo
simplesmente botou outra letra nesta música, sem o consentimento dos
autores originais. Mas há controvérsias.

Sérgio Cabral3 relata que na época áurea do Teatro de Revista no Rio
de Janeiro, por volta do fim da década de 1920 e início de 1930, Ari Barroso
costumava compor músicas para teatro. Diversas peças tiveram músicas
dele. Foi assim com a revista É do Outro Mundo, escrita por J. Carlos4, um
dos maiores caricaturistas e ilustradores da história da imprensa brasileira.
Pois bem, nesta peça Ari Barroso escreveu uma música que recebeu letra
de J. Carlos e se chamava Esse Mulato Vai Ser Meu (Na Grota Funda), interpretada
pela atriz e cantora Araci Cortes. A letra era assim:

“Na grota funda
na virada da montanha
Só se conta uma façanha
Do mulato da Raimunda
Matou a nega
E depois, sem mais aquela
Foi juntá com uma galega
Ela morreu
Na virada da montanha
Vai havê outra façanha
Esse mulato vai sê meu
Esse mulato
Vai fazendo o que ele qué
Já matou duas mulhé
Porque bamba ele é de fato
Se não Morreu
Vai mangá esse cachorro
Na virada ali do morro
Esse mulato vai sê meu”

A peça estreou no dia 13 de junho de 1930 e não obteve muito sucesso. Foi
retirada de cartaz 16 dias após a estréia. Um dos incautos que a assistiu foi Lamartine
Babo. Lalá, como era chamado, adorou a música de Ari Barroso, mas
detestou a letra de J. Carlos. De acordo com Sérgio Cabral, sem consultar os autores,
Lalá tratou de fazer outra letra, mudou o nome da música para No Rancho
Fundo e cantou a nova obra num programa na Rádio Educadora do Brasil, do
Rio de Janeiro, acompanhado pelo Bando de Tangarás5. Nascia um clássico da
música brasileira e uma inimizade.

J. Carlos ficou magoado, injuriado. Achou a rejeição uma desfeita e brigou
seriamente com Ari Barroso. Ari explicou para o antigo parceiro que tudo havia
ocorrido à sua revelia, que ele não tinha nada a ver com isso. Tudo em vão.
J. Carlos não quis conversa e morreu sem jamais o haver perdoado.

Ari jurou inocência em todas as entrevistas que abordavam o assunto, mas
pelo jeito gostou da mudança da letra. Pelo que se sabe, nunca brigou com Lamartine
por causa disso. E mais, se estivesse interessado em manter a letra de
J. Carlos, não permitiria que, um ano depois, a cantora Elisa Coelho gravasse a
música com a letra de Lamartine.

Mas, para quem conheceu a personalidade e as artimanhas de Ari Barroso
sabe bem que ele não só consentiu como se omitiu. Pelo menos, Jairo Severiano
e Zuza Homem de Mello6 não têm dúvidas em afirmar que Ari Barroso não só
autorizou a troca da letra como tocou o piano na gravação de Elisa Coelho.

Assim morreu Na Grota Funda e nasceu No Rancho Fundo, composição de
Ari Barroso e Lamartine Babo.


1 Ari Evangelista Barroso 07/11/1903 Ubá-MG 09/02/1964 Rio de Janeiro-RJ.
2 Lamartine de Azeredo Babo 10/01/1904 Rio de Janeiro-RJ 16/6/1963 Rio de Janeiro-RJ.
3 No Tempo de Ari Barroso.
4 José Carlos de Brito e Cunha.
5 Formado por Almirante (Henrique Foreis Domingues), Noel Rosa, João de Barro (Carlos Alberto Ferreira Braga, o Braguinha),
Álvaro Miranda e Henrique Brito.
6 A Canção no Tempo: 85 anos de músicas brasileiras.



Ruy Godinho


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domingo, 19 de dezembro de 2010

PASSARIM TODIM

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Passarim todim
(Eudes Fraga / Marcos Quinan / Iranildo Pereira)

Hoje sou sabiá
Voei procurando meu bem
O meu canto acauã, eu sei
É saudade de alguém

Já senti muita dor também
Assum preto que sou
Fui cancão no terreiro, vem-vém
Só por causa do amor

Asa branca voou, voou
Rosinha chorou
E a légua tirana levou
Meu pedaço de chão

Juriti só cantou, cantou
Gavião quis bicar, bicou
Patativa no céu contou
Cantos de arribação

A Rolinha pousou, pousou
Rodeou minha mão, ciscou
Trouxe junto o uirapuru
Pra cantar um baião

Hoje sou passarim todim, todim
São, são todos em mim cantando assim
Hoje sou passarim todim, todim
Sou Luiz, sou baião vim-vim, vim-vim


Eudes Fraga - Voz

Adelson Viana - Acordeon e Piano

Aroldo Araújo - Baixo

Hoto Jr - Percussão

Arranjo Coletivo

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sábado, 18 de dezembro de 2010

JAC. RIZZO - O salto mortal

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Todos os dias ela ensaiava passos.
Era bailarina na vida.
Dessas que nunca fazem 'pas de deux'.
Dançava sozinha.
E a graça e suavidade

que saltavam das suas sapatilhas,
se espalhavam pelos braços,

pelas pernas, tomavam conta
do seu corpo inteiro.
As angélicas recendiam perfume

em seus cabelos.
As bailarinas enfeitam e encantam o mundo!
E ela rodopiava, se soltava na beleza
de um 'pas de valse'.
De vez em quando, acontecia

um descompasso.
A música tocava e a bailarina não conseguia dançar.
Tentava um 'coupé', mas o passo ficava capenga.
Era a vida batendo na porta da bailarina.

Nem sempre toca a música
que a delicadeza sabe dançar.

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Jac. Rizzo - http://jacrizzo.blogspot.com/
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RUY GODINHO - RODA DE CHORO

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RODA DE CHORO – SÁBADO – DIA 18.12.10

ESPECIAL “A HISTÓRIA DOS REGIONAIS”

O RODA DE CHORO deste sábado, 18.11.10, vai ser especial. Durante todo o programa desvendaremos a história dos grupos regionais: sua origem, a razão do nome, a importância como formação musical para a música brasileira, a parceria das rádios com os regionais, a função tapa-buraco na programação das emissoras, os principais grupos e algumas curiosidades interessantes.

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No repertório: Os Oito Batutas, Choro Carioca, Grupo Carioca, Regional do Benedicto Lacerda, Regional do Canhoto, Época de Ouro, Água de Moringa, Caraivanas e Nosso Choro.

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Ouça pela internet:


Rádio Câmara, Brasília: www.radio.camara.gov.br (rádio ao vivo), sábados, 12h.

Rádio Utopia FM, Planaltina-DF, quartas-feiras, 18h.

Rádio UEL FM, Londrina-PR, quintas-feiras, 21h.

Produção e Apresentação: Ruy Godinho


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sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Amor e paixão


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Despercebemos tanto
Entre o conflito e o zelo
Que esquecemos os limites
Que o amor prepara
Para a paixão consumir
Ou que a paixão prepara
Para o amor ser bastante

Fundidos um no outro
Não importa quem valora
Sem desluzimento
O caminho da avidez

Permanecem no íntimo
Lugar da idealização
Onde o amor completa
E a paixão tempera
Dentro um do outro
Da forma de cada um

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MQ
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quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Alimento

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Os olhos se calam
E o amor fica distante
O silêncio vaga
E as migalhas se põem

O medíocre lanha
A alma que agoniza
O falso é cadafalso
Para se findar em dor

Uma morte estranha
Espera na minha porta
E confirma as cicatrizes
Debaixo da ferida exposta

Marcas quase abstratas
Assusta o que é nascido

Esmolo o amor
Mas dele nem sei os modos
Sei, meu único alimento
Para nascer e morrer todos os dias


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MQ
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quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Ninguém me Conhece: 27) Lis Rodrigues, a Musa do Caiubi

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Todos os grandes movimentos musicais contaram com suas musas. Com o Clube Caiubi não poderia ser diferente. Ela atende pelo nome de Lis Rodrigues. Claro que por lá passaram (e passam) muitas outras, como Lucia Helena Corrêa, Bárbara Rodrix, Vanu Rodrigues, a própria Kana, entre outras, mas Lis sintetiza bem o que é o Caiubi, pois suas características são as do próprio clube. Lis é eclética, perseverante, guerreira, positiva, tem espírito de coletividade e, sim, acredita sempre. Vai na frente, apontando tendências, dando voz a seus compositores prediletos, um pé na tradição, o outro na vanguarda, como o próprio Caiubi. E tudo isso do alto de seu pouco mais que metro e meio. O talento, contudo, é inversamente proporcional.
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A primeira vez que nos deparamos com ela no palco do
Caiubi, vimo-la agigantar-se, tanto que Kana, no calor do momento, sussurrou-me: “Nossa, parece uma Janis Joplin brasileira!”. Certa vez ouvi comentário de Roberto a respeito de seu amigo de fé e irmão camarada que cabe muito bem em Lis Rodrigues. Dizia o Rei que Erasmo, se não era um grande cantor, era excelente intérprete. É assim Lis. Musa, sim, diva, não. Pois ela não tem a afetação das divas. Não carece de caras e bocas pra se fazer entender e passar seu recado. E o passa muito bem, pois sabe o que canta. Se você nunca foi ao Caiubi, quando for, peça-lhe que cante Boleiros, de Vlado Lima, e verá que momento mágico é, com a plateia em êxtase cantando junto. Uma verdadeira celebração.
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E, de uns tempos pra cá, Lis vem se tornando também uma letrista de muita inspiração. E eu, que nunca vi com bons olhos essa onda de cantoras-compositoras, cujo filão foi aberto por Marisa Monte (segundo Ayrton Mugnaini, a moda começou nos idos dos 80), que chegam pra fazer concorrência ao compositor não-cantor, tiro o chapéu pra Lis por um motivo: enquanto muita cantora se torna compositora da noite pro dia apenas pra abocanhar também a parte dos direitos autorais, Lis tem uma qualidade nata do letrista, a originalidade dos temas. Tanto que o talvez maior clássico do
Caiubi é dela: Cisco no Olho. Claro, há a melodia pra lá de inspirada de Sonekka unida à criatividade ímpar de Ricardo Soares, mas a canção nada seria sem os versos geniais “hoje você é somente um cisco nesse meu olho/ não significa nada e ainda assim/ me faz chorar”.
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Certa vez protagonizei com ela experiência das mais saborosas, que é também eficaz exemplo de que em criação não se põe camisa de força. Compartilhávamos uma mesa no
Caiubi e, cansados de esperar pelo garçom, que nos trouxera uma cerveja e um único copo e não voltava nunca pra trazer o segundo, resolvemos compartilhar também o solitário copo. De repente, não me lembro bem se foi num guardanapo, Lis escreveu um verso e me mostrou. Meio que de brincadeira, escrevi um segundo verso e lhe devolvi o papel. Ela não se fez de rogada e me devolveu o papel com um terceiro verso. Quando pensamos que não, estávamos compondo uma letra ali, na hora, como se jogássemos damas. Mandamos a letra pra Clarisse Grova, e a brincadeira se transformou numa bela canção, Invasão*. Repetimos a dose outras vezes, de diferentes maneiras, só pra variar... e farrear.
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Sua incursão no mundo das letras, contudo, teve em Marcio Policastro um incentivador parceiro. E uma química perfeita. Dentre as várias parcerias que ambos têm, há uma que me encanta particularmente, chamada Braseiro**. Confesso que, quando Marcio me mostrou a canção e eu pude ler a letra, não deixei de ser acometido por certa incredulidade. Sabendo ser Lis, àquelas alturas, uma letrista novata, não conseguia crer que pudesse ter escrito tão lapidados versos e com métrica tão perfeita. Aos leigos, um pequeno esclarecimento: quando o letrista faz uma letra antes da melodia, facilita muito a vida do melodista escolhido se lhe entregar esta com versos de métrica igual. Se a letra for boa, e o melodista idem, este, ao pôr os olhos naquela, já sai praticamente cantando. Foi o caso de Marcio nessa canção. Um dia não me contive e perguntei a Lis como tinha feito aquela letra. Sua resposta me fez sorrir, pois ela se utilizara de recurso a que não poucas vezes eu próprio recorrera. Disse-me ela que
Alexandre Lemos lhe dera preciosa dica: Este lhe havia dito que algumas vezes se apropriava de alguma canção conhecida (pelo menos por ele, claro) e compunha na métrica desta outra letra. Foi o que Lis fez. E eu que me achava muito esperto!
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Quando digo que Lis é a musa do
Caiubi, não o faço em demérito às outras. É porque ela tem, antes de tudo, digamos, direito ao título, pois, naquelas primeiras noites, quando ninguém acreditava, praticamente não havia público e a casa nem se pagava, lá estava ela, confiante, dando corpo e alma (e voz) à causa. Pouco tempo depois, já com a casa cheia, ficou fácil chegar e cantar. Mas Lis sempre foi assim, desde que a conheço, cheia de invencionices que não deixavam o clube cair no marasmo. Já nos primórdios, uniu-se aos belos compositores Tito Pinheiro e Max Gonzaga e formou com estes o grupo Trinca Caiubi. Aliás, este foi o primeiro dos muitos grupos que se formaram lá. Daí por diante Lis não parou mais, sempre aprontando alguma das suas. Neste ano que se encerra, chegou mesmo a unir-se novamente a Max pra uma temporada de casa cheia em alguns bares de Sampa. Prepara dois discos ao mesmo tempo, cada um com linguagem e arranjos distintos, e ainda promete um disco de samba na sequência. Tenho cá comigo que se lhe sobrasse grana, já andaria pelo décimo.
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Por fim, um dado importante: nos últimos tempos o Clube Caiubi tem incomodado algumas pessoas, por ser visto como tendencioso e reducionista. Ora, o Caiubi, como todo grupo formado por pessoas, não está livre de ter entre seus membros sempre alguém que diga bobagens acerca de outro grupo ou movimento. Contudo, antecipo aos possíveis ofendidos o óbvio: Um indivíduo, se não autorizado pelo grupo, não pode falar em nome deste. Assim sendo, se em algum lugar você se deparou com algum “caiubista” bêbado e falastrão, releve, esse camarada terá vomitado opiniões exclusivamente dele. Afinal, nunca vi Lis Rodrigues ou Sonekka, os que podem ser considerados hoje os naturais líderes do clube, abrirem a boca pra desmerecer quem quer que fosse que não pertencesse ao grupo. Ao contrário, dotados do espírito de coletividade acima citado, costumam transitar em eventos muitos, como uma espécie de embaixadores, sempre com os braços abertos, e o coração, idem.

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***
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Ouça algumas das invencionices de Lis
aqui: http://clubecaiubi.ning.com/profile/OXdoPoema
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Leia as letras aqui: http://clubecaiubi.ning.com/profiles/blogs/lis-rodrigues ** (Braseiro está lá).
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Visite a página dela no
Caiubi: http://clubecaiubi.ning.com/profile/LisRodrigues * (Invasão é a 21ª).


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Por Léo Nogueira

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Cicatriz


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Dói a lembrança
Da tua imagem
Refletida no espelho do teto
Dói te perceber presente ainda
Em todo o meu corpo
Que extremamente exausto
Não soube pertencer ao teu
E fez a enorme diferença


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MQ
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AÇOUGUE CULTURAL T- BONE - BRASÍLIA

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segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

RUY GODINHO - ENTÃO, FOI ASSIM?

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CAMISA 10
(Hélio Matheus/Luiz Vagner)

Desculpe seu Zagalo
Mexe nesse time
Que tá muito fraco
Levaram uma flecha,
Esqueceram o arco
Botaram muito fogo
E sopraram o furacão
Que não saiu do chão.
Desculpe seu Zagalo
Puseram uma palhinha
Na sua fogueira
E se não fosse a força desse tal Pereira
Comia um frango assado lá na jaula do leão
Mas não tem nada não!
Cuidado seu Zagalo
O garoto do parque
Está muito nervoso
E nesse meio-campo fica perigoso
Parece que desliza nesse vai não vai
Quando não cai.
É camisa dez na Seleção
Laiá, laiá, laia
Dez é a camisa dele
Quem é que vai no lugar dele.
Desculpe seu Zagalo
A crítica que faço é pura brincadeira
Espírito de humor, torcida brasileira!
A turma está sorrindo para não chorar...
(Tá devagar).
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Então, foi assim...
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Em 1973, como a Seleção Brasileira de Futebol havia vencido a Copa do Mundo de 1970, não precisava participar das eliminatórias para a Copa do ano seguinte, a ser disputada na Alemanha Ocidental.

Com a intenção de preparar o time, a CBF programou excursões à Europa para a realização de jogos amistosos. Ao fazer a convocação dos jogadores, o técnico Zagalo, foi duramente criticado pelos jornalistas esportivos e pelos torcedores. Falastrão como sempre e sem tolerar críticas, Zagalo respondeu em entrevista concedida à revista Placar: “Eu sou o responsável”.

Só podia dar samba. Hélio Matheus e Luiz Vagner compuseram e o ex-jogador de futebol e cantor Luiz Américo gravou. A letra critica Zagalo e os jogadores convocados, de forma bem-humorada. Cita nomes, apelidos e as posições em que jogavam:1

Como Zagalo convocou o meio-campista Flecha, do Grêmio, mas não designou ninguém para fazer os lançamentos, “levaram uma flecha, esqueceram o arco”.

Como Zagalo, por questões sentimentais, havia convocado muitos jogadores do Botafogo, menos Jairzinho, o Furacão da Copa de 70, “botaram muito fogo e sopraram o furacão”.

Palhinha, jogador do Cruzeiro, que não estava se entrosando com os outros meio-campistas, todos do Botafogo, também levou lenha: “Puseram uma palhinha na sua fogueira”.

Como era atribuído a Luís Pereira, zagueiro do Palmeiras, o fato de o goleiro Leão não engolir frangos: “E se não fosse a força desse tal Pereira/ Comia um frango assado lá na jaula do leão”.

Rivelino, ídolo da torcida corintiana, também foi lembrado: “O garoto do parque está muito nervoso/ E nesse meio-campo fica perigoso...”

O refrão “10 é a camisa dele, quem é que vai no lugar dele?” era o ponto alto da crítica. A falta de um substituto à altura para o Camisa 10, Pelé. O Rei do Futebol, sensação da Copa de 1970, se despedira da Seleção um ano depois do tricampeonato e até aquele momento Zagalo não havia conseguido identificar seu substituto.

A divertida crítica termina com um pedido de desculpas ao técnico turrão: “Desculpe seu Zagalo/ A crítica que faço é pura brincadeira”. Brincadeira que, no fundo, representava uma preocupação de toda a torcida brasileira que Zagalo não quis ouvir.

Resultado: a Seleção Brasileira passou com dificuldades das oitavas de final; enfrentou a poderosa Seleção da Holanda na semifinal, perdeu por 2x0; disputou a terceira colocação com a Polônia, perdeu por 1x0; voltou para casa com a quarta colocação. O título ficou com os donos da casa.

Bem, as desculpas esfarrapadas de Zagalo depois do fiasco dariam um tango.


1 Fabio Gomes, no site www.brasileirinho.mus.br, faz um interessante raio x sobre o assunto.


Ruy Godinho
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Pensamento


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Na mesa do bar
Vi nascer poesia
Nos guardanapos
Que dois poetas
Copulavam com
Suas canetas
Ora calmos
Ora ensandecidos

Maravilhado
Olhava e pensava
Nos teus olhos
Derramando
Umidade e consentimento
Em cima da mesa

Aquele chegar
Inesperado e cúmplice
Enchendo portais
E o olhar de todos
Flechando sentimentos

A perplexidade
Fingia não esperar
Aquele momento
E o calor da pele
Quase entrou
Em combustão

Na mesa do bar
Entre dois poetas
A tarde perfumava
Minha insanidade
Copulando com
Tua ausência



MQ
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domingo, 12 de dezembro de 2010

Fome


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Vinha-lhe da alma
Brotando simples
Qualquer fazer
Acenos insertos
Invadia o poeta
Eram seus versos
Que se calavam vazios
Decerto fatigados
Por carregar a fome da dor

Vagava perdido
Em errâncias sem temor
E nascia em si
Sonhava em si
Morria em si
Sem pressa alguma

Faminto de dor

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MQ
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sábado, 11 de dezembro de 2010

JAC. RIZZO - Sobre a canção possível

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Houve um instante em que foi preciso nascer. Mas ainda assim, não me livrei de um território nebuloso. O mundo é um lugar hostil, de caminhos misteriosos. Vivo buscando delicadezas, levezas, suavidade e sensibilidade em lugares errados. Queria o mundo claro e feliz. E vejo ele escuro e sombrio, muitas vezes. Nasci sem saber a solução de problema algum. Nem sequer, com uma questão colocada. Não. Nada. Sem saber aonde encostar minhas perplexidades. E as horas passaram rápidas, correram, voaram. Num instante já eram dias, meses, anos. E eu tentando decifrar o indecifrável. Daí por diante, vivo assaltada de pressentimentos, colecionando perdas e alguns ganhos. Quando penso em entrar num estado quase vegetal de comtemplação, alguém me arranca de lá. Então, penosamente, recomeço. Morro muitas vezes, sem me dar conta. Da última vez, estava olhando o mar. E fiquei tão pequena ali, na frente dele, que desapareci. Foi difícil voltar. Nasço sempre penosamente. Sem querer. Experimento na tristeza das coisas o meu medo. Mas, de repente, o morto desperta. Sai desse torpor para uma verdadeira agonia existencial.
Talvez seja possível sobreviver. Recuperar amores que ficaram paralizados, inconclusos. Buscar no esgarçado tecido do tempo, o próprio tempo perdido. Talvez...



Jac. Rizzo - http://jacrizzo.blogspot.com/
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sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Projeto Vivências com os Mestres - SÃO PAULO

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Batuque de Umbigada em apresentação no Espaço Cachuera
Foto: Andréa de Valentim

RODA DE CHORO - RUY GODINHO

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RODA DE CHORO – SÁBADO – DIA 11.12.10
ESPECIAL MESTRE CAPIBA POR
RAPHAEL RABELLO E CONVIDADOS

O Roda de Choro deste sábado será especial. É que, durante todo o programa, enfocaremos um disco histórico, belíssimo, que resgata parte da obra do Mestre Capiba - compositor pernam-bucano - produzido por outro mestre, o violonista Raphael Rabello e interpretado por um time de primeiríssima linha da música brasileira.
Trata-se do CD Mestre Capiba – Por Raphael Rabello e Convidados, uma produção assinada pela Acari Records, lançada em 2002, e que teve a sua venda revertida para a Ação da Cidadania Contra a Fome e a Miséria, do sociólogo Betinho.
Foi o último trabalho de Raphael Rabello, que desencarnou quando estava prestes a concluí-lo, aos 32 anos. Quem assumiu os trabalhos de mixagem e finalização foi Luciana Rabello, cavaquinista, irmã e testemunha primeira das genialidades de Raphael, o que possibilitou sua conclusão.
O disco reúne um pot-pourri de frevos, mas principalmente a face menos conhecida da obra de Capiba: valsas e canções, em arranjos extremamente sofisticados, interpretados pelos principais cantores e cantoras da música brasileira.

Rádio Câmara, Brasília: www.radio.camara.gov.br (rádio ao vivo), sábado, 12h.

Produção e apresentação – Ruy Godinho
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quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

PEDRINHO CALLADO - HUM-HUM!...


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Download de músicas em mp3 grátis

http://pedrinhocallado.blogspot.com/

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BANCO DE PARTITURAS

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A Academia Brasileira de Música contém mais de 400 títulos de mais de 80 compositores da música brasileira. No acervo, música para orquestras sinfônica, de câmara e de corda, além de música para banda e coro. Para conhecer as obras do banco de partituras acesse: www.abmusica.org.br.


Via NICE PINHEIRO - http://www.nicepinheiro.blogspot.com/

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CRISTÓVAM ARAÚJO - BELEM

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EVERTON BEHENCK


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TORTO


Meu quarto não tem espelho
Porque não gosto de amanhecer
Os olhos

Diante de mim

Minhas noites
São longas demais

E os vaga-lumes
Já dormiram seu brilho

Quando a pálpebra
Abre suas cortinas

Nada pior que a escuridão
De uma manhã de sol

Meu quarto não tem espelho
Porque não quero olhar o rosto

Antes do sono

Que ver o dia pesando
Sem tamanho

A me forçar o ombros

Pode me partir as costelas
E entre elas

Tenho medo
Que não haja nada

E me assusta mais ainda

Ver o rosto anoitecido
Acordar

Com mais oito horas marcadas
Sem que eu nem mesmo saiba

De onde vieram
As oito rugas

Não vividas

Meu quarto não tem espelho
Para que ninguém diga

Que saí com o botão da camisa
Na casa errada
Por me olhar desatento

Está na casa errada
Porque o peito é torto

E essa perfeição
Ninguém me tira

Meu quarto não tem espelho
Para que nenhum reflexo

Descubra

Que dormindo
Não passo de um menino


,
Everton Behenck - http://apesardoceu.wordpress.com/

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NILSON CHAVES - BELÉM

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quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

ROLANDO BOLDRIN - SR BRASIL

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Sonho


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Sonho com você
E meus sonhos
Escondem a impotência
Que o tempo
Impôs a meu corpo

A poesia que dele sei
Ficou esmaecida
Virou lembrança
E só pode estar mesmo
Assim

A poesia que sei das cores
Não está nas minhas mãos
Nelas agora há um momento
De terra e chão queimado
Pela angústia

Meu coração pertence
Mas meu corpo
Constrange a beleza
Do amor que sinto

Então minhas mãos
Nunca te tocam
E por isso peço perdão



MQ
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terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Sete palmos

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Sete olhos olhando
Sete palmos cavados
Sete planos de chão

Ladainhas e ramalhetes
Sete marcas sangrando
E o vazio desbordando

Figuração e rumo
Sete caminhos chegando
E o vadio no comando

Tentação e estima
Sete viúvas sem dor
E o feitio enganando

Sete olhos cavados
Sete planos olhando
Sete palmos de chão



MQ
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segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

RUY GODINHO - ENTÃO, FOI ASSIM?

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LÍGIA
(Tom Jobim)

Eu nunca sonhei com você
Nunca fui ao cinema
Não gosto de samba não vou a Ipanema
Não gosto de chuva nem gosto de sol
E quando eu lhe telefonei, desliguei foi engano
O seu nome não sei
Esqueci no piano as bobagens de amor
Que eu iria dizer, não ... Lígia Lígia
Eu nunca quis tê-la ao meu lado
Num fim de semana
Um chopp gelado em Copacabana
Andar pela praia até o Leblon
E quando eu me apaixonei
Não passou de ilusão, o seu nome rasguei
Fiz um samba canção das mentiras de amor
Que aprendi com você
É ... Lígia Lígia
E quando você me envolver
Nos seus braços serenos eu vou me render
Mas seus braços morenos
Me metem mais medo que um raio de sol
Lígia Lígia
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Então, foi assim...
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Lygia Marina de Moraes era professora do pré-primário de uma das
filhas de Tom Jobim1. Conheceram-se no ano de 1968, em um bar carioca.

A musa contou para a revista Marie Claire2 que conheceu Tom numa
tarde chuvosa. “O bar Veloso [hoje Garota de Ipanema] estava vazio, era junho
e fazia frio. Eu e uma amiga, Cecília, nos sentamos na varanda e vimos o
Tom conversando com Paulo Góes [fotógrafo]. Os dois acabaram se sentando
na nossa mesa. Quando contei ao Tom que era professora da sua filha
Beth, ele teve um ataque de riso e disse: ‘É a primeira vez que paquera vira
reunião de pais e mestres!’. E eu babando: imagine, em 68, Tom era um dos
homens mais lindos do Brasil.”

Tom, que era casado na época com Thereza, negou enquanto pôde
que Lígia fosse a sua musa. Afinal, ela era casada com um amigo dele: o
escritor Fernando Sabino. “Em 1973, acho que Tom não sabia que eu estava
casada, e ligou para o Fernando pedindo meu telefone. Meu marido fez
uma sacanagem: deu um número errado. Em seguida, ligou para o telefone
que tinha dado e avisou: ‘O Tom Jobim vai ligar aí procurando uma
Lygia, mas o telefone é tal’, e deu outro número errado. Os amigos ficaram
sabendo dessa história, inclusive o Tom. Talvez daí tenha surgido a frase na
música que fala do telefonema que foi engano.”

Na tarde em que se conheceram, ele tinha que dar uma entrevista
para a revista Manchete e convidou Lygia e sua amiga Cecília para irem
com ele. “Fomos no fusquinha azul-claro do Tom. Eu usava uma saia de lã
e um suéter de cashmere”, detalha Lygia. Num intervalo qualquer da entrevista,
Tom escreveu um poema que ela guarda como se fosse um tesouro:
‘Teus olhos verdes são maiores que o mar/ Se um dia eu fosse tão forte quanto
você/ Eu te desprezaria e viveria no espaço/ Ou talvez então eu te amasse/ Ai
que saudades me dá/ Da vida que eu nunca tive’ (A.C.J).

No fim da entrevista, Tom a levou em casa. “Nos despedimos no carro,
com um beijinho no rosto. Fiquei nervosíssima, mas parou ali. Tom era
casado... Aquela carona foi nosso único encontro a sós. A música fala de
tudo o que não aconteceu: o cinema, o passeio na praia... ”

Foi o suficiente para que a mente abençoada de Tom Jobim projetasse o
samba-canção homônimo com a seguinte letra:

“Eu nunca sonhei com você/ Nunca fui ao cinema/ Não gosto de samba
Não vou a Ipanema/ Não gosto de chuva/ Nem gosto de sol
Eu nunca te telefonei/ Para que se eu sabia/ Eu jamais tentei
E jamais ousaria/ As bobagens de amor/ Que aprendi com você
Não, Lígia, Lígia.
Sair com você de mãos dadas/ Na tarde serena/ Num bar de Ipanema
Andar pela praia até o Leblon
Eu nunca me apaixonei/ Eu jamais poderia/ Casar com você
Fatalmente eu iria/ Sofrer tanta dor/ Pra no fim te perder
Lígia, Lígia
Você se aproxima de mim/ Com esses modos estranhos/ Eu digo que sim
Mas seus olhos castanhos/ Me metem mais medo/ Que um raio de sol
Lígia, Lígia.”

Com essa letra, Tom a entregou para Chico Buarque gravar no LP Sinal
Fechado, de 1974, aquele em que ele gravou somente músicas compostas por
amigos, por estar com a obra censurada. Tanto que Chico deu um toque de Midas
na letra, mas evitou colocar seu nome na parceria para driblar a censura.

A musa estava sozinha em casa quando ouviu no rádio, pela primeira vez,
Chico cantando Lígia. Ainda de acordo com a reportagem: “Fui correndo comprar
o disco. Na hora, me vi na letra. Ser homenageada já é maravilhoso, ainda
mais pelo Tom, com uma música linda e sofisticada... É uma glória. Claro que
a música rendeu comentários e Fernando ficou uma fera. Durante os 19 anos
em que fui casada, Tom evitou o tema. Estivemos juntos em vários lugares, tipo
réveillon na casa de Jorge Amado, eu com Fernando e Tom com Ana – sua segunda
esposa – mas ninguém falava nisso”.

A primeira e única vez que Tom Jobim admitiu para Lygia ser ela a inspiradora
da música, foi num encontro casual na COBAL, um misto de sacolão
e ponto de encontro, localizado no bairro do Leblon, endereço do restaurante
Plataforma, onde Tom freqüentemente encontrava-se com os amigos. “Está
chegando a minha musa!”, teria dito ele.

Lígia foi gravada no Brasil, entre outros, por Lúcio Alves (1975), Tito Madi
(1976), pelo próprio autor, no LP Urubu (1976), Wilson Simonal (1979), Milton
Banana Trio (1980), Simone (1989), Leny Andrade e Cristóvão Bastos (1995), João
Gilberto no LP Melhores de Dois Mundos (1977, Brasil), com Stan Getz e Miúcha e
ainda no CD João Gilberto in Tokyo (2004). Nesta gravação, João Gilberto faz uma
ligeira alteração na letra:

“E jamais ousaria as bobagens de amor

Que outro vai te dizer...”



1 Antônio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim 25/1/1927 Rio de Janeiro-RJ 8/12/1994 Nova York-EUA.
2 Edição de novembro de 2000.



Ruy Godinho
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